Discursos inúteis.

Diz-se do Senado, por sua lembrança Romana, uma casa de legisladores anciãos.

Da velhice, e portanto de sua ancestralidade latina, esperava-se a melhor experiencia para criar leis, modificá-las, porque dos anciãos esperava-se uma moderação dos apetites e seus desejos.

Ledo engano, porque foi no Senado de Roma que Júlio Cesar foi esfaqueado, num feito inesquecível do teatro e da vida.

Cesar precisava morrer, segundo aqueles notáveis cidadãos, Brutus, Cassius e Cina, todos Senadores da República Romana.

Não vem o caso dizer que do feito e do fato, William Shakespeare, o grande dramaturgo bretão, compôs o discurso mais notável para o panegírico de um Herói, imortalizando por palavras, ao tribuno Marco Antônio, aquele que depois se entregou e se rendeu aos afagos promíscuos de Cleópatra.

 

Cleópatra, menos lembrada em outras falas, bem dissera, já partindo para o ocaso, justo quando em diálogo quase final com  Otávio Cesar lhe o afiançara, e a nós outros também: “É sabido que nós, os grandes, somos responsáveis por quantos os outros fazem, e que, quando caímos, nosso nome serve para coibir o alheio mérito. Por isso somos dignos de piedade”.

A peça, porém, era outra; “Antônio e Cleópatra”, menos famosa, talvez porque a cobra era personagem maior, por natureza desapiedada e ardilosa, e silente!

Silêncio desapiedado ao qual, “Bertolt Brecht, outro dramaturgo solar, teceu um texto assiduamente repetido desde o seu, mais que famoso, “Vida de Galileu”; quase um lema, por teorema: “infeliz de uma nação que precisa de heróis!”.

 

Frase que não só ressoa incômoda, como enseja uma frustração inquietante, afinal o não possuir heróis a cultuar, e sem coibir o mérito amplo e alheio, do entorno e circunstância em que se vive e com quem se sobrevive, é também tentar transparecer a vã inutilidade das epopeias operísticas, como as de Richard Wagner, com o Anel de Nibelungo.

 

Seria o cantar Wagneriano uma jactância inútil, sobretudo do canto funeral, amplo e geral, de Siegfried, o herói nórdico fundamental, tudo isso sem ousar ir à tanto, e ao contraponto de louvar o “Homem Sem Qualidades”, justo Ulrich, um matemático imaginado pelo austríaco Robert Musil, que em resolvendo entrar de férias, até da vida, desistiu de ser um grande homem, preferindo ser um cidadão comum, periférico, para assim se arvorar em maior importância?

Ou desimportância pior, por ser gaiato, desgraciado mas boçal e engraçado, como o paulicéico, Macunaíma, “o herói sem nenhum caráter”, do nosso Mário de Andrade, imagem do Brasil que era, e continua, cem anos depois, em pouca evolução, mas engraçado; engraçadíssimo!

No mesmo riso e no mesmo acorde, continua o Senado, em vésperas de renovação, a exibir uma moléstia sem perspectiva de cura de um país gigante, cheio de problemas e desigualdades, nivelados em Estados, onde tudo se espraia numa federação defeituosa…

Do Senado, uma lembrança imperial antiga, dos Monarcas, Pedro I e Pedro II, os mandatos eram vitalícios, conferidos mais das vezes a homens fieis à coroa.

Nesse tempo vigia o Poder Moderador, dispositivo que permitia ao Imperador, derrubar os gabinetes ministeriais ao seu gosto e prazer, afinal o Rei bem sabia que as eleições sempre eram ganhas pelos políticos que detinham o mando e o poder nas províncias, nos dois partidos políticos; o Liberal e o Conservador.

Dos dois partidos, dizia-se pelas esquinas: Nada mais liberal que um conservador na oposição; nada mais conservador que um liberal no governo”, ou de forma mais xistosa dita pelo político Antônio Francisco de Paula Holanda Cavalcanti de Albuquerque: “nada mais semelhante a um Saquarema do que um Luzia no poder”.

Era uma maneira desditosa para criticar a semelhança entre os partidos Conservador (os Saquaremas), e Liberal (os Luzias), do Brasil Imperial, enfatizando que, assumindo o poder, qualquer um, os liberais acabavam agindo de forma muito parecida com os conservadores, mantendo a estrutura social e econômica do sistema vigente, que continua a desagradar os Gregos e os Troianos, os Horácios e os Curiácios, levas infindas de pascácios. e tantos outros desumanos, porque caluniados já estão em todos os prefácios.

Porque em terras onde os heróis não vingam, os bandidos proliferam e os sofrimentos vingam lágrimas eternas.

