O Dia do Folclore

Grupo São Gonçalo/ (Foto: Secult)

Os estudos do folclore, feitos presentemente, chamam a atenção para a sobrevivência das coisas do povo, no ambiente cultural modernizado pelas novas tecnologias, com especialidade a Internet. A discussão está ainda no começo, exigindo uma revisão conceitual que abarque o quadro dos grupos que sobrevivem e o ciclo de festas, que se fundem, intimamente, no equilíbrio entre a criação e o consumo dos bens culturais populares.

O mundo tem mudado muito e com incrível rapidez, mas isto não significa o fim do folclore, nem dos ciclos de festas. As características do fato folclórico hoje são outras, bem diversas daquelas vigorantes desde 1951, entronizadas pelo mestre Luiz da Câmara Cascudo. Em lugar de Oralidade, Persistência, Anonimato e Antiguidade já se fala, desde 1988, de Um novo entendimento do folclore, com novas características para reconhecer os fatos lúdicos, que falam pelo povo, como linguagem universal de comunicação.

A exigência de hoje, no reconhecimento dos fatos folclóricos, é que eles sejam Genuínos, Expressivos, Dinâmicos e Colegiados, espelhando a realidade da criação, do uso e da transmissão nas comunidades. Cai a Oralidade, sobe a Expressividade, desencadeando, como o disse José Marques de Melo (De Belém a Bagé: imagens midiáticas do Natal brasileiro. São Paulo/UMESP-UNESCO, 1998), os outros requisitos essenciais; cai a Persistência, entra em cena a Genuinidade, que identifica no povo a aceitação; a Dinamicidade garante a interação dos grupos com as comunidades e a Colegialidade, que universaliza as contribuições populares, que antes não compunham a estrutura dos fatos folclóricos.
A mudança conceitual implica em pensar o folclore como um fragmento do cotidiano longincuo, que se vai contextualizando no tecido social, como uma referência. Logo, o Folclore é uma ferramenta auxiliar na interpretação da história, que em certas circunstâncias mais se equivale a uma chave, que revela ao presente todas as surpresas do passado acumulado.

Logo, a Internet não inibe a manifestação cultural do povo. Ao contrário, ela pode estimular a circulação de textos e de outras expressões de linguagens, estabelecendo um vínculo com povos e matrizes. O Romance, fronteiriço ou não, é coisa, hoje, de pesquisador, mas aqui em Sergipe ainda existem cantadeiras, que repetem antigos romances, como se tratassem de personagens próximos da nossa convivência. Tais guardados do povo bem que podem ser postados, via Internet, para os países de origem, como um testemunho da guarda. Depositários fiéis, as pessoas e os grupos respondem por essa ocorrência, com ou sem variantes, que são parte de uma cultura universal.

A Internet não faz medo, porque não passa de um instrumento a ser manejado, como veículo a serviço da velocidade da informação, somando as múltiplas maneiras de levar ao público informações que, no passado, sequer circulavam nas comunidades subalternas, onde viceja o Folclore. O ganho é a difusão de coisas locais, antigas, ricas de conteúdos, sem que sejam alteradas pelo domínio das classes poderosas, que sempre fizeram do Folclore uma alegoria, um enfeite, um adereço, sob o controle das ligações entre grupos e festas, em ciclos que se desdobram o ano inteiro.

A Internet exige, para universalizar a difusão, que os grupos estejam prontos, com suas vestes típicas, em condições de apresentar seus repertórios, para conhecimento e apreciação dos que não conhecem, nem tiveram noção de como a cultura popular sobrevive, no ambiente hostil da indiferença. Na verdade, o Folclore reproduz as relações sociais, entre dominantes e dominados, numa dialética que tem elevado o grau de dependência, como tem abalado a resistência íntima dos grupos. O registro de desaparecimento de grupos, empobrecendo a representação artística, chama a atenção para as formas, ainda vigorantes, de organização social, que contempla o mérito, dando aos chefes a regência de todo o fazer grupal. Quando morre o chefe, morre, quase sempre, o grupo, como é exemplo recente a Chegança de Lagarto, que perdeu o chefe Paulo.

O Dia do Folclore impõe mais do que a festa, forma de regozijo que realimenta as funções dos grupos, impõe a discussão, a reflexão sobre os novos caminhos para as artes populares.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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