O funeral de Mandela

Andreza Maynard

Doutoranda em História/UNESP

Membro do GET/UFS/CNPq

Fonte da imagem: http://dingeengoete.blogspot.com.br/2013/02/this-day-in-history-feb-11-1990-nelson.html

No dia 5 de dezembro de 2013 Nelson Rolihlahla Mandela morreu aos 95 anos, na cidade de Pretória. Mandela havia se tornado um símbolo da luta contra o apartheid em seu país e também um ícone dos direitos humanos. Seu funeral, que segue até o dia 15, tem sido palco para encontro entre chefes de Estado, líderes políticos e artistas.

Nelson Mandela nasceu em 1918 e também era conhecido pelo nome de Mandiba. Ele ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1993 e foi presidente da África do Sul entre 1994 e 1999. Mandela havia estudado direito em Johanesburgo. Em 1948 um sistema de segregação racial, o apartheid, havia sido instituído em seu país e ele se colocou contra a divisão entre brancos e negros. Mandela foi condenado à prisão perpetua em 1964, mas foi libertado em 1990.

Durante os 18 anos em que ficou preso, a imagem da mão erguida com o punho fechado se tornou um símbolo da resistência contra a imposição racista do apartheid. A imagem de Mandela e outros companheiros sendo transportados dentro de um caminhão com grades permite que seus braços fiquem para fora. Os rebeldes ergueram seus punhos fechados e mostraram que continuavam resistindo. Mandela foi presidente aos 75 anos e o gesto do braço erguido com o punho fechado foi empregado durante sua campanha eleitoral. Mas em 1999 o então presidente não se candidatou à reeleição e preferiu aposentar sua carreira política.

Ainda que estivesse afastado do ativismo político, Mandela manteve contato com figuras importantes. Em 2001 foi diagnosticado com um câncer de próstata. Sua última aparição pública aconteceu durante a Copa do Mundo de 2010, cuja sede foi a África do Sul. A partir de 2011 sua saúde esteve mais fragilizada. Em 2013 foi internado com infecção pulmonar. Faleceu em 5 de dezembro deste ano.

Dada a importância de Mandela não apenas para a África do Sul, mas também para a humanidade, seu funeral assumiu grandes dimensões. Líderes políticos e artistas participam das homenagens ao ex-presidente. Operários trabalharam na construção de um palco no estádio nacional FNB, onde ocorreram cerimônias em homenagem a Mandela. Outros trabalhadores montaram uma arena onde será sepultado o líder sul-africano.

A presidente Dilma Rousseff seguiu para o funeral na África do Sul acompanhada pelos ex-presidentes do Brasil Luís Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso, Fernando Collor e José Sarney. O constrangimento do encontro inspirou vários comentários jocosos, charges e piadas tendo o episódio da viagem no mesmo avião como pano de fundo.

Outras cenas inusitadas puderam ser vistas em função da presença de figuras tão dispares no funeral de Mandela. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama protagonizou algumas delas. Numa imagem divulgada pelos canais de informação, Obama aparece apertando a mão do presidente de Cuba, Raul Castro. Todos querem aparecer bem nesse que não é apenas um funeral, mas um evento político.

E o presidente Obama quis sair tão bem em uma das fotos, que chegou a sorrir num clima de descontração, esquecendo o motivo oficial da sua viagem, ou seja, prestar as últimas homenagens a alguém que havia morrido. A imagem em que Obama aparece participando alegremente de um selfie (autoretrato) com o primeiro-ministro britânico, David Cameron e a primeira-ministra da Dinamarca, Helle Thorning Schmidt, em Joanesburgo, tem sido alvo de críticas e também de piadas. O fato da primeira-dama dos Estados Unidos estar sentada ao lado de Obama com o semblante fechado gerou comentários de que Michele Obama não havia aprovado o comportamento do marido, nem o seu momento “alegre” com a primeira-ministra da Dinamarca. A relação entre as figuras públicas e os meios de comunicação assumiu uma nova dimensão.

Nas décadas de 1920 e 1930 o cinema e o rádio surgiam como novidades. Os meios de comunicação de massa foram utilizados habilmente pelos políticos profissionais para que esses pudessem estender sua influência sobre grandes contingentes populacionais. No entanto o discurso no rádio, a mensagem visual dos filmes de propaganda política, ou mesmo a aparição nos palanques eram situação controláveis. Os políticos poderiam aparecer em público como desejavam que a população os visse. Depois que o microfone ou a câmera eram desligados, era possível agir “normalmente” e a imagem que ficava era a da aparição pública voluntária.

Mas na era da informação os políticos não têm o poder de decidir quando a câmera pode ser desligada. Na verdade elas estão ativas o tempo todo, e mais, estão conectadas à internet, prontas para divulgar o menor deslize. Assim, os políticos precisam estabelecer uma nova relação com os meios de comunicação contemporâneos. Seja numa aparição planejada, ou não, os políticos buscam tirar o melhor proveito da sua imagem e dos usos que se fazem dela. Ao se retratarem não é incomum que os políticos transformem as falhas em equívocos mal interpretados pelo público.

Diante de tantas homenagens, esquecem-se as contradições de Mandela e das relações que se estabeleceram em torno dele nos últimos anos. Até 2008 ele constava da lista confeccionada pelos Estados Unidos para observar o terror. Mas hoje Mandela não é considerado perigoso, ao contrário disso, sua luta militante é abafada em favor da memória de um homem que defendeu os direitos humanos. Mandela está morto, mas sua história permanecerá viva e já tem sido apropriada de várias maneiras.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais