Nada de novo no humano.

Após dezoito meses da guerra russo-ucraniana nada acontece no front, parecendo a repetição dos idos vividos nos invernos de 1917-1918, na região do Marne, na França, sobretudo em proximidade de novos tempo frios em neve, chuva e lama ao desabrigo.

A grande obra de Erich Maria Remarque

 

Virou uma guerra sem movimento, cada exército se enterrando, sem progresso, nem fim.

 

Esperava-se uma destruição em massa, algo cantado em trevas de ameaças nucleares, algum avanço, nunca um recuo de lesma, ao relento, sem esperança de vitória de lado a outro.

 

No período estival que está a findar, esperava-se uma ofensiva ucraniana, que seria decisiva e letal, tal o esforço do ocidente, em armas e exações. 

 

E muitas sanções econômicas e comerciais, quase em bloqueio geral, que, hoje se sabe, não vingou. E mais: só firmou dependência européia do gás fornecido pela Rússia.

 

Todavia. eis que setembro se avizinha da metade, e o cansaço se espraia por largo esforço de aliados, em ampla e continuada destruição da Ucrânia, uma loucura, nunca de todo responsabilizada, porque nessas questões de briga, o agressor é sempre o outro, quando falta razão e sobra excesso de prosélitos por criminal parcialidade.

 

Numa guerra de vizinhos, em contextos vários, de família, raça e credo, todos sabemos que a razão do outro nunca é isenta de paixão, e sobra explicação daquilo que não aclara nem convence.

 

No seu escaninho e no seu cantinho de torcida, cada um sabe a origem do próprio sufoco, quando o seu espaço vital é invadido e ameaçado, falhando tudo porque o seu interesse nunca é o mesmo daquele que tenta tudo explicar, enquanto versão apenas.

 

Com a grande Rússia não é diferente, em conflito continuado para vencer o desafio da Geografia que a fez imensa, mas a fez também garganteada em sufoco, desde Pedro I, o Grande, para o Norte, lá no estreitos do Mar Báltico, e depois com Catarina II, ela Grande também, estendendo-se para o Sul, por estreitos caminhos meridionais, dos mares Negro e Azov, razão de conquista da Crimeia, e da necessidade de uma Ucrânia aliada e confiável.

 

Sem possuir acesso aos mares Báltico no Norte, e Negro, ao Sul, Pedro, o grande Czar, e a grande Catarina, maior Déspota, por melhor Esclarecida, bem sabiam que o gigante eslavo se engasgaria totalmente, cercado de gelo ao Norte e por tantas montanhas a Oeste, sem conseguir  respirar. 

 

Coisa simples de Geografia, sua força e sua vulnerabilidade, desde antigas eras.

 

Que o digam os idos mais recentes de 1904, quando a grande Rússia foi derrotada no extremo oriente, em Vladivostok, justo pelo pequeno Japão, potência que lhe não seria páreo, não fosse a incapacidade dos eslavos socorrerem a tempo, a sua frota ali distante, fundeada.

 

Dito assim por irrelevante recordação bélica, se em favor da Rússia combate sempre o “General Inverno”, razão de vitória em 1812, frente a Napoleão Bonaparte, e também contra Hitler, em Stalingrado, em 1943, faltar-lhe-á para sempre a sobrevida necessária se lhe forem tolhidos os seus acessos aos portos de água quente no Golfo da Finlândia no Báltico ao Norte, e as praias amenas do Mar de Azov, ao Sul, justo em Sebastopol, na Península da Crimeia, estremas partes de antigo domínio Turco Otomano, e do mais que antigo Império Greco-Romano e Bizantino. 

 

Ou seja, terras de interesses estratégicos, sobremodo das potências ao aquém do ocidente, desde Alexandre, o Grande, e de tempos outros, mais antigos, por versos Homéricos, cantados por gesta ou sonho, em paragens semelhantes; tudo no contexto Leste-Oeste, de Cruzadas devolutas, em revezes infiéis e sucessivos, de batalhas vãs em muitas lutas.

 

Das lutas e de Aquiles o audaz campeador da Guerra de Tróia, por comparo e lembrança de outras contendas, bem se sabia desde a Ilíada cantada, possuir um ponto  guerreiro vulnerável: um dos calcanhares! 

Tetis mergulhando Aquiles no Estige/Wikimedia Comuns

 

Qual seria? O direito, ou o canhoto? Uma pergunta tão gaiata, quão valiosa, enquanto vulnerabilidade guerreira.

 

Porque o segredo era mais que manhoso e maroto. 

 

 

Todo mundo sabia que a mãe de Aquiles, a Deusa Tétis, ao parir o menino, sabendo-o mortal como Peleu, o pai, mergulhara-o no Mar de Estige, segurando-o pelo tendão direito; o Tendão de Aquiles!, dando-lhe invulnerabilidade por todo o corpo, exceto naquele ponto do calcâneo.

 

Em outra versão, vale a pena contar, a mãe jogara o menino no fogo e este fora salvo pelo pai, o mesmo Peleu, sendo tudo recomposto com auxílio de Quíron, um centauro conhecedor da medicina, que colocou no calcanhar da criança um osso de Dâmiso, um gigante que o tornara muito veloz. 

 

Se Aquiles, adquiriu a velocidade e invulnerabilidade, mesmo sem vencer uma tartaruga em paradoxo de velocidade, restou por frágil fama a de possuir um “calcanhar de donzela”, mas isso é história de outro paradoxo que não interessa.

 

O que interessa é dizer que no caso da Rússia; há duas vulnerabilidades não paradoxais; são dois os seus calcanhares de Aquiles: os dois acessos territoriais aos mares, sem os quais vira um imenso país mediterrâneo. Daí a sua gana em atacar ferozmente os seus vizinhos.

 

E essa guerra, longe de saber quem tem ou não a razão, dois irmãos se matam e se destroem, por interesses outros de quem de lá está distante, fornecendo vasto arsenal de guerra e morte.

 

Repelindo quem o ameaça, o gigante país eslavo ataca ferozmente os seus vizinhos, caso atual da Ucrânia, e da Finlândia, em passado recente, razão e inspiração da Ode Épica, de mesmo nome, Finlândia, de Jean Sibelius (1865-1957), a merecer sua visita no endereço disponível no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=F5zg_af9b8c&pp=ygUYZmlubMOibmRpYSBKZWFuIHNpYmVsaXVz

 

Sem porto nem outra parte molhada para comerciar com o mundo, o Cossaco Russo, seja este Czarista, Soviético, ou Pós-Perestroika, sabe muito bem da sua vulnerabilidade, daí a ferocidade, do lobo bravo que faz dos dentes, bem além da ameaça.

 

Entredentes e sem mudança, a guerra se arrasta, aguardando novas quedas de temperatura em proximidade do General Inverno que virá, inexoravelmente, em frio, lama e desabrigo, e num cenário semelhante àquele descrito na grande obra de Erich Maria Remarque (1898-1970); “Nada de Novo no Front” (Im Westen nichts Neues), publicado em 1929, e que por sua temática, “antibelicista”, fora considerado, “antipatriótico”, pelos Nazistas, que se enfiavam numa outra guerra inútil.

 

A obra de Remarque   suscitou algumas versões cinematográficas.

 

A mais famosa, datada de 1930 e filmada pelos estúdios Universal, ganhou o Oscar de Melhor Filme e de Melhor Diretor, para  Lewis Mileston. 

 

Um remake pela CBS teve algum sucesso em 1979, e mais recentemente, em 2022, a Netflix lançou fita igual.

 

A guerra é sempre uma boa temática para o divertimento dos homens que não se satisfazem com a paz.

 

O que interessa não é vencer a guerra, nem mesmo evitá-la. A versão é que agrada.

