Pedras no caminho

Quando tudo parecia perfeito, eis que surgem os fiscais da lei para atrapalhar. O universo conspirava a favor e tudo vinha dando certo demais para o prefeito Edvaldo Nogueira: os apoios incondicionais de Lula e de Déda, o crescimento sem parar do arco de aliança, a vida atribulada do adversário maior João Alves. Houve até um empurrãozinho da Rede Globo, que elegeu Aracaju como a capital de melhor qualidade de vida do País. Mas havia algumas pedras no caminho, pedregulhos identificados com as siglas CGU, MPE, MPF e STF.

Na terça-feira passada, um relatório da Controladoria-Geral da União tornado público de forma amplificada pela Folha de S.Paulo apontou que, de nove municípios escolhidos aleatoriamente dentre os 100 maiores, Aracaju lidera o ranking das supostas irregularidades, com 237 apontamentos, sendo 27 considerados graves, em convênios que somam R$ 171 milhões.

Nos nove municípios percorridos pelos fiscais da CGU em 2005 e 2006, foram apontados 652 indícios de irregularidades praticadas por prefeituras, governos de Estados ou ONGs, em convênios que totalizam R$ 428 milhões. Aracaju aparece com mais citações porque também é o maior município dentre os citados no relatório, que foi concluído em novembro de 2006. A cidade com mais indícios de irregularidades graves é Macapá.

A Folha constatou indícios de irregularidades na gestão de Marcelo Déda à frente da Prefeitura, como a não existência de postos de saúde nos bairros Getúlio Vargas e Jabotiana, ou a não conclusão das obras de ampliação do Hospital Santa Isabel, todos frutos de convênio com o governo federal.

Mas há indícios de irregularidades que teriam sido cometidas pelo governo do Estado, precisamente na gestão do ex-governador João Alves Filho: “Um caso exemplar: R$ 8.500 em verbas federais foram destinadas ao governo de Sergipe para instalação de central de alarme e rede de iluminação de emergência na Escola Estadual Atheneu Sergipense, a mais tradicional do Estado. Desde 2003, parte do material nunca foi usada. Outra, desapareceu”, informa a Folha.

O enviado do jornal a Aracaju comprovou outro problema deixado pelo governo passado: “Os fiscais da CGU encontraram, durante vistoria em 2006, a obra do Centro Estadual de Educação Profissional José Figueiredo Barreto abandonada. Orçado em R$ 761 mil, o local já deveria estar oferecendo curso profissionalizante a 1.100 alunos desde 2003”. A obra teve o convênio assinado em 2002, no governo de Albano Franco. Em 2003, na gestão de João Alves, a CGU constatou a paralisia da obra. O governo Marcelo Déda a retomou, mas a obra se arrasta desde 2007.

Marcelo Déda e Edvaldo Nogueira negam as irregularidades e atribuem os problemas ou a questões burocráticas e pendências jurídicas ou a gestões anteriores. “Nós respondemos de forma convincente a todas as indagações da CGU. É importante haver fiscalização, defendo a fiscalização, mas o fato de haver indagações não significa que haja malversação”, esquiva-se Edvaldo, garantindo que não há irregularidades na prefeitura e reafirmando que ele é um político limpo, assim como Déda.

O governador assegura que não houve desvios em convênios na sua gestão à frente da prefeitura de Aracaju. “Na sua imensa maioria, são irregularidades de ordem formal. Mas todas estão respondidas e, sem dúvida alguma, vão oferecer respostas e providências adequadas a todas as questões que foram levantadas pela CGU”, disse Déda.

 

MAS HÁ OUTROS QUESTIONAMENTOS além dos que são feitos pala CGU. Marcelo Déda e Edvaldo Nogueira agora também respondem por crimes eleitorais. Há um inquérito no Supremo Tribunal Federal, procedente do Ministério Público Federal em Sergipe, denunciando o governador — além do senador Antônio Carlos Valadares, do deputado federal Jackson Barreto e do deputado estadual Armando Batalha — por propaganda eleitoral antecipada, em 2005, a favor de Manoel Messias dos Santos, o Sukita, que foi reeleito prefeito de Capela naquele ano.

O inquérito 2629 deu entrada no STF no dia 1º de outubro de 2007. No dia 5 deste mês, a ministra Carmem Lúcia deu um prazo de dez dias para os denunciados informarem se aceitavam ou não o acordo proposto pela Justiça, que consiste em, individualmente, doarem cinco cestas básicas e dez resmas de papel ofício a instituições carentes. Ao que parece, todos aceitaram.

Por fim, o promotor de Justiça Marcílio Siqueira Pinto, do Ministério Público Estadual, representou Edvaldo Nogueira também por propaganda eleitoral extemporânea. De acordo com o promotor, uma intensa campanha publicitária tem sido feita “sempre a pretexto de destacar datas comemorativas”, veiculadas em busdoors e outdoors. A representação cita matérias publicitárias nas quais empresas e autoridades sergipanas acabam por fazer propaganda da reeleição do prefeito. “Restando evidente que todas as propagandas tiveram o escopo de apresentar o representado como o candidato mais preparado para ser prefeito de Aracaju, caracterizando, assim, a propaganda extemporânea, que é expressamente vedada pela legislação eleitoral”, diz a ação, lembrando que a lei só autoriza propaganda a partir de 6 de julho.

 

TUDO ISSO PODE NÃO DAR EM NADA, mas demonstra duas coisas importantes: primeiro, que os órgãos de fiscalização das atividades dos homens públicos estão atentos à forma como gerem o dinheiro do povo e se cumprem a lei, inclusive no que se refere à questão eleitoral. Segundo, que ninguém está imune à fiscalização. Portanto, é bom ficar atento e não se descuidar.

 

CGU constata prejuízo da Gautama

A Controladoria-Geral da União concluiu as auditorias realizadas em contratos de obras executadas pela Construtora Gautama com utilização de recursos federais, apontando prejuízos de R$ 153,2 milhões, em valores históricos. Os trabalhos envolveram a análise de 21 convênios e contratos firmados para a realização de obras em vários Estados.

Para as obras auditadas, o volume de recursos liberados chegou ao total de R$ 420,3 milhões, o que significa que os prejuízos representaram mais de um terço dos recursos liberados. As auditorias da CGU serviram de subsídio para as denúncias feitas pelo Ministério Público, a partir da chamada Operação Navalha, desencadeada pela Polícia Federal.

Entre as obras da Gautama auditadas pela CGU a que apresentou maior volume de prejuízo foi a duplicação do Sistema Adutor do Rio São Francisco, em Sergipe. Os prejuízos nessa obra chegaram a R$ 78,4 milhões, em valores históricos, em conseqüência, principalmente, da prática de sobrepreço, facilitada pela restrição ao caráter competitivo e direcionamento da licitação em benefício da Gautama. Confirma-se a suspeita: onde a Gautama mais roubou foi na duplicação da Adutora do São Francisco.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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