Transcorre hoje, 18 de outubro, o Centenário de Nascimento de Urbano de Oliveira Lima Neto, nascido no Engenho Tuim, no município de Arauá. Filho de João Epifânio de Lima Neto e de Maria Joaquina de Andrade Lima, Urbano Neto, Urbano Neto, como ficou conhecido, estudou na Estancia, antes de ser transferido para o Seminário Sagrado Coração de Jesus, desde 1913 instalado em Aracaju, graças ao papel do primeiro Bispo, Dom José Tomás Gomes da Silva. A vocação para o campo, contudo, prevaleceu, levando Urbano Neto a estudar agronomia na Bahia, formando-se em 1928, na então Escola Agronômica da Bahia, em São Bento das Lages, São Francisco do Conde. Seu irmão, José Olino, antes de seguir a carreira médica, na Bahia, também passou pelo Seminário sergipano. João Bosco, o outro irmão, tomou o caminho da Faculdade de Direito, tornando-se magistrado.
A formação dos sergipanos abastados passava pelos Seminários e pelas escolas de Direito e de Medicina. A família de João Epifânio de Lima Neto não fugia à regra, nem naquela e nem nas novas gerações. As fazendas Tuim e Baixão, no município de Arauá e de Pedrinhas, com engenho de fazer açúcar, gado de corte e de leite, pareciam um patrimônio que transbordava dos seus proprietários para as duas pequenas cidades, e para as suas pobres populações. Arauá ligada, por laços fortes, a Estancia, como Pedrinhas orbitava em torno de Boquim. Arauá com suas bebidas, seu leite, queijo e manteiga da marca Buril, de João Costa e depois do seu filho Joaldo Costa, Pedrinhas com seu fumo, sua pimenta do reino, suas laranjas, criando uma geração de produtores, quase todos saídos do anonimato, contrastando com a tradição dos fazendeiros: Otoniel, da fazenda Caminhão, cuja cancela parecia ser o limite da cidade, Florentino, Zé da Areia, a viúva do Siri, todos perdendo importância na medida em que os sítios do Mutumbo floresciam como pequenas unidades produtivas, alimentando um comércio variado no dia da feira.
Urbano Neto empenhou sua formatura no enfrentamento da crise da fazenda da família, no Arauá. E fez, como agrônomo, uma bela figura, projetando sua imagem técnica e profissional, em funções públicas que dinamizaram as atividades agrícolas do Estado, modernizando-as. É o caso da avicultura intensiva, da citricultura, da renovação algodoeira de Sergipe. Mais do que atuar, Urbano Neto refletia sobre a problemática da economia primária do Estado, como fez com os estudos sobre a mandioca, referência da escassa bibliografia sergipana especializada.
Assim como o Arauá lhe deu vida e abriu as portas do futuro, Estancia lhe deu a formação cultural, artística, patrimonial, cujo gosto desenvolveu por toda a vida. Urbano Neto estava entre os estancianos ilustrados pelas palestras de Jorge Amado, em torno da Papelaria Modelo, de João Nascimento Filho. O magistério no Colégio Sagrado Coração de Jesus, a campanha em favor do monumento a Gumercindo Bessa, a responsabilidade por levar Oreste Gatti a pintar, com a maestria da arte italiana, o teto da Matriz catedral, deram a Urbano Neto uma cidadania estanciana, completada com o casamento com Ana Maria Silva de Lima, e com o nascimento de 8 dos seus 9 filhos e, enfim, com o reconhecimento público de sua presença benfazeja, através da formalização, pela Câmara Municipal, com o Título de Cidadão de Estancia.
Estância deu a Urbano Neto a passagem para Aracaju, onde viveria e realizaria uma biografia de atuante partícipe e dirigente cultural. Ingressou no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e foi seu presidente, entrou na Academia Sergipana de Letras para ocupar a Cadeira 13 do Sodalício, repleta de música (seu Patrono foi o poeta, compositor e orador sacro Frei José de Santa Cecília), de história (o primeiro ocupante foi Clodomir Silva) e de poesia (Freire Ribeiro o antecedeu), com forte identidade; e foi, também, Conselheiro e Presidente do Conselho Estadual de Cultura. Um agente cultural, enfim, da mais alta qualificação, embora sempre aberto a discutir e disposto a rever seus conceitos. Estudava heráldica, mas não radicalizava nos emblemas que os povos adotam em suas histórias. Foi seu preparo e sua disposição para colaborar que levaram o Bispo a requititá-lo para integrar a Comissão de Artes Sacras da Diocese de Aracaju, juntamente com o monsenhor Carlos Camélio Costa, responsável pela reforma da Catedral de Aracaju, e com Oreste Gatti, que pintou o teto da velha matriz.
Na passagem entre o rural e o urbano (sem trocadilho) o interior e a capital, o lúdico das funções e as obras artísticas das igrejas, a conversa mansa das noites luarejadas do engenho Cassunguê e história dos bens e dos patrimônios históricos, Urbano Neto integrou uma geração inconformada com a ditadura interna e com a guerra mundial, sendo um dos fundadores do Centro de Estudos Econômicos e Sociais de Sergipe, ao lado de José Calasans, Garcia Moreno, Orlando Dantas, Marcos Ferreira de Jesus, Jorge de Oliveira Neto, e de muitos outros parceiros de utopias. E com a redemocratização de 1945 e dos anos seguintes alistou-se na União Democrática Nacional, candidatando-se, sem êxito, uma única vez, a uma vaga na Assembléia Constituinte e Legislativa de Sergipe, ao lado de outros membros do Centro, tomados de civismo, exultando pela normalização da vida democrática.
Elegante, cordial, amigo, Urbano Neto ampliou as suas relações e construiu uma imagem que ainda hoje é guardada nos ambientes culturais do Estado. Discreto, avesso à publicidade pessoal, Urbano Neto cumpriu, sem pressa, uma vida longa de 85 anos, morrendo em 26 de setembro de 1990, em Aracaju, sendo sepultado em Estancia, num gesto de fidelidade para com a terra que lhe deu vida intelectual.