Depois a gente se conserta

Costuma-se atribuir a Tom Jobim, a frase muitas vezes citada: “o Brasil não é para principiantes”.

Com sentido ou nem tanto, quer-se dizer que o nosso país gigante é tão repleno de complexidades que é vã qualquer filosofia compreendê-lo, uma impossibilidade para qualquer neófito querer entendê-lo ou explicá-lo mediante analises similares e simplistas.

Penso que a frase em questão fora fruto de uma insatisfação do maestro quanto aos apupos recebidos no 3º Festival Internacional da Canção, ocorrido em 1968.

O júri do festival tinha escolhido Sabiá, canção de Tom Jobim e Chico Buarque de Holanda, como a campeã do torneio, mas o público presente no Maracanãzinho preferira “Pra não dizer que não falei das Flores” de Geraldo Vandré.

A vaia fora, incompreensível, por monumental: coisa de política e não de melodia.

Todavia a frase sempre é relembrada, sem que ninguém, que eu saiba, explicite esta origem por razão.

Quer-se dizer que foi algo surgido de uma maturação estudiosa da alma nacional, alguns vendo-a como uma extensão macunaímica, por filosófica, do “nosso herói sem-caráter”, antropófago por essencial natureza, a suscitar nossa “velha bagunça brasileira”, extensão da verve francesa a exaltar o exótico, “Le Bordel Bresilien”, que conjuga o ibérico Pedro Malasartes, bem citado por Câmara Cascudo, que ensejou óperas nacionais versejadas, uma por Oscar Lorenzo Fernandez e Graça Aranha e outra por Mozart Camargo Guarnieri e Mário de Andrade, sem falar da excelente literatura de cordel de Minervino Francisco da Silva, versejando o  “Encontro de Cancão de Fogo com Pedro Malasartes”, tudo do nosso hinário, nada serpentário, nacional; a vingar somente o riso e sem maldades.

Igual àquele bem resfolegado papagaio, Zé Carioca, cheio de manhas e requebros, se encontrando com o gago, Pato Donald, em amizades panamericanas, ditadas por Walt Disney, em tempos de 2ª Grande Guerra, com o Presidente Roosevelt fumando charuto Havana, com GG, Getúlio Vargas, o nosso ditador, em bombachas, bonachão.

Porque em terras brasílicas, o único ditador verdadeiro que tivemos, o GG, era um passador de rasteira genial, um personagem principal, por malandragem ideal, dos cafés-concertos cariocas, em tempos de samba que só restaram encerrados porque aconteceu um voluntário suicídio.

O Brasil tem dessas coisas; os traumas se fazem ao contrário, como se fossem trágicas bufas, com os heróis fugindo e pedindo arrego, sempre covardes e sem traumas, ao verem Getúlio Vargas bem maior e um gigante no ataúde, que no pleno gozo do vigor e da saúde.

No entanto aqui se choram cachoeiras e cascatas do sofrimento naquilo que poderia ter sido, mas não foi…

Mas, por que falar do que não foi, se o que poderia ter sido enseja muito melhor a dor que bem podia ter sido?

Melhor não foi assim, saber que a nossa alma nacional jamais geraria um Danton qualquer falastrão; um panfletário sanguinário como Marat; um Robespierre, perigoso e pior, por incorruptível; um arcanjo-de-Deus seu corifeu, Saint-Just; muito menos uma Manon Roland, cantando a liberdade na Praça do Povo e do Condor; ou Charlotte Corday, em outra dor, por musa menor afiando a faca, que bem rasga do mau Chico, jornalista, a veia aorta, e a de qualquer um na mesma ameia, cortando no mesmo traço o vezo risco?

Por que, não é assim que tudo finda em trisca; no mesmo cisco?

O mesmo lixo varrido da História?

Hoje a História está a falar de novos inconformados, o noticiário dissertando o atentado que não aconteceu, mas que era, era, era: para ter sido!

Em terras onde não vige um Cassius ou Brutus romanos, e outros como o francês  Ravaillac, e o americano  John Wilkes Booth, sobram cabelo a podar, basta barba a cofiar, e até algum cavanhaque à Caio Julius César, Henry IV de Burbom ou Abraham Lincoln, todos dormindo como anjos em suas camas, sem adentrar na História!

Se nos sobram dos ataques a tentativa, perambula-nos o excesso de sotaque! É sotaque daqui, ataque de lá, saque de não sei de onde, em muitos golpes de atabaque, sempre de araque.

Abunda também o jamais feito, o nunca realizado!  Mas muito bem, bem, bem… planejado!

Que o diga em tempos renhidos, mas repetidos como engodo o “plano Cohen”, que nos trouxe o distante Estado Novo!

Aquele plano que ninguém nunca acreditou, mas recolheu, por muitos anos o resultado.

O resto é sempre a velha história inconvincente dos eternos e sempre: vencidos!

Sem esquemas que nos expliquem, repetem sem fim à Jobim: “o Brasil não é para principiantes!”

– Ou “o país da piada pronta!” – como fala o festejado humorista.

O país da piada sem graça! – ressaltaria bem pior um outro, em pensando consequente.

Melhor seria talvez dizer, que somos um país sem memória, a se reescrever em tombos, por erros repetidos na história, porque a vaia memorável de Sabiá no Maracanãzinho, foi um feito inesquecível das esquerdas descabeçadas reunidas, colhendo a seu gozo e choro a fausta inglória do AI-5, que foi tudo, enquanto vigeu e viveu, calando a plateia, a pateia, e pacificando os ânimos da patuleia, via amargo trago por panaceia!

– Mas, por que não vaiar,… se sempre poderemos errar de novo?

– Não somos o país do ensaio e erro!  Depois a gente se conserta!

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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