Aracaju, que acaba de completar 151 anos, tem sua origem ligada a problemas de saneamento e de saúde pública, e suas febres entraram para a história, fazendo vítima próprio presidente da Província, Inácio Joaquim Barbosa, responsável pela escolha do lugar para servir de capital. Além das “febres”, designação geral para várias patologias, Aracaju enfrentou surtos de cólera, em duas ocasiões, a primeira delas quando ainda dava os primeiros passos de sua construção. Os esforços do presidente Barbosa, já doente, e dos barões de Própria e de Maroim, que assumiram na condição de vices da presidência da Província, deram resultado e o plano de edificação da cidade continuou, como continuaram os problemas, ainda hoje carentes de solução. Pequenos rios, córregos, lagoas, pântanos tomavam a paisagem da Olaria, local escolhido para ser construída a cidade. E de lá para cá, um século e meio, e a questão sanitária continua desafiante. São canais sem revestimento, sem tratamento de suas águas, são lagoas alimentadas pelas chuvas, são áreas inundadas, estagnadas, focos de doenças. A drenagem, o escoamento das águas pluviais, o esgotamento sanitário, que ainda cobrem parcialmente a cidade, são prioridades de 150 anos, a espera de obras definitivas. Antonio Samarone de Santana, doublé de professor e de político, é um especialista nas doenças vinculadas as condições de salubridade da capital sergipana e fez mestrado no assunto, publicando agora sua dissertação, sob o título de As Febres do Aracaju – dos miasmas aos micróbios (Aracaju: edição do autor, 2005), com apoio do BANESE e da Academia Sergipana de Medicina. A publicação põe ao alcance dos leitores e interessados, professores e pesquisadores, estudantes e autoridades, um rico material informativo, acompanhado de reflexões que valorizam a temática estudada. Consultando o acervo de Relatórios e de Falas dos presidentes da Província e presidentes do Estado, até 1930, Antonio Samarone reconstitui a história científica, como contraponto das epidemias que motivaram a ação dos médicos e a benemerência dos hospitais. O livro, portanto, tem duas grandes funções, a de tratar das “febres” e de outras patologias em Aracaju, e a de referenciar o instrumental com o que se fez o enfrentamento, em períodos de adversidade. O livro é completado com o registro de equipamentos de saúde, programas de Governo, e outras providências marcantes, como a criação da Faculdade de Farmácia e Odontologia, o Instituto Parreiras Horta, o Hospital de Cirurgia, que foi transformado em Hospital das Clínicas Dr. Augusto Leite, dentre outros. Com três grandes capítulos, distribuídos em 264 páginas, o livro de Samarone é uma contribuição pioneira, que aborda, em toda a complexidade, a saúde pública da capital sergipana, contextualiza na Província e no Estado, e deixa aberto o caminho de atualização. Revendo a história, o autor presta justiça aos presidentes Rodrigues Dória, médico formado na Bahia, e José de Siqueira Menezes, general republicano, pelo que fizeram, antes de Graccho Cardoso, pela água e pelo esgoto, sem desmerecer a obra ciclópica e genial do presidente, que contratou o escritório do sanitarista, positivista, Saturnino de Brito, para serviços amplos de armazenamento, tratamento e distribuição de água potável, e saneamento em geral da cidade do Aracaju. Político, ex vereador, Antonio Samarone sempre demonstrou sua preocupação com questões sociais, especialmente com a saúde pública. Sua militância, reconhecida pela qualidade dos seus enfoques e críticas, seu entendimento da realidade, muitas vezes exposto em textos, que hoje estão num site da internet, entrevistas ou pronunciamentos, sempre atualizado e disposto a oferecer caminhos alternativos para a solução dos problemas. O livro de Samarone percorre o itinerário que cobre toda a história da Província, de 1824 a 1889, a República, dividida em dois períodos, o de 1889 até 1922, e o que vai de 1922 a 1926, que é, precisamente, o Governo Graccho Cardoso. Com As febres do Aracaju – dos miasmas aos micróbios, Antonio Samarone comparece ao debate temático da saúde pública e deixa antever que vai incorporar, no futuro, outros desdobramentos, não apenas para continuar a cronologia da história, como para recuperar fases e fatos que ficaram perdidos no tempo, como as ações da Fundação Rockfeller, desde a campanha do mata-mosquito contra a febre amarela, passando pelo saneamento das ruas centrais e de alguns bairros de Aracaju, feitos sob a supervisão do Dr. Almeida, responsável pelos aterros da lagoa da Coceira, na Baixa Fria, e da lagoa do Aribé, no antigo bairro do mesmo nome, dentre outros focos de febres e doenças, nas décadas de 1930/40.
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