Pequenos textos soltos

A oralidade responde pela guarda e pelo uso de frases e textos que rompem os tempos e formam um repertório popular, renovado pela repetição e pela aceitação. Textos escritos, pequenos como os da oratura, completam o elenco sentencial, que vale como um código, repleto de exemplos. Seus criadores, anônimos ou não, concorrem para esse tipo especialíssimo de literatura, circulante tanto nas conversas, como nos suportes comuns, a exemplo dos Almanaques, que são cada ano mais raros. Graças aos Almanaques a humanidade herdou um repertório rico de curiosidades, representativo das aventuras humanas.

O célebre e nem sempre acreditado navegante florentino, que serviu a Portugal na epopéia dos descobrimentos, deixou Cartas, principalmente endereçadas a Lourenço Pier de Médici, com informações que ainda hoje vigoram. Na 1ª missiva, enviada de Lisboa, em 1502, logo após a viagem de descoberta do Rio São Francisco, Vespúcio trata dos indígenas, dizendo:

“Não tem lei, nem fé nenhumas, e vivem segundo a natureza. Não conhecem a imortalidade da alma, não têm entre eles bens próprios, porque tudo é comum; não tem limites de Reinos e de Províncias: não têm Rei, não obedecem a ninguém, cada um é senhor de si.”

Em 1503, dirigindo-se novamente a Lourenço de Medici, complementa: “Vivem juntos e sem Rei, sem império e cada um se manda, é senhor. Além disso, não têm nenhuma igreja, e nenhuma lei têm. Datada de Lisboa, 1504, outra Carta diz: “ Estes não têm Rei, nem senhor, nem conhecem a ninguém, que vivem em sua própria liberdade; Nssa gente não sabemos que tivessem lei alguma, sem se pode dizê-los Mouros, nem Judeus, e piores que Pagãos.”

O historiador Pero de Magalhães de Gândavo, autor do Tratado da Província do Brasil, em 1572 (?) reforça Vespúcio, 70 anos depois: “A língua deste gentio toda pela costa é uma, carece de três letras – S, não se acha nela, nem L, nem R, coisa digna de espanto, porque assim não tem fé, nem lei, nem rei. Gândavo repete a mesma afirmativa da falta de três letras no alfabeto dos indígenas, em 1576, na sua História da Província Santa Cruz a que vulgarmente chamamos Brasil.
Tais frases curtas dão base à visão do paraíso, difundida no velho mundo. Depois delas, a religião inspirou um modelo de aldeamento, catequese e civilização, com base na fé, na lei e no rei.

Cabe, como uma luva, a estrofe carnavalesca, de um Bloco de moços de Paripiranga, no vizinho Estado da Bahia, registrada pelo jornal A Semana, editado em Simão por Francino e José de Carvalho Déda, na edição de 2 de julho de 1947:

“Eu só queria
Ter um Governo
Que desse ao povo
Dinheiro em cacho;
E que surgisse
Um mundo novo:
A terra encima
E o céu por baixo.”

Tobias Barreto, o gênio sergipano que viveu em Pernambuco, certa feita ouviu do conterrâneo Fausto Cardoso, no primeiro encontro dos dois: “Olhe bem para mim, senhor doutor, e veja que eu também sou sergipano”. Com o tempo a amizade cresceu entre os dois filósofos, passando Tobias a chamar Fausto de “Meu coração fidalgo.” Tobias viveu 50 anos, Fausto 42, embora pareçam que viveu uma eternidade, pela produção de uma rica reflexão, que não deixou palavra sobre palavra que não fosse esclarecida.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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