Política e Religião

O encontro ecumênico de Nossa Senhora do Socorro entre o Padre Inaldo e o Pastor Jony embute mais do que fraternidade, cooperação e humildade. Aliás, não tem nada a ver com unidade cristã. Está em jogo é o que na política se define eufemicamente como “ocupar espaço”. Ou seja, juntar esforços para vencer a eleição e ter o poder na mão, administrar os recursos públicos municipais, em suma, mandar.

Como já não se faz mais político e comunista como antigamente, Padre Inaldo é filiado ao PC do B. O mesmo partido ao qual durante muitos anos foi filiado o Padre Raimundo Leal, prefeito de Cristinápolis, atualmente no PMDB, que teve o mandato cassado pela Câmara de Vereadores e se mantém no cargo por força de decisão liminar concedida pelo juiz José Macedo Barreto Pimenta.

Política e religião são duas invenções humanas que, a princípio, não deveriam andar juntas. Max Weber já dizia que a racionalidade de um religioso diverge da racionalidade de um político: “…a racionalidade na esfera religiosa se funda, antes de tudo, em dogmas e crenças, fatores não testáveis e não comprovados na vida prática dos homens”.

O alemão considerado pai da sociologia pensa a política como o conjunto de esforços que visam conquistar ou influenciar na divisão do poder estatal. Na política ocidental moderna o carisma prevaleceu na figura do líder demagogo, que submete os liderados à dominação, inclusive, em função do medo e da esperança.

Mas Weber estabelece uma distinção entre aqueles políticos profissionais que buscam na atuação política apenas uma fonte de renda, daqueles outros que a encaram como verdadeiro objetivo de vida e meio de advogar causas e convicções.

No Brasil há muitos exemplos de religiosos que não resistiram à tentação da mundana política. Sergipe não é exceção e os exemplos se sucedem, indiferente de templos e altares. Lembremos outro padre prefeito, o belga Gerard Lothaire Jules Olivier. Aclamado pelo povo de Japaratuba como Padre Geraldo, foi prefeito pelo PT, falecido aos 76 anos, em 2013, durante o exercício do quarto mandato.

Tão querido naquele rincão quanto o Padre Arnóbio Patrício de Melo em Aracaju, onde foi vereador pelo PMDB em três legislaturas. Quando largou a carreira política, Padre Arnóbio voltou à lida de religioso atuante e professor amado pela juventude até o falecimento, em 2005, aos 78 anos.

Outros políticos religiosos católicos de destaque há na história de Sergipe, mas ninguém foi tão importante quanto o Monsenhor Olímpio de Souza Campos, que teve a biografia manchada pelo assassinato do deputado Fausto Cardoso e acabou sendo morto por vingança nas ruas do Rio de Janeiro. Além de deputado provincial e federal, Olímpio Campos foi presidente do Estado, de 1899 a 1902, e senador, de 1903 a 1906, quando foi assassinado.
A presença dos evangélicos na política é mais recente, fato associado ao sucesso do movimento neopentecostal. No princípio, houve Nicodemos Falcão, um ex-militar e ex-professor que foi secretário de Estado e deputado estadual do PFL em quatro legislaturas, chegando a presidir a Assembleia Legislativa. É Adventista do Sétimo Dia.
Pastor Virgínio José de Carvalho Neto (PSC) é um tradicional religioso que preside em Sergipe a igreja Assembleia de Deus. Hoje é segundo suplente da senadora Maria do Carmo Alves (DEM), mas já foi seu primeiro suplente e assumiu o mandato em 2008, quando a titular se afastou para tratamento de saúde. Hoje, o primeiro suplente de Maria do Carmo é o empresário Ricardo Franco (DEM).
São da mesma Assembleia de Deus o pastor Antônio dos Santos (PSC), que foi vereador, está no terceiro mandato de deputado estadual e em vias de tornar-se candidato a vice-prefeito de Aracaju, na chapa encabeçada pelo deputado federal Valadares Filho (PSB); e o pastor Roberto Morais (SD), um dos vereadores de Aracaju agora investigado por desvios de verbas indenizatórias da Câmara de Vereadores.
Também é vereador na capital e igualmente investigado o Pastor Valdir Santos, PT do B, da Igreja do Evangelho Quadrangular. Já o Pastor Daniel Fortes, da igreja Assembleia de Deus Madureira, é ex-vereador e suplente de deputado estadual do PTC com chance de assumir o mandato, além de pai da vereadora e também evangélica Daniela Fortes (PR).
Pastor Jony Marcos, agora aliado do Padre Inaldo, foi vereador em Aracaju e defende o primeiro mandato de deputado federal pelo PRB. É um discípulo do sertanejo José Heleno da Silva, o Pastor Heleno, da Igreja Universal do Reino de Deus, líder em Sergipe do partido vinculado à denominação de Edir Macedo. Outro liderado é o Pastor Mardoqueu Bodano, ex-deputado estadual por dois mandatos e ex-presidente da Cohidro.
Prefeito de Canindé de São Francisco, Pastor Heleno foi deputado federal em duas legislaturas, não quer disputar a reeleição no município, mas sonha com o Senado em 2018. Com a graça de Deus e a benevolência do rebanho.
Hoje, no Congresso Nacional, há dois senadores e mais de 70 deputados federais que compõem a bancada evangélica [não há uma bancada católica, embora a maioria se considere assim]. São nomes como Eduardo Cunha (PMDB), Marcos Feliciano (PSC) e o senador Magno Malta (PR) que engrossam um discurso preconceituoso e por vezes violento a contribuir para o retrocesso político e social do país, inclusive por não fazer distinção entre Igreja e Estado.
Segundo a Transparência Brasil, a maioria dos parlamentares da bancada evangélica responde a processos judiciais por diversos crimes, tais como peculato, improbidade administrativa, sonegação de impostos, formação de quadrilha ou bando, abuso do poder econômico em eleições e condenações nos Tribunais de Contas e Tribunais Eleitorais.
Os Estados democráticos são Estados laicos e a separação entre religião e política é uma das mais importantes conquistas democráticas no mundo contemporâneo, como lembra o sociólogo Emir Sader:
“Não é que não tenham nada a ver, mas as relações políticas, sociais, cívicas, não podem ser orientadas pelas opções religiosas. Todos devemos ser iguais diante das leis, sem influência de nossas opções individuais — religiosas, sexuais, de diferenças étnicas, etc. Somos diversos nas nossas opções de vida, mas devemos ser iguais nos nossos direitos como cidadãos”.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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