No dia 05 de junho comemora-se mais um dia mundial do meio ambiente, data significativa estabelecida na Conferência de Estocolmo em 1972, que marca um dos pontos de mutação da percepção da crise ambiental planetária.
Para não passar em branco e retornar aos artigos desta coluna, publicaremos nesta e nas próximas semanas partes de um capítulo de nossa autoria com o apoio e orientação das Professoras Doutoras Maria José Nascimento Soares1 e Flávia Moreira Guimarães Pessoa2, do livro recém publicado pela Editora UFS, denominado Perspectivas da Sustentabilidade. O referido capítulo trata sobre o atual panorama do licenciamento no Brasil, com um estudo mais aprofundado e integrador do que nossos artigos já publicados nesta coluna.
Introdução
Embora a política ambiental de controle de poluição no Brasil remonte aos anos sessenta do século passado, somente a partir de 1980/1981 o poder público passou a controlar a implantação de empreendimentos potencialmente causadores de poluição ambiental, utilizando-se conjuntamente de instrumentos preventivos como o licenciamento ambiental e a avaliação de impacto ambiental, destacando-se nesta última categoria o estudo de impacto ambiental.
Para a consecução dessa política foi criado o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SINAMA), sendo integrado por órgãos em diversos níveis federativos, que, dentro da competência executiva comum para a defesa do meio ambiente, deveria constituir a principal rede pública de atuação para a proteção do meio ambiente e repressão administrativa às infrações ambientais.
No entanto, até dezembro de 2011, antes do advento da Lei Complementar (LC) 140/2011 que regulamentou esta competência comum ambiental dos entes federativos, tal distribuição de atribuições na área do licenciamento ambiental era regulamentada por uma resolução do CONAMA, sendo eivada de inconstitucionalidade, o que colocava em discussão a segurança jurídica dos licenciamentos efetivados e, principalmente, a diretriz de licenciamento em um único órgão ambiental licenciador.
Assim, o presente trabalho apresenta o histórico, conceitos, estrutura, competências, fases e sanções do sistema jurídico-ambiental brasileiro de licenciamento ambiental, incluindo o instrumento precursor deste controle público – o estudo de impacto ambiental, tudo isso de acordo com a LC 140/2011. Para tanto será necessária uma abordagem sistêmica, valendo-se da interdisciplinaridade que articule saberes do direito e das ciências ambientais, convergentes para um modelo de sustentabilidade ambiental.
Histórico
Com a publicação em 1962 da Obra Silent Spring de Rachel Carson, discutindo os efeitos deletérios do uso de pesticidas (principalmente o DDT) nos Estados Unidos, iniciou-se uma pressão ao Governo Americano que implicou na criação, em 1969, da Política Ambiental Americana (Nacional Environment Policy Act – NEPA) e, em 1970, da primeira agência ambiental no Mundo, a USEPA (United States Environment Protection Agency) , que por sua vez, passou a controlar a implantação de empreendimentos potencialmente poluidores, inclusive exigindo-se estudos de impacto ambiental para subsidiar a aprovação destes empreendimentos.
Em 1972, foi realizada a Convenção de Estocolmo, sendo criado pela ONU o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e, posteriormente, em 1983, a Comissão Mundial do Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), tendo como relatora Gro Harlem Brundtland. Esta comissão publicou, em 1987, o Relatório Nosso Futuro Comum, onde, além da avaliação da situação do meio ambiente no planeta, conceituou o Desenvolvimento Sustentável como a capacidade das gerações presente satisfazerem suas necessidades sem prejuízo das gerações futuras satisfazerem suas próprias necessidades .
Conforme aponta Costa (2011), em 1988, de forma oportuna, foi promulgada a Constituição Federal Brasileira, incorporando o princípio do desenvolvimento sustentável em seu texto tanto no capítulo atinente ao meio ambiente (art. 225), como na regulação da ordem econômica (art. 172) :
- Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
- Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: […] VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação.
No referido artigo 225, da CF, verifica-se a obrigatoriedade do poder público e da sociedade de prevenir danos ao meio ambiente (princípio da prevenção). No Brasil, um dos mais importantes instrumentos do poder público para controle preventivo de danos ao meio ambiente por atividades econômicas é o licenciamento ambiental, onde, para atividades que possam causar significativo impacto ambiental, a própria Constituição Federal em seu art. 225, §1º, IV, exige o estudo de impacto ambiental e seu relatório do meio ambiente (EIA/RIMA) como pré-requisito para tal licenciamento.
Seguindo o padrão do EUA, começaram a ser implantados órgãos e agências ambientais no Brasil a partir dos anos setenta do século passado, citando-se aqui a criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA) em 1973 e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) em 1989 . Em Sergipe, no ano de 1978, foi criada a Administração Estadual do Meio Ambiente (ADEMA).
No entanto, como ressaltado por Silva (2009, p. 56), o controle da poluição no Brasil tem, mesmo que fragmentário do ponto de vista legislativo e político, suas raízes normativas no Decreto-Lei 303/1967 (criaria o Conselho Nacional de Controle da Poluição), substituído, antes de sua efetivação, pela Lei 5.318/1967 (Instituiu a Política Nacional de Saneamento). No entanto, tais normas não chegaram a ser concretizadas.
A Lei 6.803/1980, que trata das diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição, introduziu no Direito brasileiro o licenciamento ambiental estadual para empreendimentos industriais e o EIA/RIMA .
A Política Nacional do Meio Ambiente foi estabelecida no Brasil em 1981 pela Lei 6.938, tendo como instrumentos, entre outros, o licenciamento ambiental e as avaliações de impacto ambiental (gênero do qual faz parte o EIA/RIMA, o PRAD, além de outros estudos ambientais) e criando o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), formado por órgãos e entidades de todas as esferas federativas (União, Distrito Federal, estados e municípios), cuja função, em suma, é cumprir a obrigação do poder público de defender e preservar o meio ambiente para as “presentes e futuras gerações” (arts. 23 e 225, da Constituição Federal).
Na próxima semana apresentaremos a segunda parte deste artigo.
____________________________
1 Professora Adjunta do Departamento de Educação da UFS. Vice-coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UFS). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Formação, Interdisciplinaridade e Meio Ambiente (GPFIMA – UFS). marjonaso@ufs.br.
2 Professora Adjunta do Departamento de Direito da UFS. Coordenadora do Mestrado em Direito da UFS. Juíza do Trabalho Titular da 4 Vara do Trabalho de Aracaju. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Formação, Interdisciplinaridade e Meio Ambiente (GPFIMA – UFS). flaviampessoa@gmail.com.