O livro que gerou o filme.

 

Recentemente, a fita de maior alarde foi “Oppenheimer – O triunfo e a tragédia do Prometeu americano”, inspirado no best-seller de Kai Bird e Martin j. Sherwin.

 

Se Oppenheimer, enquanto fita gerou muito vanglória, glória mesmo ao que parece, em termos de bilheteria, foi o róseo sorrir e enternecer da nova Barbie, que não vi nem pretendo.

 

Já de Oppenheimer, o filme de Christopher Nolan, devo dizer que me pareceu longo, confuso e mais das vezes entediante. 

 

Mereceria talvez um alongamento melhor elucidativo, não fossem inseridas excessivas passagens com sábios do seu tempo, enquanto discípulo e colega, como Niels Bohr, Albert Einstein, Werner Heisenberg, Enrico Fermi e Richard Feynman, e outros cuja nomeação, bem valia referir se não ferisse o meu escopo desejado.

 

O filme de Nolan, com Cillian Murphy no papel-título, retrata um homem promíscuo em tantos amores, e alguns trágicos, em narrações desnecessárias, como se lhe quisessem tisnar manchas no seu caráter.

 

Nesse contexto, apresenta excedentes cenas eróticas em farto dialogar confuso, onde o científico e o político, permanecem sem um sentido real para melhor desvendo.

 

Do que se sabe e se suspeita  em termos de quebra de sigilos e espionagens tecnológicas, é que a solução dos problemas científicos não jaz restrita a poucas pessoas em compreensão e uso.

 

A fissão do átomo, como a nuclear fusão, pouco controlada ainda nos tempos atuais, não eram assuntos conhecidos por iluminados apenas. 

 

O seu conhecimento era repartido e compartilhado em congressos e publicações, afinal quem domina a ciência não a quer só para si, para sua fruição única, embora todos achem que dela podem se apropriar, bem e melhor, quebrando patentes, emolumentos e direitos, tudo em nome da melhor desapropriação. Algo semelhante à célebre “lei de Gerson”, preceituando levar vantagem: em tudo!

 

Ao tempo de Oppie, como por seus próximos era em carinho tratado, alemães, russos e ingleses pesquisavam a força do átomo, suscitando seu emprego bélico, o que levou ao esforço inusitado do Projeto Manhattan, que teve em Oppenheimer o cérebro maior, aglutinando esforços, como grande maestro a reunir virtuoses e solistas, numa partitura a construir, sem temer o erro nem o desafino.

 

Nesse particular do desatino, o filme relata o receio com o descortino do desfecho esperado. 

 

– A bomba daria xabu? – Perguntavam alguns; descrentes!

 

– O estouro poderia ensejar uma reação em cadeia incontrolável? – Pensavam outros; preocupados! 

 

– Que descontrole poderia ocorrer, em ameaças próximas de vizinhança ou quem o sabe: uma improvável inverossimilhança, de pôr fogo no mundo, atear chamas e ardor à  Terra, enquanto planeta, virando-a tocha acesa, como acontece no Sol?

 

– Seriam suficientes os amparos de óculos reflexivos, as distância em muitas milhas afastadas e os unguentos protetores das radiações esperadas por perigosas e sinistras?

 

Para o espectador bem valeu o suspense do acontecido, que por melhor efeito especial, bem ocorreu e não decepcionou.

 

Sobretudo o contraponto entre o brilho acontecido, o barulho do trovão por retardo em divergência da velocidade ondular em som e luz, e a ventania que vingou por fim em poeira.

 

E o aplauso do sucesso; como a zoeira e a bebedeira que se seguiram.

