Finalmente alguém cometeu a ousadia de avaliar o ensino e divulgar o resultado, mostrando qual escola ministra uma boa educação frente a muitas que fracassam. Digo ousadia e falo em fracassos, porque, diferente dos campeonatos esportivos e do futebol em particular, quando torcedores e aficionados fazem todo tipo de esforço para que o seu time se revele como o melhor, a educação não tem direito a taça, volta olímpica, nem comentários intermináveis nos programas do rádio e da TV. Diferentemente também porque o futebol e o esporte em geral, movimentam fortunas enquanto em educação, prefere-se gastar pouco e desprezar bastante, passando pelo desapreço e ódio contra a escola. E este desapreço é tamanho que não se conhece na grade de programa das nossas TVs e rádios, sem exceção, um temário dedicado ao ensino e à formação do nosso povo, excetuando-se aqueles passados na madrugada, ali colocados para o desligamento, por descanso, dos aparelhos receptores. Mas, que não se culpe as emissoras. O culpado é a própria audiência, e como conseqüência a inexistência de patrocinadores. Afinal, quem não prefere os programas de desenhos animados, as discussões de fofoca nos escândalos da TV e da política, as tolices e bisbilhotices, tipo big brother que representam verdadeiras redes de arrasto de muito dinheiro, sem falar nos programas esportivos, noticiários e novelas? Alguém já se deu conta de que até nos noticiários, por exemplo, as emoções do programa seguinte representam as notícias mais importantes e mais destacadas? Pois é! O telespectador é instigado a emburrecer-se, fidelizando-se na audiência, este novo escravagismo consentido por alucinógeno, sem verdugos, castigos ou pelourinhos. O telespectador, o ouvinte viciado no rádio vira escravo da opinião publicada, deixa de refletir por si próprio, e prefere até não pensar, mais preocupado com o pé-de-atleta do campeão do reality show, quem se amancebou com quem, quem desmunheca ou joga peteca, enfim, nada que eleve a audiência, em termos morais, intelectuais e éticos. Sem falar que a formação intelectual e profissional exige esforço e pertinácia, e ali na TV ou no rádio, tudo pode ser conquistado na esperteza de personagens, na safadeza de adúlteros simpáticos e lascivos, e o cidadão comum é arremedado como uma besta quadrada insossa e sem luz. E ao lado de toda esta programação sem luz e sem brilho, insere-se no imaginário coletivo que a educação não é importante, e mais, que em educação ninguém sabe o que é verdadeiro, daí ser melhor perder-se na sombra onde todos se batem, se perdem e se salvam. Sobre este ponto de inversão do essencial pelo lazer, como ressaca desta alucinógena imagética coletiva, é fartamente comprovado nos estudos de inadimplência das escolas, que muita gente prefere despender fortunas em cirurgias plástica e estética, de seio, de ruga e de pelanca, ou até mesmo um implante, por gigante, peniano, a despender ano a ano com a escola de sua prole e dependência. Ou seja, elege-se o que engana, ilude e mente, mesmo que isso seja inclemente com a escola e o docente em desprezo e desapego. E não são as lipoaspirações, os silicones de peito, ou as próteses dos músculos fenecidos que salvam a humana besta, cada vez mais bestializada quando usa sua ciência em tamanha displicência. Não há salvação, repete a humanidade por seqüência e experiência, não há esperança, fora da educação e do estudo consistente e persistente. E neste particular, sejam esquecidas até as religiões com suas querelas e dogmas. Porque ninguém até hoje descobriu a humanização do ser e a tolerância entre os homens sem a aprendizagem de bons hábitos e métodos, costumes e aptidões que não se faz sem aplicação, responsabilidade e esforço. Dia virá talvez, que os cérebros em formação poderão ser nutridos e preenchidos com dados e operações, iguais aos discos rígidos dos nossos computadores. Será um pensamento utópico ou uma constatação científica a conquistar? Poderemos um dia, chegar a transferir por mera transposição de comandos ctrl-c, crtl-v, cérebro a cérebro, os dados de um sábio para um troglodita preguiçoso? Poderá ser isso feito, sem traumas nem esforço, em meio a um sono bíblico de Adão? Poderá ser isso feito também, sem violação dos direitos individuais de identidade e sigilo, ou a tudo armazenado na massa cinzenta perpassará um interesse maior, por