Propriá na crônica de Marcos Melo

Propriá aparece, mais uma vez, no primeiro plano das lembranças de um dos seus filhos ilustres, o economista, advogado e professor Marcos Melo, autor de uma trilogia propriaense, repleta de evocações. O último dos três livros – Falando propriamente (Aracaju: Editora do Conde, 2007) amplia o horizonte da saudade, que o autor carrega como parte das suas coisas, entre as mais bem guardadas, com nomes, fatos, situações, todos fixados no único objeto: a cidade, seu rio em contínua viagem até a foz, personagens, instituições, tudo o que dá vida e experiência a Propriá.

 

Estância, no sul de Sergipe, era guardiã de muitas memórias, graças aos cronistas locais. Vários autores – Machiavelli (também conhecido como Nhô Galo, pseudônimo de Manoel Rodrigues Nascimento),  Raimundo Souza, Francisquinha Assunção, Edilberto Campos – ungidos da mais completa admiração pela cidade, fizeram aflorar em suas obras tudo aquilo que Estância tinha de singular, de belo, de tocante, e que tanto quanto os azulejos portugueses da rua Capitão Salomão, valia como um patrimônio social.

 

Propriá ganha seu cronista e emparelha seu interesse em registrar a saga do seu povo, como fez Estância. Marcos Melo é o cronista, com fôlego de ficcionista e método de historiador, anotando fatos, cruzando dados, construindo uma narrativa rica de detalhes, conotada pela psicologia dos personagens, de tipos e épocas diferenciados, que são movimento a tudo o que vale lembrar.

 

O universo abarcado pelo escritor é inesgotável, que tanto permite mergulhar no passado glamoroso da cidade, com suas “fábricas” de desencaroçar algodão, extrair seu óleo e comercializar dentro e fora de Sergipe, como fragmenta o cotidiano social, particulariza episódios, individualiza os exemplos, como o Dr. Faninho – Volfano Gaspar de Melo, a quem o livro é dedicado, como uma representação memorial do povo.

 

É previsível que Marcos Melo continue anotando os acontecimentos, os relatos biográficos, as curiosidades, os traços da sociedade de Propriá e as singularidades locais, para comparecer de público com seus livros, representação gráfica dos seus guardados, e que agem pedagogicamente nas novas gerações, como partilha de um patrimônio feito público pela sensibilidade do autor.

 

O exemplo de Marcos Melo deveria ser seguido por outros sergipanos, que pudessem dedicar um pouco de tempo e de sensibilidade, para fixar informações sobre a vida sergipana, nos muitos lugares do Estado. O levantamento revelaria, sem dúvida, uma notável paisagem evoluindo, dia a dia, debaixo de um sol constante ou sob a luz cumpliciada da lua, nas noites secretas das pessoas. Há um repertório fantástico de lembranças, ao dispor dos cronistas, para o encanto que o passado, ainda que em cacos, revela.

 

Falando propriamente é mais um testemunho da competência do novo escritor, que surpreende, mais uma vez, os leitores com suas crônicas, mescladas de recordações. Ivan Valença, decano do jornalismo escrito, diz no texto que serve de orelhas ao livro, que “Dentro do possível me abraço a cada livro de um sergipano como se ali estivesse minha própria vida.”

 

O novo livro de Marcos Melo cumpre, portanto, uma função cultural que é ampliada pelo interesse de todos, sobre as coisas da terra.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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