Os 80 anos e o livro do Pe. Carvalho

Lagarto era Matriz da Freguesia de Nossa Senhora da Piedade, com suas dez léguas entre o norte e o sul e mais dez léguas entre o leste e o oeste, confrontava-se com as Freguesias de Nossa Senhora da Vitória da Cidade de Sergipe Del Rei (São Cristóvão), pelo leste, Santa Luzia do Rio Real (Santa Luzia, incluindo Estância) ao sul, Nossa Senhora dos Campos do Rio Real (Tobias Barreto), ao sudoeste, com Santo Antonio e Almas de Itabaiana, pelo norte, segundo a Notícia, assinada pelo vigário João da Cruz Canedo, em 1757. Fazia fronteira, ainda, com Jeremoabo e com Itapicuru de Cima, ambos da Capitania da Bahia.

Naquele tempo andava por lá o padre Eusébio Dias Laços Lima, que fazia propaganda da sua ação evangelizadora, no aldeamento e na catequese de nações indígenas, requerendo benefícios pelo seu esforço. Sem receber ajuda da Coroa portuguesa, o padre Eusésio Dias Laços Lima proclamou a independência de Sergipe e de parte de Alagoas, criando um Império e distribuindo títulos de nobreza e  patentes, até ser preso e mandado, em ferros, para Portugal, deixando traços lendários, presentes na documentação histórica portuguesa e no imaginário brasileiro.

Outro padre ilustre de Lagarto foi João Batista de Carvalho Daltro, conhecido como padre Daltro ou monsenhor Daltro, nascido em Simão Dias. A ele se deve, dentre outras coisas, a constituição da família Garcia Moreno, cujo tronco, o farmacêutico Pedro Garcia Moreno, que atuou em Laranjeiras e em Maroim, e deixou descendência ilustre, tinha o sobrenome tirado do presidente do Equador, Gabriel Garcia Moreno, tido como caudilho, severo na repressão aos opositores, que foi duas vezes presidente da república, executando grandes obras e, como católico fervoroso, deu à Igreja uma autoridade soberana equatoriano, sendo assassinado em 1875. Padre Daltro, – dizia o povo que guardou na memória seu magistério -, só realizava casamento de quem tinha um pedaço de terra e um cavalo, para garantia do sustento da nova família. Lagarto, desde os tempos da Freguesia, era, em Sergipe, o lugar onde a terra tinha melhor partilha, ocasionando a formação de núcleos humanos. Não sem razão que Lagarto possui, hoje, quase duas centenas de povoados e locais nascidos das cooperativas, nos limites de sua fronteira, predominando os pequenos sítios, com suas lavouras permanentes, como a do fumo, da mandioca, dos cítricos, especialmente o maracujá, convivendo com as fazendas de gado, de ovelhas, com seus criatórios seletivos, mostrados, anualmente, nas exposições.

Outros padres deram a Lagarto contribuições, que ainda hoje são lembradas e exaltadas, como padre, ou monsenhor Marinho, e como Dom Mário, que chegou para trabalhar com monsenhor Jason e foi seu substituto, realizando o notável trabalho de salvar os jovens dos desajustes, das drogas, da falta de perspectiva. Dom Mário, italiano de nascimento, sergipano por adoção, é hoje o Bispo de Propriá, onde continua sensível diante do drama do rebanho de sua Diocese.

Padre José Carvalho de Souza nasceu no Lagarto, há exatos 80 anos e certamente herdou a memória dos padres que conduziram o seu povo, por séculos, sob a mesma invocação de Nossa Senhora da Piedade, e de outros Oragos, que foram surgindo com a ocupação territorial. Vocacionado para o serviço da Igreja, Padre Carvalho estudou, formou-se e com sua ordenação retornou a Sergipe, sendo, em Aracaju, um dos mais preparados e atuantes sacerdotes, realizando um papel especial como educador e como orientador da juventude, no Colégio Sagrado Coração de Jesus, que viu crescer, desde os primeiros tempos, até conquistar lugar destacado na vida educacional sergipana.

Na direção do Colégio e nas relações com alunos e familiares, padre Carvalho construiu uma liderança, que ampliou-se na gestão da escola privada, em geral, no desporto escolar,e nos contatos institucionais, exercendo, há décadas, seu múnus de líder.

Ao completar 80 anos, lúcido e ativo, firme nos velhos propósitos e forte na condução dos jovens da sua escola, padre Carvalho é quem dá o presente, chamando para si a não pequena responsabilidade de historiar a ação da Igreja católica em Aracaju, desde que a cidade foi criada e feita capital, para cumprir com uma destinação mercantil, em 1855. O livro do monsenhor José Carvalho de Souza – Presença participativa da Igreja católica na história dos 150 anos de Aracaju (Aracaju:Gráfica J. Andrade/Prefeitura de Aracaju/FUNCAJU, 2006) é um documento fiel, sincero e rico, que sem proselitismos fixa a contribuição sesquicentenária da Igreja em Aracaju. Bela forma de celebrar, ainda, os 150 anos da cidade e capital e os 80 de vida, de fé e de vitórias.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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