 

Bagaceira que serviu para despertar todos os espíritos: dos românticos aos quais bastava exibir a periculosidade da nova arma de guerra; dos sarcásticos, aos quais valia tanto esforço e suor e dinheiro, por um cogumelo plantado ao leu no deserto; dos catárticos em seu divertimento, por sucesso vitoriado; e dos políticos, sempre pragmáticos e capazes de tudo, programando jogar na cabeça dos seus desafetos comuns, os “malditos japoneses”, daquele momento em particular, oportunidade de poupar Quioto, por cidade visitada, conhecida e bem amada, e a herdade de escolher Hiroshima e Nagasaki, só porque restavam pouco bombardeadas ainda.

 

O filme como a História, evita ter um momento de arrependimento, um tempo de análise do uso ou não do átomo como arma de destruição.

Sayonara e o amor do Yankee conquistador e a fácil mocinha nipônica.

 

O que interessa é que a guerra acabou, o Japão se rendeu, e das minhas lembranças a indústria cinematográfica fez muitos filmes inesquecíveis, inclusive sobre o amor romântico entre o conquistador Yankee e a mocinha Nipônica. 

 

Refiro-me a “Sayonara” (1957) de Joshua Lang, com Marlon Brando, Miyoshi Umeki e Patrícia Owens , “A casa de chá no luar de agosto” (1956) de Daniel Mann, com o mesmo, Marlon Brando, Glenn Ford e Mashiko Kyo, e outros filmes, narrando muitos encontros e desencontros promovidos pela guerra, como os Girassóis da Rússia (1970) de Vittorio de Sica, com Sophia Loren e Marcello Mastroianni, em música belíssima de Henry Mancini, podendo ser conferida em Youtube: https://youtu.be/AIBsnUOx05A,  

 

E até o francês “Hiroxima mon amour” (1959) de Alain Resnais e Marguerite Duras, com Bernard Fresson, Stella Dassas e Emmanuelle Riva.

Um belo filme sobre os desencontros da guerra.

 

Quando a guerra acaba, no rastro da destruição nunca sobra culpados entre os vencedores.

 

No caso de Oppenheimer, sobrou sua odisséia pessoal, acusado de ter passado informações da Bomba Atômica para os Russos, sendo uma das muitas vitimas da Campanha Macartista, por suas simpatias comunistas e por ter sido um apoiador financeiro dos anti-falangistas espanhóis.

 

No seu entorno ninguém nunca despertara para os seus dissabores, vitima de muita inveja de colegas e circunstantes, enquanto “Prometeu Americano”, aquele que quase igualmente padecera como o Mito Grego Prometeu, tema de Ésquilo, que em roubando o fogo dos deuses para aquecer os mortais, por tal crime aturara uma pena eterna imposta por Zeus, o deus maior e vingativo, que mandara uma águia lhe devorar o fígado, diariamente, “ad aeterno”, víscera que se recompunha toda noite, para o seu sofrimento, descontinuamente, renovado.

Outro filme terno entre o Yankee e a mocinha oriental.

 

 

Se Robert J Oppenheimer sofreu pouco em traumas das duas bombas lançadas, o filme diz que ele sentia suas mãos manchadas de sangue.

 

 

Nesse contexto, vale o notável desempenho do indiferente, por medíocre Presidente Harry Truman, dando-lhe um lenço para “alimpar-lhe” o sangue das mãos, a quem classificou como um “incômodo chorão”.

 

Chorar ou não chorar, eis a questão, em tema de guerra, e em qualquer ocasião.

Fita francesa no contexto traumático da guerra.

 

 

 

Se os homens não jogam mais bombas atômicas, uns sobre os outros, é porque tem sobrado algum juízo. 

 

Bom seria que os homens se ajuizassem e não teimassem em se matar uns aos outros.

 

 

Isso, porém, é causa improvável, quiçá impossível! Daí as trincheiras sendo abertas e a guerra continuando, sem mudar nada no front, a leste do Dnieper, rio que não conheço, mas sei onde fica e desemboca.

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
Comentários

Nós usamos cookies para melhorar a sua experiência em nosso portal. Ao clicar em concordar, você estará de acordo com o uso conforme descrito em nossa Política de Privacidade. Concordar Leia mais