E se no Brasil, pranteia-se eternamente e em demasia, o que dizer do Senado que a tudo coonestou desde o Império e continuou na República, deixando de ser vitalício apenas, passando a ter um mandato de nove anos, a princípio, e hoje se estendendo a oito anos, o que seria uma eternidade, não fosse o homem insaciável!

E nessa insaciedade continuada é facultada a reeleição sucessiva, sem limite, e cabalisticamente distribuída, três Senadores por Províncias, hoje 27 Estados Federados, desigualmente divididos, e misteriosamente desiguais a perder de vista, porque  enigmaticamente resistem piores, renovados 1/3 e 2/3, a cada quatro anos, por escolha desinfeliz de duas frações, dízimas simples, inconsúteis, sem falar das camarilhas e costuras para acertos na burla das eleições, negociatas várias de suplência, muitos sempre a ganhar e sem receber um voto sequer do eleitorado.

E por que estou falando disso agora?

Porque entre as atribuições do Senado Federal está aquela de referendar a nomeação dos Ministros do Supremo Federal, dos Embaixadores de Estado, e do Procurador Geral da República, entre outros quejandos, oportunidade para muitos baculejos e gaguejos, só para dizer que o Poder Legislativo nunca foi servil, nem o será, nem ao Executivo Provisório, nem ao Judiciário Permanente e quase vitalício, este o Poder maior de todos, porque a todos julga e a todos os despacha, não à forca ainda, mas ao presídio ou à inelegibilidade!

Na semana que findou, por exemplo, aconteceu a recondução do Procurador Paulo Gonet, mediante votação, primeiro na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), sendo aprovado por 17 votos a 10, e depois no plenário, pelo placar de 45 x 26, quatro votos acima do mínimo exigido.

Alardeia a imprensa, que este foi o placar mais apertado, querendo talvez insinuar uma derrota futura do Presidente Lula, que está para indicar o seu auxiliar, Jorge Messias, o “Bessias”, como novo Ministro do Supremo Tribunal Federal. Um tolo engano porque o Executivo quando assim o deseja, sempre nomeia os seus, mesmo não tendo tanto mérito, quanto é requerido, constitucionalmente!

No mais, quem assistiu as seções da Comissão e do Plenário, na semana que passou, ouviu muitos ataques ao Procurador Paulo Gonet, de molde a preparar o terreno de um convívio difícil; tudo besteira: tudo inútil!

Quando não se possui o numero de votos para derrotar o pleito, melhor é calar, votar silenciosamente, já que o anonimato é a regra, e não simples cobardia.

Adianta discursar açulando a patuleia e jogando inutilmente para a plateia.

Ou seja: o Senado desde o tempo do Palácio Monroe, tão bonito arquitetonicamente como “Bolo de Noiva”, hoje sem memória, por demolido, e agora imemoriável e “desmemoriável” sobremodo, enquanto cuia invertida de Queijo do Reino Palmyra, inútil espelho côncavo que não se espelha, por emborcado, a tudo refletir abafado, apagando qualquer chama e flama que por ali dentro seja haurida.

Se o Senado fosse extinto, muita gente não o prantearia, sobretudo depois do movimento “Muda, Senado!”, alento que foi divulgado sem vírgula, vocação e vocativo…

E o mofo deu, e corrompeu, em oito anos vacuosos e baldios, e pelos desejos atuais da “Direita”, que desalmadamente deseja tomá-lo de atalho nas próximas urnas.

O problema, para mim não é aquele que é eleito Senador. Não!

No Estado de Sergipe, um estado tão ameno quão pequeno, tivemos bons Senadores.

Não foi à falta deles que nos fez e faz, menores!

Seria fácil dizer o contrário, externar qualquer gastrite para enaltecer o gosto e externar o desgosto do mal deglutido, que vira e vem, deseja  ruminar, bovinamente, e não o devia!

Não somos todos assim, ouvindo arengas para bovinos cochilarem, sobretudo quando os nossos campeões dissecam a política partidária?

Dito assim, do que ouvi na semana que passou, o problema para mim é verdadeiramente o Senado, não os Senadores!

Algo ali precisa ser mudado e não é uma nova eleição que irá reformar; desde o mandato excessivamente longo dos Senadores, passando por uma renovação por um terço e dois terços, em dizima periódica perniciosa, e avaliar melhor a Federação, contemplando a realidade da opinião do eleitorado.

Mas, quem sou eu, para contradizê-los, e a tantos constitucionalistas sem fim: não é uma falácia perniciosa, dizer que a Federação comtempla a proporcionalidade do eleitorado dos Desiguais Estados na Câmara Baixa, a serem igualados e compensados na  representação do Senado?

Muito mais do que o extinto “Muda, Senado!”, o que o Brasil precisa é reformar e reconstruir o seu Senado, isso de fora para dentro!

No mais, como nada será mudado, continuaremos a ouvir os discursos inúteis!

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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