coletivo? Se for assim, basta botar alguns para quebrar a cabeça destrinçando teoremas e algoritmos e depois repassa-los à massa ignara e preguiçosa que poderá melhor gastar o tempo no gozo e no riso; com silicone, estiradas de pele e membro viris de aço inoxidável, só pra ser mais duro e não corroído. Mas, infelizmente, este é assunto mais que roído. A escolinha risonha e franca é utopia que jamais será alcançada. Poder-se-á modificar os métodos pedagógicos, utilizar novas ferramentas de ensino-aprendizagem, mas nada prescinde o esforço e o escorço de estudantes e mestres dedicados. E é isso o que diferencia o bom e o mau ensino ofertado por escolas e faculdades. E assim eu louvo a divulgação escancarada do ENEM, mostrando quem deve se orgulhar do que faz e quem tem que se desculpar pelo que não fez. Sobre esse aspecto, eu relembro o artigo “O ensino público deve acabar?”, que publiquei na Gazeta de Sergipe, em 16 de julho de 1991, e que consta de meu livro “Despercebido,… mas não indiferente” no qual eu avaliava o resultado do vestibular da nossa Universidade Federal de Sergipe. E eu falava que naquele ano de 1991, das 1235 vagas ofertadas, 454 foram ocupadas por alunos egressos da escola pública, 217 pela pública e particular, enquanto 554 haviam estudado exclusivamente o segundo grau numa escola particular. Constatava eu então, e ninguém deu bolas na ocasião, ser uma falácia a falência do ensino público frente ao privado. Aquele resultado, um dado tosco apenas, evidenciava a precariedade de muitas escolas particulares, verdadeiras arapucas de desserviço à educação, que mereciam ter seus nomes execrados ao vivo e em cores, por piores e bem piores, que muitas escolas públicas humilhadas. E a UFS, por doutos luminares e especialistas, abastardou a moda, a mediana o desvio padrão e toda estatística, preferindo olvida-los no engodo e na penumbra, onde todo colorido brilha pardo. Uma conduta, sem fulgor de canto e bardo, que nunca mudou de lá para cá, afinal ninguém analisa nos concursos vestibulares, repetidos todos os anos, este dado mais que notável de avaliação de nosso ensino. Naquele concurso vestibular de 1991, por exemplo, o Colégio de Aplicação da UFS ficara em terceiro lugar em eficiência de aprovação, tudo sem arroubos de faixas pela cidade, nem zorras de propaganda. E a UFS, ao se calar sobre toda essa zorra abastardada, desestimulou alunos e docentes de sua própria escola, o Colégio de Aplicação. Fora por medo? Timidez? Ausência de ousadia? Excesso de modéstia? Desapreço por moléstia com o bom ensino? Pergunto eu ainda, teimosamente equivocado. Felizmente, com equívocos à parte, o Ministério de Educação resolveu tocar no pomo da discórdia da avaliação e do ensino. De modo que vejo com muita simpatia esta divulgação do resultado do Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM. Muita gente dirá o contrário. Avaliação sempre será motivo de puxar briga, até porque o ENEM não tem o condão de ser um vernier incontestável na aferição da qualidade do ensino ministrado. Some-se a essa imperfeição, a maneira como tem sido entendido o alunado que falta e não faz a prova. Para ser melhor coerente com uma avaliação consistente e democrática, correto seria atribuir nota zero aos alunos faltosos, num cálculo de escore final retificado. Contudo, mesmo com essa falha que suponho capital, o resultado apresentado é um dado muito alvissareiro diante da treva que permeia o assunto. Um resultado que suscitará muitas críticas, sobretudo dos que não se gostam desmascarados no erro. Procurarão, talvez, falar de humilhações, invocando ressarcimentos financeiros de prejuízos bem merecidos. É aquela historia de procurar beneficiar o erro, afagando quem o comete; igual ao inadimplente que não paga a dívida de um condomínio, e o processa invocando ressarcimentos financeiros. Mas, só para terminar, e sem falar de ressarcimentos de dinheiros, nem de inadimplência de condomínios, louve-se o nordeste, visto no sul como um sumidouro financeiro e um condomínio de pobreza. Aplausos de muitas palmas merece o Colégio Helyos, de Feira de Santana – Bahia, com uma pontuação média de 80,29 no ENEM, ficando no quarto lugar entre as melhores escolas do país. Veja o resultado integral do ENEM no site http://mediasenem.inep.gov.br/desempenho.php
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