Estou a escrever na manhã de 26 de fevereiro de 2025, dia que se fará notável na História Pátria, por tornar Réu o“Capitão-de-pijama”, Jair Messias Bolsonaro, aquele que as ruas aplaudem, gritando: “Mito, Mito, Mito!!!”, o Ex-Presidente mais-amado do país.
Por enquanto, aquele que se definiu “imbroxável”, exemplifica-se retilineamente ainda, exibindo-se altaneiro, corajoso e digno, perante seus algozes, adversários e inimigos desde campanas outras, posando sóbrios e imparciais, quando ali estão, enquanto tribunal discricional erigido, para conferir crime onde não permeia dolo.
Do dolo e do crime, falam os doutos, que o delito só existe se houver uma Lei prévia que o defina.
E as Leis, pelo menos aquelas dos “Estados Democráticos de Direito”, só exibem vera valia, se advierem do Poder Legislativo, suas Câmaras Baixa e Alta, caso nosso, por Republicano, que deve surgir via processo amplo de discussão e debate, tudo em prévias regulamentações e rituais, nestas casas legiferantes, visando uma posterior promulgação.
Nesse contexto de melhor valia, os feitos ditos “promulgados”, são tão louvados e exaltados, que os seus parentes remotos, ditados por atos principescos, ou por desacatos iguais, proconsulares, quando assim são exarados e impostos, recebem nominação perjura, de “outorgados” por incúrias, permanecendo para sempre assim adulterino, rubricado, jamegado, por uma cerve matriz; autoritária!
Não é o caso, ou é todo o caso do Mito Ex-Presidente Bolsonaro, sendo julgado por uma turma do Supremo Tribunal Federal, afinal quando há o desejo de condenar politicamente alguém, todas as regras conduzem ao feito, e se um vasto cabedal advocatício, com tempo exíguo é permissível, tudo lhes finda fútil, irremissível, qual barro inútil, nas mãos de um artista ceramista, sem nenhuma esperança de escultura.
Nesse contexto dos julgamentos políticos, os regimes autoritários e atrabiliários têm os seus juízes, carcereiros e carrascos, todos exibindo o seu mister com boa valia, serventia e fingida valentia… Todos defendendo a pureza de seus atos desferidos.
Lembremos alguns, só por ironia e algaravia.
Na Roma antiga, no temor de julgar César, seus algozes o esfaquearam sob a estátua de Pompeu, sujando o lajeado do Senado, o crime sendo tamanho, que um discurso panegírico de Marco Antônio ao seu cadáver, valeu uma execração tamanha, que uma matança sucedeu aos sicários do crime e seus corifeus, sem merecer julgamento.
Por julgamento, todavia, o Rei Charles I da Inglaterra foi executado a machado por Oliver Cromwell, declarado Réuapós um julgamento complicado, já que o seu indiciamento fora tido por ilegal pela Câmara dos Lordes, porque a legislação cogente o preceituava um prévio consentimento real, assentimento que foi anulado pela Câmara dos Comuns , que para tal fim mudou a lei, ou aplicou uma sua filigrana, criando uma Comissão Processante, num Alto Tribunal de Justiça estabelecido por decreto; compondo-o por 135 comissários julgadores, muitos dos quais se recusando a participar e a ajuizar o Rei, sobrando 68 que o julgaram pelas acusações de “alta traição e muitos outros altos crimes”, uma responsabilização moderna, por exclusivo seu comando.
De forma inusual àquele tempo, hoje sendo imitado em contratempo ao Ex-Presidente Bolsonaro, a acusação considerando o Rei “culpado de todas as traições, assassinatos, estupros, incêndios, saques, desolações, danos e males a esta nação, realizados e cometidos, ou causados, por aquela guerra entre o Parlamento e a Coroa”, guerra que então se estimava terem perecidos cerca de trezentas mil pessoas, ou 6% da população bretã, em tantos conflitos”, sendo o Rei Charles I, culpado de tudo e dos canudos, como assim acontece com todos na guerra perdedores, desde o tempo do verbero de Breno, na longínqua Roma; ameaçada: “Vae victis!”
