Que tal visitar um brechó?

Atravessei a rua cheia de más intenções e entrei numa loja meio escura, meio claustrofóbica. Lá, araras abarrotadas exibiam roupas mais ou menos interessantes, sendo que boa parte delas foi concebida em outras épocas. Um olhar mais atento e paciente poderia encontrar verdadeiras preciosidades ali. No entanto, o que eu queria era mostrar que, sim, o brechó pode ser uma parada interessante, mas que nos últimos tempos tem sido superestimado e que talvez não seja para tanto. É, algumas visitas frustradas me deixaram assim, meio amarga.

Socorro exibe bolsa do acervo (foto: Morgana Brota)

Acontece que tudo mudou no segundo em que me vi correndo as mãos pelas roupas. E acredite, há qualquer coisa de irresistível num brechó. De repente eu estava tentando achar uma peça fantástica de antigamente, como se estivesse com os pés e mãos enfiados no cascalho em busca de uma pepita de ouro. Garimpar é a palavra de ordem e é preciso ter paciência. Paciência, entusiasmo e algo mais.

“Pobre tem vergonha de comprar em brechó. E falo de pobre de espírito também. Quem gosta de brechó é quem tem a mente aberta”, afirma Socorro Najar, proprietária do Art-Fina, um dos mais antigos de Aracaju. Socorro iniciou suas atividades há 20 anos e, na época, vendia com uma amiga apenas peças vindas dos Estados Unidos. Quando se deu conta de que roupas usadas “tinham saída”, ela resolveu expandir. Hoje, seu acervo conta até com peças de grandes personalidades sergipanas, que são deixadas no balcão do Art-Fina pelos motoristas dessas famílias. Tudo é vendido na base da consignação e o lucro dividido igualmente entre o dono da peça e o brechó.

Socorro conta – com aquele bom humor típico de quem sabe administrar muito bem um negócio – que roupa usada já foi alvo de muito preconceito. “As pessoas diziam que os mortos, donos das roupas, voltariam para pegar no pé de quem comprava”, confidencia entre boas risadas. Como sou do tipo impressionável senti uma brisa gélida e algum mal estar por estar entre tantas peças que já foram de quem só Deus sabe onde estão, mas nada que me fizesse desistir das possibilidades que só um brechó pode trazer.

Jéssica exibe uma das suas compras: vestido Cantão (Foto: Morgana Brota)

O preconceito ainda existe, é claro. E não está relacionado somente a questões do além. Mas Socorro admite: nos últimos anos a procura aumentou bastante. Uma das principais causas do sucesso é a mais óbvia e está diretamente relacionada ao preço e ao fetiche da exclusividade. “Os clientes gostam de comprar peças de grife aqui, já que saí bem mais barato que comprar no shopping”, afirma.

A bióloga Maria do Carmo dos Santos, 44 anos, frequenta o brechó há mais de 15 e garante que já comprou roupas que não sairiam por menos de 200 reais se compradas num shopping. Tendo morado por anos no Rio de Janeiro ela reconhece que, por aqui, o preconceito ainda fala alto, mas isso não impede que ela continue comprando peças de segunda mão. “Eu gosto de comprar bolsas aqui pela qualidade e preço bom. Mas também compro roupas e é muito melhor que ir nessas lojas de departamento, comprar uma blusa e encontrar cinco pessoas com outra igual. Isso é um constrangimento”, conclui.

Já a enfermeira Jéssica Sobral, 21 anos, não pensa duas vezes ao afirmar que o que mais gosta de comprar em brechó é jeans. E, com uma pontinha de dor, digo que ela levou uma das peças mais interessantes que eu vi por lá. “No brechó a variedade de jeans é maior e não fica restrita ao que está na moda, não é tudo padronizado”, afirma Jéssica, que acompanha vários blogs relacionados ao tema e não dispensa peças com aquela pegada retro.

Para os mais curiosos, esse foi o cinto que arrematei (foto: Morgana Brota)

No fim das contas, nem eu fiquei imune às possibilidades e arrematei um cinto fantástico. Desses com fivela e ponteiras douradas que o pessoal usava antigamente. A peça, com ares de nova mesmo, lembrou um modelo que minha mãe tinha e usava lá nos idos anos 90. Quanto eu paguei? Dez reais. Bom, não é?

Além da economia e das eventuais surpresas, visitar brechós é uma ótima maneira de exercitar o olhar, de sair do óbvio, sabe? Algumas visitas não rendem mais que alguma frustração. Mas noutras, quem sabe, você encontrará aquela peça que, bem, você saberá quando encontrar.

Se interessou, mas não saberia como comprar? Lígia Krás, antropóloga e especialista em brechós, dá algumas dicas aqui.

Serviço:
Brechó Art-Fina
Rua Santa Luzia, 127 – Esquina com Rua Maruim / Centro
Telefone: 9996-0998
Funcionamento: Segunda à Sexta, das 9h às 19h

Ah, vale dizer que nenhum estabelecimento é citado neste blog por meio de publicidade e que nenhum tipo de pagamento influencia minhas pautas.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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