Segundo a Wikipedia, a enciclopédia livre da internet, O Confiteor é uma oração penitencial onde reconhecemos nossa pecaminosidade e buscamos a misericórdia e o perdão de Deus.
Os confiteors fazem parte do cristianismo desde o início.
Eu mesmo, que sou um ser resistente, de geração baby-boomer, nascida ao final da primeira metade do século passado, aprendi a oração do Confiteor, batendo no peito como Santo Agostinho o recomendava em sinal de humildade, perante a Missa sacrificial e em recitação latina.
Da recitação latina, esta restou banida após o Concílio Vaticano II, num “aggiornamento” da Igreja, que viera para torná-la atualizada perante os novos tempos pós-revolucionários.
Digo pós-revolucionários, porque o Século XX foi um tempo de guerra, não de revoluções.
Foi um tempo de paz também, longa era pacificada, com a consolidação das democracias ocidentais, e o estado-de-bem-estar-social, imperando mundo a fora, a ponto de alguns pensarem viver um tempo de “Fim de História”, como assim pregou Franz Fukuyama por venda de muitos livros.
Em muitos matizes de releitura da mesma história, muitos e não foram poucos, acharam que a Igreja devia ceder aos seus muitos críticos, os seus inimigos de sempre, mundo a fora, que denunciavam como novo pecado de fim-de-história; o seu afastamento do rebanho.
Era preciso se renovar, diziam muitos bispos incomodados com suas batinas e tonsuras, inclusive, não faltando aqueles que almejavam quebrar todas suas antigas regras, milenares, sem falar também daqueles que se sentiam tão incomodados com os desacertos cometidos, enquanto instituição humana, pecados para os quais não valia o perdão, no confessionário interior, quiçá público, e nem mesmo a sua perene absolvição.
Ou seja, a Igreja errara tanto, e por tanto tempo, bastando para tanto perlustrar todo um passado esquecido, que nenhum perdão bem arrefeceria a impossível absolvição.
E assim, longe de querer enveredar por uma contrição inatingível, muitos entenderam que era preciso se renovar, apagando tudo o que infindos presbíteros pregaram, em muitos séculos de catequese vertical voltada ao alto, e a Deus somente, vendo aí a grande crítica a fustigar, por alienante, como se aí estivesse sem querer e bem querendo; confirmar Karl Marx que via na Religião o puro simples “ópio do povo”.
Por que falar ainda, em tempos novos opiáceos, da salvação do homem da perdição de danações eternas, se tudo isso continuava vão, como o fora sempre assumido, por gentios de todos os tempos, judeus e gregos, Horácios, e Curiácios diletantes, negando o Cristo Ressuscitado, em promessas a todos nós, vendo aí um alheamento imenso e terrível, ao chamado braço horizontal da cruz, onde a humanidade estava a se desgraçar, e a se desgraciar, refém somente e abandonada a qualquer sabor quimérico ilusório, mas prometido, movido ao canto alucinante de sereias novas, desfazendo não só a infinitude do espírito, alma essencial da Igreja, como pregando a finitude do ser, pura e simples, que por pior ainda, nada iria construir nem erigir, se não fizesse do mundo um cenário melhor para todos, bem fruir, sem exceção!
E nessa exegese de rara valia extrema, pouco se compreendia tanta pregação inútil de santos e mártires, por séculos, na conversão dos muitos povos, em todo quadrante da terra.
Algo que restou tão confuso e obtuso nessa releitura de feitos, que até a obra catequista dos jesuítas nas terras ibéricas descobertas, no Brasil e em toda América Latina, vingando cada vez mais execrada, uma dominação pura e simples dos europeus e sua civilização branca, massacrando a cultura aborígene e autóctone, que deveria bem fluir com seus credos e seus deuses, inalterados.
Como dizer assim, por inutilidade, e por pior, iniquidade!, aviltar toda ação sacrificial, missionária de Padres, como Manoel da Nobrega, do Beato Açoriano, José de Anchieta, e de outros como João Salônio e Azpilcueta Navarro, que aprenderam a língua nativa, segundo tais continuados detratores, dentro e fora da Igreja, somente para iludir os índios e as índias, os converter a fé de um Cristo que não era o deles, só para melhor explorá-los em sua ternura?
Ver toda esta obra sacrificial, missionária; de “salvação de almas”, desde a 1ª Missa com Frei Henrique Soares de Coimbra, em Terras de Porto Seguro, na Bahia, como uma simples exploração iniciada e daí pra frente uma extrema e continuada ofensa à cultura indígena?
Não tem sido assim a continuada crítica à caminhada da Igreja ao longo de séculos, ela Igreja, que divina e humana, claudica peregrinamente com a humanidade tentando elevá-la, em tantos medos e incertezas, para Deus.