E nesse delibar processual, o Rei Charles I perdeu a cabeça separada a machado, repetindo sem ser ouvido: “Nenhum poder terreno pode justamente chamar-me (que sou seu Rei) em questão como delinquente … os procedimentos deste dia não podem ser garantidos pelas leis de Deus; porque, pelo contrário, a autoridade de obediência aos Reis é claramente justificada, e estritamente comandada no Velho e no Novo Testamento …
Em outra via, e em contundente ousadia, tudo lhe seria inútil, porque um Lorde Protetor Corajoso, o mais que cerebrino, Oliver Cromwell, o trataria refém de um julgamento eminentemente político, em cujo cenário nenhum dos deuses comuns o vogariam.
Se Charles I perdeu a cabeça em Londres, o mesmo aconteceu com Luís XVI, o cidadão Luís Capeto, guilhotinado em Praça Pública da Revolução, hoje rebatizada como Praça da Concórdia, nos albores do chamado regime do Terror Revolucionário, porque não bastava à República tê-lo sido proclamada em convenção…
Era preciso matar o Rei, reeducar o seu Delfim, criança frágil, encarregado a um ébrio cidadão sans-culotte, que no afã de lhe retirar os vícios, deixou-o morrer por inanição e frio.
Ou seja, tudo fora aprovado pelas leis vigentes, por adredemente preparadas; seus juízes, seus advogados, e toda sua ampla serventia.
No contexto do julgamento de Luís Capeto, em bom exemplo, bem vale repetir o pronunciamento de Maximilien Robespierre, que citando os argumentos de Saint-Just, o “Arcanjo de Deus”, dissera : “Luís chamou para castigar [o povo francês] os exércitos dos tiranos, seus confrades: a vitória e o povo decidiram que o único rebelde era ele; ele já foi julgado. […] Declaro com pesar esta verdade deplorável, mas Luís deve morrer , porque a pátria precisa viver.”
E mais, só para dizer mais um grande perigo que os julgamentos políticos encerram. A mesma Convenção estabeleceu depois: “quem na França se dispuser a restabelecer os reis e a realeza, seja qual for a denominação , será punido com a morte”.
O deputado De Sèze, discursando em favor de Luís XVI, verberou inutilmente perante seus colegas: “Procuro juízes entre os senhores e vejo apenas acusadores”.
Já o Rei Luís Capeto, mais inútil ainda, falou docemente: “Minha consciência não me acusa de nada”.
E quando aqueles outros, por mais ingênuos bem o pediam um julgamento popular, de Saint-Just tiveram a derradeira e definitiva oposição: “Nós julgamos os reis perante o Universo”.
Porque a própria Convenção o estabeleceria do Réu-Rei, seus dois defensores: Malesherbes, que se candidatou por ter sido seu Ministro, e De Sèze, um advogado de Bordeaux, causídicos que em tempos de muito barulho e baixa escuta revelaram-se tão inúteis, quanto pior ameaçados.
O rei foi considerado réu e culpado por 707 votos a zero.
Por 424 votos contra 287, decidiram que o seu julgamento não seria ratificado pelo povo.
Por 387 votos a favor da pena de morte, contra 234, a morte venceu por 53 votantes.
Pleiteou-se depois um Sursis, afinal alguns que escolheram a pena capital, sentiram-se assaz desconfortáveis.
Tudo restou, porém, inútil, porque o Sursis foi rejeitado por 380 a 310, o Rei sendo decapitado, sendo-lhe negado o discurso final, mal escutado por frenético rufar de tambores.
Tambores à parte, a navalha revolucionária ficou cada vez mais sedenta de sangue., com os julgamentos, sempre políticos; se sucedendo.
