O descuido para com a memória tem dado imenso prejuízo a Sergipe e aos sergipanos, e de tal forma que será difícil recuperar os acervos perdidos, tragados pelo tempo, sem proteção, ou largados ao abandono, sem cuidados. Os jornais, que são fontes privilegiadas, pela fixação das notícias, comentários, opiniões, colaborações literárias, estão em estado deplorável de conservação e muitos deles estão fora de uso. A tecnologia tem permitido, desde a década de 1980, salvar parte dos jornais, através de microfilmes, CDs, e outras mídias que, a baixo custo, democratizam o acesso às coleções dos diários, periódicos em geral, revistas, e boletins. O que é de papel, portanto, tem alguma sobrevida futura. E o que ficou na oralidade, como salvar? Vilermando Orico canta, acompanhado de Antonio Teles, um dos mais completos artistas do seu tempo em Sergipe
Jackson da Silva Lima, o sempre bom inventariante da literatura sergipana, tem transformado velhos discos de acetatos e fitas antigas, em CDs, recuperando a voz de poetas ilustres para a vida literária sergipana, como Garcia Rosa, José Sampaio, Mário Cabral, José da Silva Ribeiro Filho e Santo Souza. Conta, o historiador da literatura, com colaborações de amigos, como Wagner da Silva Ribeiro, e de acervos locais, que no sacrifício guardam muitas raridades.
O rádio sergipano, iniciado nos salões do Palácio Olímpio Campos, para atender aos interesses do Estado Novo, através do Departamento de Imprensa e Propaganda, que cooptou diversos intelectuais e jornalistas locais, foi muito além da Rádio Difusora, hoje Aperipê. Na própria Rádio Difusora, na administração direta ou quando arrendada ao empresário Augusto Luz, surgiram artistas, cantores e instrumentistas que fizeram nome e receberam aplausos do público. As disputas políticas fizeram surgir outras emissoras, como a Rádio Liberdade, ligada a União Democrática Nacional – UDN, tendo como proprietário o industrial e comerciante Albino Silva da Fonseca, a Rádio Jornal, capitaneada pelo comerciante Augusto Barreto, do Café Império, o industrial Jorge Leite, da SULGIPE, e outros integrantes do Partido Social Democrático – PSD, coligado com o Partido Republicano – PR. Depois veio a Rádio Cultura, de orientação católica, e, mais tarde outros prefixos, nitidamente políticos, muitos deles ainda atuantes, como se pode conferir nas manhãs diárias, quando cada programa se transforma numa espécie de ouvidoria dos temas gerais.
A radiofonia sergipana contou com programas que tinham grande afluência de público, nos auditórios, ou de casa, gerando uma audiência consagradora. Silva Lima, com seu Informativo Cinzano, Santos Mendonça, com seu Calendário, Carlito Melo, com o Carrossel da Alegria, ou com Manhã Sertaneja, se tornaram conhecidos, conquistaram mandatos na Câmara Municipal de Aracaju e na Assembléia Legislativa. E não foram únicos. Os programas de auditório levavam pelas ondas do rádio a voz de Vilermando Orico, um menino prodígio, de voz extensa, caprichosamente bem vestido, que cantava, tocava e ainda assinava algumas das composições do seu repertório. Vilhermando Orico, nascido em Viçosa, Alagoas, em 1944, chegou criança a Aracaju, onde seu pai, José Orico, instalou uma metalúrgica e um estúdio de gravações de acetato, iniciando a produção de jigles e de fitas e discos de cantores e músicos locais. No Centenário de Aracaju, em 1955, Vilhermando Orico compôs e gravou uma música homenageando a Cidade (vide no site www.infonet.com.br/serigysite) e continuou fazendo sucesso até mudar a voz. Tecladista de primeiro nível, adaptou-se à música instrumental, formou um Trio que embalava as tardes de domingo da Associação Atlética de Sergipe, e terminou em Salvador e em São Luiz, como piano bar, até morrer, em 1986, de repente, na capital do Maranhão.
Seixas Dória, já afamado orador e detentor de mandatos, comandava, na Rádio Liberdade, dois programas: Resenha Política e Problemas em Debates, este último contando com a particupação do jornalista e deputado Carvalho Deda. Silva Lima mantinha, no começo da noite, um programa sobre cinema, e contava com a colaboração do economista Antonio Rocha, que usava o pseudônimo de Dr. Gastão. Agláe Fontes comandava o seu Gato de Botas, tendo a ajuda de Santos Mendonça. Nairson Menezes, chegado de São Paulo, introduziu o uso do telefone nas emissoras de rádio, apresentando o Disque Disco, que atendia ao gosto musical popular.
Jóias Humanas de Sergipe era outro programa valioso, de biografias, que a Rádio Liberdade levava ao ar, em 1954, sob o patrocínio do Palácio das Jóias, loja situada na rua João Pessoa, nº 13. O patrocinador – José Gonçalves Lima – era também o criador do programa, apresentado por Santos Mendonça. Jóias Humanas de Sergipe era um programa semanal, e dentre os redatores estavam o Monsenhor Carlos Camélio Costa, que dentre outros escreveu a biografia de Sabino Ribeiro, e o tabelião e vereador João Alves Bezerra, que tratou de Francino de Araújo Melo (França Melo). A seleção musical, que mais parecia uma antologia da música erudita, era feita pelo maestro Genaro Plech, e o programa era retransmitido pelo Serviço de Alto-Falantes Tamandaré e pela Organização Sergipana de Publicidade, localizada na Praia 13 de Julho. O que restou do programa foi o que ficou na memória dos seus ouvintes.