Por acaso a pregação da Igreja de Cristo ao dizer que o Cristo se fez homem no seio de Maria, para salvação de toda humanidade, não traz consigo este desafio de Fé, que se faz impossível a uns, os agnósticos, e possível a muitos outros, os que em suas palavras acreditam, a ponto de alguns até morrerem sem renegar suas crenças, tudo isso, desde Estêvão, apedrejado, por primeiro, e Paulo e Pedro, contra os quais os Césares tanto investiram e combateram; e nada conseguiram??
Como bem o dissera um dia, Gamaliel, um sábio, em Atos 5:38,39: “Dai de mão a estes homens, e deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra (for) de homens, se desfará, Mas, se (for) de Deus, não podereis desfazê-la; para que não aconteça serdes também achados combatendo contra Deus”.
E daí, por extensão; vingou a grande saga: “O sangue dos mártires é (e foi) a (grande) semente dos cristãos”
E até Santo Agostinho, ele um pecador reconhecido em suas Confissões, de muitos erros cometidos, inclusive do sexo e da concupiscência, na juventude sobremodo, quando os hormônios são vastos e pouco refreados, iludindo até qualquer fugaz racionalidade e frugalidade, recomendava que o Confiteor, enquanto profissão de fé, fosse tradicionalmente recitado, batendo no peito em sinal de humildade, “per mea culpa, mea culpa, mea máxima culpa”, como tem sido de pouco costume, nos tempos de hoje, nas nossas Missas cantadas, que preferem a harmonia de uma adocicada canção, do que o pranto em intercessão que deveria conter no nosso arrependimento enquanto pecadores.
Mas, como diz a canção de Chico Buarque, ele um poeta não transgressor, nem também um bom fingidor: “Não existe pecado do lado de baixo do equador / Vamos fazer um pecado rasgado, suado, a todo vapor / Me deixa ser teu escracho, capacho, teu cacho / Um riacho de amor / Quando é lição de esculacho, olha aí, sai de baixo / Que eu sou professor”.
Porque o Pecado, na mesma linha, não é mais o de Agostinho, arrependido por transgressor; o Pecadorestou pior; pior e maior; por ser Social!
Acima e abaixo, e sem qualquer exculacho da linha do Equador; o Pecado Social gerou a mais que famosa; Teologia da Salvação: demonizando muitos e a bem poucos santificando na América Latina, como uma nova heresia a se impor, gerando divisões e discórdias, no seio da Igreja, com Bispos ditosProgressistas, sempre macios por moderados, e tantos outros excessivamente duros, e imoderados, sendo execrados por Conservadores, e terríveis Reacionários!
Uma execração tão tamanha a extirpar, do mando e do altar, que até o diálogo se fez impossível, em tantos “Conais”, erigidos por leigos e leigas em nova pregação fragmentária, e em tantas “Comunidades Eclesiais de Bases”, que surgiam para mudar o mundo com o esvaziamento do culto, a substituição auto consentida dos Sacerdotes, que cansados se eximem hoje, até mesmo em distribuir a comunhão, sem partilhar com própria mão, como fizera o Cristo no Sacramento da Eucaristia, e assim o quisera nas nossas Missas Dominicais.
Não querem nem distribuir a comunhão?! Preferindo deixá-la aos leigos, não por um compartilhamento de missão necessária, por messe grande e demasiada, perante poucos operários, mas desprezando-se em auto-desfazimento continuado, de sua missão sacerdotal, tão nobre, preparando o mundo talvez, para o seu desaparecimento puro e simples, enquanto Igreja, apagando os seus ritos antigos, suas obrigações por preceito, sem falar da ruína física dos templos, e da apropriação esperta do laicato pelos partidos políticos no seu contumaz proselitismo. Porque isso aconteceu bastante!
O tema me vem agora, porque um novo Papa surgiu.
Ele é um Papa Leão; o 14º de uma longa linhagem de grandes Papas, iniciada por Leão I, que restou um Santo da Igreja, São Leão Magno, assim imortalizado porque foi dialogar em barreira a Átila, o Huno, aquele “Flagelo de Deus” vindo da distante Europa Oriental, em cujas patas do cavalo, no rastro nenhuma relva nascia.
O Papa Leão I, sem espadas nem qualquer comando bélico, poupou Roma de Átila, o Huno, no ano de 452, justo quando o Império Romano do Ocidente, não mais existia, e Roma era um fantasma do que fora e imperava, fazendo o bárbaro cruel retornar nas patas de seu cavalo, restando aí como maior feito heroico, onde falhara toda bravura decurial e centurial, valendo o sacrifício e a vocação para a defesa de sua crença e sua fé, enfrentando a violência e a brutalidade, com o exemplo que se faz coragem a exaltar, no homem para sempre.