O sábio químico Antoine de Lavoisier, “Pai da Química Moderna”, por exemplo, foi julgado junto aos “Fermiers”, os cobradores fazendários de então.
Quem hoje gosta ainda de algum cobrador de imposto?
De igual modo àquele tempo, quando alguém quis lhe poupar a cabeça por ser um sábio, um cientista, um dos seus acusadores julgadores, o implacável Fouquier-Tinville, verberou impávido de sua curul julgadora: “La République n’a pas besoin de savants” “A República não precisa de sábios” em lapidar verdade exaltada, toda e sempre!
O que restou belo, após o tremor Prairial Revolucionário, ceifando nobres e prelados, por inicio, grassou depois pela Direita Girondina, dita reacionária, virando o rumo e o aprumo, chegando por fio dos tempos aos cordéis Termidorianos, em que não mais houve julgamentos em corte e debate, havendo o puro e simples desbaste da esquerda biliosa dos Jacobinos e Enragés exaltados, até que as águas se acalmarem com os tempos Brumários, autoritários, trazidos por Napoleão, o “Pequeno Caporal”, que tudo amainou, virando novo Rei Imperador.
Se a Revolução Francesa muitos fatos revelou, do Czar Nicolau II e sua família, talvez porque um seu julgamento os fizesse mundialmente traumáticos, foram logo eliminados por Vladimir Lenin, e sua Revolução Bolchevista, que não os poupou, aprisionando-os numa moradia isolada, a Casa Ipatiev, localizada em Yekaterimburg.
Conta-se que o Czar Nicolau, sua esposa Catarina e todos os seus filhos menores, foram arrumados em roupa de festa como se ali estivessem para ser fotografados, sendo fuzilados por valente guarnição de trabalhadores, todos alistados a serviço do novo regime; a República do Proletariado.
Muita coisa se poderia dizer ainda destes julgamentos, sempre notáveis, por republicanos!
No Brasil, hodierno, por Republicano, os Golpes de Estado se fazem agora com uma simples pichação de uma estátua, com os dizeres em batom labial de “Perdeu, Mané!, sem virgula por pontuação ou mera interjeição.
Em contraparte repetida à exaustão, o noticiário está a querer por reprodução sucessiva, acusando o vil golpe desferido, sem exibir qualquer prova, que um grave crime atentatório contra o Estado Democrático de Direito foi cometido na Praça dos Três Poderes, no fatídico domingo 8 de Janeiro, já que as câmaras escondidas nada flagraram, por estarem, inexplicavelmente, desligadas!
Como do fato vale o ato, e o conto que dele se conta, a manicure Débora, foi apenada sem recursos e sem sursis: a 14 anos de reclusão fechada, dos quais dois já o foram cumpridos, preventivamente, acrescidos agora de uma modesta multa de CR$30.000.000,00, trinta milhões de Reais, só para delimitar com seis dígitos de zeros bem redondos, a pena futura do “criminoso-mor”, Jair Messias Bolsonaro, em delito análogo ao dos Reis Charles I e Luís XVI, a receber pena maior, inclusive porque a nossa República não permite ainda; nem o cepo do machado, nem o cutelo da guilhotina, muito menos a forca que sufocou Tiradentes, ou qualquer vil garrote espanhol, que bem possa invocar em seu pior padecer.
Pode o Mito Bolsonaro reivindicar pena mais leve enquanto Réu?
Eis o desfecho esperado em nossos tempos, sem esperança de vingança!
Se até ontem o Mito Bolsonaro era um Pré-Réu. Logo mais será um Réu. Um Réu sem crime, é verdade!
Pergunto eu finalizando, e sem ser arrolado ainda, de repente alguém me insinua um erro maior, por pensar tão divergente: é preciso cometer algum crime quando o julgamento é político?!
Para alergia de seus muitos inimigos, o Mito os desafia, digno ainda, e mais do que nunca os incomodando, por imbroxável!