Mesmo que sobreviva ao julgamento definitivo de Dilma Rousseff no Senado, o que parece provável, o governo de Michel Miguel Elias Temer Lulia tende a se arrastar na sua pequenez até o final de 2018 e acabar ficando na história tão conhecido quanto é o nome completo do agora presidente.
Dificilmente, Dilma conseguirá reverter no Senado o julgamento que a afastou do cargo, quando já não conseguiu sequer um terço dos votos, número que precisará contar até outubro.
Para ser definitivamente afastada, dois terços dos 81 senadores terão que ficar contra ela. No julgamento da admissibilidade do processo, na madrugada da quinta-feira, 12, já haviam conseguido 55 votos a favor do impeachment, muito acima da maioria simples necessária e mais do que os 54 indispensáveis à cassação. E três senadores estavam ausentes.
Mas isso não significa popularidade. O governo Temer nasceu impopular, trôpego, vacilante, dando sinais de assim permanecer se efetivado como titular do cargo.
Em uma semana de governo ele produziu mais ruídos, mal-entendidos e gafes do que Dilma nos seus cinco anos e quatro meses de gestão.
No festejado governo de salvação nacional a falta de mulheres e de negros para chefiar ministérios somada à extinção da pasta da Cultura foram os primeiros sinais de alerta àqueles que ainda comemoravam a derrota do PT.
Os ministros escolhidos também foram criticados. A começar pelos nove citados na operação Lava Jato, que agora têm foro privilegiado. Além disso, Temer escolheu políticos e não técnicos para ocupar as pastas.
Assim é que na Saúde chegou o engenheiro e deputado Ricardo Barros, defensor de cortes no Programa Bolsa Família e que responde a escândalos como ex-prefeito de Maringá, no Paraná.
No Ministério da Educação e Cultura pousou Mendonça Filho, pernambucano que se consagrou como autor da emenda que permitiu a reeleição de Fernando Henrique Cardoso e que chegou agora aventando a possibilidade de cobrança de mensalidades em universidades públicas.
Para gerir a pasta do Trabalho, o pastor evangélico Ronaldo Nogueira de Oliveira, político que apresentou projeto de lei propondo que as faltas de trabalhadores domésticos fossem descontadas do período de férias.
Aí vieram as demissões em massa, incluindo um garçom querido no Palácio do Planalto, acostumado a servir ao próprio Temer. Negro, foi acusado de ser petista demais para permanecer.
Também foi exonerado o presidente da empresa pública de TV, a EBC, Ricardo Melo, sem aprovação do conselho curador, como exige a lei. A demissão gerou protestos dos funcionários.
E houve manifestação em frente à extinta Controladoria-Geral da União, função teoricamente absolvida pelo Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle. Todos temem pelo fim da CGU e o fim da independência do órgão, agora vinculado à Presidência da República.
Sem contar as propostas de governo nada populares, como a expectativa de fixação de idade mínima para a aposentadoria, privatizações de empresas públicas e ameaça ao Minha Casa Minha Vida.
No capítulo das declarações infelizes, a afirmação do presidente de que sua mulher era advogada sem ter feito a prova da OAB colocou o peemedebista na parede.
Temer repreendeu os ministros da Saúde, Ricardo Barros, e da Justiça, Alexandre de Morais. O primeiro por ter dito que o SUS seria reduzido e o segundo por falar em mudanças na forma de escolha do procurador-geral da República.
O presidente interino desautorizou-os a expressar opiniões, porque já estava sendo taxado de realizar políticas retrógradas e de direita. Mas ele próprio falou bobagens desde o primeiro dia do “novo” governo.
No discurso de posse, Temer citou uma frase que o inspirou, ao passar por um posto na Rodovia Castelo Branco: “Não fale em crise, trabalhe”. A frase, no entanto, foi escrita por um homem conhecido como Jaca, que está preso, condenado a oito anos e dois meses em regime fechado por tentativa de homicídio.
A escolha do novo logo do governo foi outro vexame: trouxe o globo da bandeira do Brasil de 1961, usada durante toda a ditadura militar. Na imagem, as estrelas que simbolizam os estados Acre, Tocantins, Amapá, Roraima e Rondônia ficaram de fora.
Para piorar, o publicitário Elsinho Mouco, responsável pelo logo, afirmou que a marca foi escolhida por Michelzinho, de 7 anos, filho de Michel e Marcela Temer. O menino teria achado o desenho lindo.
E não poderia ter sido mais adequada a moldura que completa esse quadro bisonho: a escolha do deputado federal André Moura para líder do governo na Câmara.
Além de já condenado na segunda instância em Sergipe por improbidade administrativa, de ser alvo na Lava Jato, ser réu em três ações penais no STF e ser investigado por tentativa de homicídio, Moura incorpora como nenhum dos 513 deputados a persona de Eduardo Cunha. Pode ter dado um tiro no pé ao se expor tanto publicamente.
O afastado presidente da Câmara dá sinais claros de que interfere no governo nascido em torno de um suposto sentimento nacional de reação e combate à corrupção.
Risco às conquistas sociais, trapalhadas, descrédito, ilegitimidade, falta de apoio popular, ausência de perspectivas e crítica estrangeira. A emenda está pior do que o soneto e dificilmente haverá concerto.