Porque de Leão I, por sequência, muitos Papas seguiram, chegando a Leão XIII (1810-1903), o italiano, Vincenzo Gioacchino Raffaele Luigi Pecci-Prosperi-Buzzi, que governou a Igreja num tempo difícil, por 25 anos, de 1878 a 1903, nos chamados tempos de pós-revolução industrial, onde se iniciava uma louvação exagerada dos conflitos do Capital e do Trabalho, tidos como insociáveis e incompatíveis, sem falar de muitos outras agitações, de ordem politica, com muitas quedas de regimes, na Velha Europa, e até no Brasil, com a Proclamação da República, a derrubada de monarquias, aqui e alhures, o republicanismo sendo visto pela Igreja como instituição a temer, porque muitos discursos se fizeram contra ela, com seus sacerdotes sendo postos fora da lei, sendo-lhes proibido até mesmo o uso da veste litúrgica, justo nas suas pregações exteriores.
É em meio a tudo isso que o Papa Leão XIII sem temer o chamado canto às sereias do Manifesto Comunista, publicado por Marx e Engels em 1848, lança sua Encíclica mais famosa; “De Rerum Novarum”, ou “das coisas novas”, construindo daí para a frente a chamada Doutrina Social da Igreja, amparando o trabalho e o contingente massivo de trabalhadores, reafirmando a necessária convivência com o Capital, humanizando-o a serviço da concórdia de todos.
Leio em “De Rerum Novarum”, uma atualidade imensa, hoje esquecida não fosse a chegada deste novo Papa, o americano Robert Francis Prevost, nascido em 14 de setembro de 1955 (idade 69 anos), de Chicago, Illinois, EUA, justo da terra onde reinou um dia o gangster Al Capone (1899-1947), e vingou em sua contraposição o Fundador do Rotary International, cadeia universal de Clubes, a pregar a boa convivência das múltiplas prestações de serviço, imaginado por Paul Harris, um advogado de Illinois que assim pensou congregar os homens sempre unidos por mútua prestação de serviços, e daí sequenciando: “que bem serviria melhor, aquele que melhor servisse”.
E assim eis-me compelido a retornar a leituras antigas já esquecidas: as Confissões de Santo Agostinhoe a Rerum Novarum de Leão XIII, vendo na escolha do Papa Leão XIV uma espelho a se mirar e bem refletir, porque Santo Agostinho em suas confissões, via-se sempre um pecador continuado, a requerer o perdão de Deus, com faltas terríveis, por ele pensadas, e só por ele maximizadas, nunca se sentindo tão imerecedor do perdão sofridamente invocado.
De Leão XIII, porque ficou esquecido, por muitos Papas que se seguiram, com seus misteres prosseguidos, todos homens notáveis, porque a Igreja é um celeiro inesgotável de vocações.
Nos últimos anos, destacou-se sobremodo o Papa João Paulo II, o Papa que veio do frio, da Polônia, sofrida terra de Chopin com suas Polonaises, ela terra católica que vem sendo enquanto planície fértil, campo guerreiro de dois colossos europeus beligerantes; os germânicos e os eslavos.
Karol Wojtyla (1920-2005), que viveu sob o regime nazista, e sob o não menos pior regime estalinista que o sucedeu, desfazendo toda ternura da feliz ditadura do proletariado, e que o povo derrubou por fim com o muro de Berlim.
Depois veio o Papa Bento XVI, notável por seus escritos corajosos, e que num desapego imenso, preferiu, por ausência de próprias forças, para o bom debate na defesa da Fé e no seu convencimento, perante tanta dispersa opinião, escolhendo a renúncia, justo aquilo que ninguém o faz, por moto próprio de despego, preferindo legar a outrem que lhe fosse melhor, no comando da Igreja, surgindo Francisco, um portenho ousado, Jorge Mario Bergoglio, que sem pejo, medo ou desconforto, assumiu o nome de São Francisco de Assis, a se inspirar, justo o monge que tentara reformar a Igreja voltando-a para os desvalidos.
Se Francisco agradou a muitos, cortejando muitos líderes de esquerda mundo a fora sobremodo, o mundo continua igual em suas ambiguidades; pecando da mesma maneira, precisando de novos Franciscos, preocupados com os desabrigados e desnutridos, sempre crescentes, de outros Agostinhos entregando-se a Deus e invocando o seu perdão para salvação de cada um, e de novos Leões, firmando a boa convivência dos homens em sua caminhada sobre a terra, justo agora, quando os tempos se assomam mais difíceis, com o desemprego ameaçado pelos novos tempos Revolucionários de Automação e Inteligência Artificial.
Por fim, e em outros fins sem invocar escraches nem esculachos, vale continuar, sem mutação, cantando o velho ConfiteorAgostiniano, tão esquecido e pouco lembrado: : “Eu me confesso a Deus, todo poderoso, porque pequei muitas vezes ‘per mea culpa, mea, culpa, mea máxima culpa,,,’” batendo no peito três vezes, e que Deus nos perdoe!