Wendell de Oliveira Souza
Graduando em História/UFRN
A escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo FIFA 2014, em 2007, foi alvo das mais variadas especulações. Para os mais pessimistas, era uma oportunidade de nossos representantes políticos desviarem vultosas somas de dinheiro público na construção de ‘elefantes brancos’. Para os mais otimistas, era a oportunidade de usar a exposição internacional para chamar atenção e procurar soluções que tentassem resolver (ou amenizar) problemas históricos como a carência infraestrutural dos postos de saúde e das escolas públicas brasileiras. Mas, tanto uns como outros norteavam suas expectativas e suposições a partirdo legado que a Copa do Mundo deixaria noBrasil.
De lá pra cá, passaram-se quase sete anos e muita coisa aconteceu. No futebol, fomos campeões da Copa das Confederações (2009) e eliminados pela Seleção Holandesa de Futebol nas quartas-de-finais da última Copa do Mundo (2010). Aliás, pela primeira vez em 80 anos de realização do torneio (a primeira Copa do Mundo aconteceu no Uruguai em 1930, sendo a seleção anfitriã, a primeira campeã), um país africano recebeu a competição. Na política brasileira, pela primeira vez na história, o Poder Executivo federal passou a ser chefiado por uma mulher (2011), revelando o caráter excludente da nossa história republicana. Na economia, o mundo globalizado passa por uma das maiores crises do capitalismo. Para os especialistas, a crise que estoura em 2008 só é comparável com a histórica crise de 1929. O mundo cristão assistiu atônito a renúncia de um Papae a escolha de um argentino, e jesuíta, para ser o seu sucessor, que aproveitou para inaugurar mais um nome na história dos pontificados: Francisco I (2013). As esquerdas e o povo venezuelano choraram no cortejo fúnebre de Hugo Chávez (2013) e os liberais choraram a morte da Dama de Ferro, Margaret Thatcher (2013).
Enquanto isso, nos programas especializados em jornalismo esportivo (ou não), foi comum que as análises se voltassem sempre para a construçãodos estádios, mais precisamente de onde sairia o dinheiro. A utilização ou não de dinheiro público na construção dos estádios criou uma trincheira entre o governo federal e boa parte da imprensa. O ápice desta batalha foram as manifestações de 2013 que, se inicialmente tinham como pretensão impedir o aumento das tarifas de transporte urbano, levaram o povo às ruas exigindo “saúde e educação no padrão FIFA”. E como se o único legado da copa fossem as estruturas de concreto armado, somavam-se as discussão/críticas sobre a utilização destes ‘elefantes brancos’ depois da Copa do Mundo, em cidades, como Manaus e Cuiabá, que não possuem grandes equipes disputando as principais competições do futebol nacional e internacional.
Muito se falou nos bilhões de reais que estariam sendo utilizados na construção dos estádios. Pouco se discutiu como a outra parte do montante geral divulgado pela imprensa(orçado inicialmente em 26 bilhões de reais os valores serão maiores ao final do mundial), seria aplicada nos transportes, nas comunicações, no turismo e nas obras de mobilidade urbana.
Em Natal, as promessas de um legado urbano à cidade mudaram de acordo com o passar do tempo. A reforma/construção de um aeroporto e terminal de passageiros; monotrilhos; de Veículo Leve sob Trilhos (VLT); reforma no Porto de Natal; e, principalmente as obras de mobilidade urbana – construção de túneis, viadutos, passarelas, reorganização da malha urbana e do trânsito – foram algumas das promessas feitas e que ficariam como legado da Copa em Natal. Dos projetos feitos, só o aeroporto e o estádio estão prontos.
Os projetos de mobilidade urbana acenderam conflitos com os moradores da cidade que precisariam ser desalojados para que estes pudessem ser concretizados. A construção de túneis, viadutos, vias exclusivas para ônibus urbanos (Bus RapidTransit) entre outros, passariam necessariamente pela desapropriação. Foi possível notar por muito tempo a exposição de faixas que diziam “não” aos processos de desapropriação nas casas que compõe o entorno do estádio, principalmente as localizadas na Av. Capitão Mor Gouveia. Interessante notar, que este processo criou uma Associação Potiguar dos Atingidos pelas Obras da Copa (APAC) que, em julho de 2013, em reunião com o prefeito da cidade, Carlos Eduardo Alves (PDT), e em reunião com outros órgãos envolvidos com o mundial, decidiram reduzir os impactos das desapropriações transformando a Av. Capitão Mor Gouveia em rua de mão única, impedindo assim, as expropriaçõesna área.
Após as manifestações de 2013, o poder público em Natal corre contra o tempo para minorar os problemas urbanos de uma cidade de médio porte. Várias construções, principalmente de mobilidade urbana, estão sendo realizadas as pressas causando enorme dificuldade de locomoção de ônibus ou de carro na hora do rush. Ao que tudo indica um dos legados da Copa do Mundo FIFA 2014 em Natal ficará de fato para os brasileiros e não para os turistas, pois será um legado construído depois da Copa!