Marcelo Déda é o novo e traz esperança. O governo é novo, quebra um ciclo. Muitos secretários são novos e até assustam. Medo do desconhecido. Mas nem tudo é novidade. Afinal, a unanimidade é burra e todos precisam conviver com o contraditório para governar. E que o semi-novo não venha agora dizer que é outro, reciclado, porque esse verniz na cara, ameaçando descascar, pode esconder o que há de velho no rosto. De mãos limpas Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi empossado no cargo quatro anos atrás, a palavra mais pronunciada no Brasil era “esperança”. A confiança de que algo bom ainda pode acontecer não morreu, afinal, o povo concedeu nova chance ao retirante nordestino que virou o principal mandatário do país. Mas a expectativa popular esteve por um triz, quase foi quebrada pela sucessão de erros políticos revelados na segunda metade do mandato. Lula sofreu com os desgastes perpetrados por petistas aloprados e adesistas sedentos por cargos e outras facilidades menos nobres. E teve que engolir o prejuízo de não ganhar a reeleição já no primeiro turno, quando tudo afirmava que seria uma barbada contra o picolé de chuchu. Mas o dispêndio poderia ter custado o próprio mandato — não fosse o adversário tão fraco e o governo ter conseguido manter a economia estável, ter iniciado um combate à fome e à pobreza e ter gerado empregos. Que a lição de engenharia política às avessas sirva ao governo Marcelo Déda que ora se inicia. É bom não abusar da esperança que agora acalenta o desejo dos sergipanos. Que o governador não deixe a sua turma correr muito frouxa e que saiba manter a necessária autoridade sobre os aliados mais afoitos. O debate de idéias, as discussões mesmo acaloradas, os eventuais desentendimentos e aborrecimentos, o toma lá dá cá limpo e às claras, essas são coisas próprias da política. Mas há um fio quase imperceptível entre isso e o descambar para a baixaria. Que Déda faça da sua honestidade um exemplo de que é possível ascender na política sem precisar sujar as mãos. Age como se fosse mineiro, mas não é Flávio Conceição de Oliveira Neto, com sua barba capuchinha de Frei José, desfez qualquer dúvida que ainda pudesse restar sobre o seu prestígio. Empossado no cargo de conselheiro do Tribunal de Contas de Estado na última sexta-feira, reuniu o crem de la crem das autoridades sergipanas. Seis governadores estavam presentes, ou seja, quatro ex-governadores — Seixas Dória, Antônio Carlos Valadares, Albano Franco, além de Gilton Garcia, ex-governador do Amapá —, o ainda governador João Alves Filho e o quase governador Marcelo Déda. Os deputados estaduais mais uma vez foram unânimes na sua aprovação e estavam todos os 24 lá. E há outra unanimidade sobre a nossa eminência parda: todo o mundo político fala bem dele, que é um sujeito cordial, que é cumpridor da palavra, que sabe agradar. E age como um verdadeiro mineirinho, em silêncio, sem se preocupar em aparecer, embora seja “um baiano criado no Rio de Janeiro”. Prece pela tolerância Para encerrar menos azedo o ano trágico de 2006 e iniciar com uma palavra de fraternidade o ano que se inicia, aí vai um texto do filósofo francês Voltaire (1694-1778): “Não é mais aos homens que me dirijo. É a você, Deus de todos os seres, de todos os mundos e de todos os tempos: que os erros agarrados à nossa natureza não sejam motivo de nossas calamidades. Você não nos deu coração para nos odiarmos nem mãos para nos enforcarmos. Faça com que nos ajudemos mutuamente a suportar o fardo de uma vida penosa e passageira. Que as pequenas diferenças entre as vestimentas que cobrem nossos corpos, entre nossos costumes ridículos, entre nossas leis imperfeitas e nossas opiniões insensatas não sejam sinais de ódio e perseguição. Que aqueles que acedem velas em pleno dia para te celebrar, suportem os que se contentam com a luz do sol. Que os que cobrem suas roupas com um manto branco para dizer que é preciso te amar, não detestem os que dizem a mesma coisa sob um manto negro. Que aqueles que dominam uma pequena parte desse mundo, e que possuem algum dinheiro, desfrutem sem orgulho do que chamam poder e riqueza e que os outros não os vejam com inveja, mesmo porque você sabe que não há nessas vaidades nem o que invejar nem do que se orgulhar. Que eles tenham horror à tirania exercida sobre as almas, como também execrem os que exploram a força do trabalho. Se os flagelos da guerra são inevitáveis, não nos violentemos em nome da paz. Que possam todos os homens se lembrar que eles são irmãos!”
A democracia é terrível mas é o menos pior dos regimes e um dia acaba impondo o entendimento entre desiguais. A democracia brasileira então. Um dia Déda foi adversário de Valadares e fazia manifestação na porta do palácio Olímpio Campos contra ele. É a vida. Outro dia, Déda votou pela intervenção na prefeitura de Jackson Barreto. Faz parte. Senador e deputado federal são os principais aliados de hoje e foram decisivos na conquista do primeiro governo de esquerda de Sergipe. Agora todos estão juntos sob a bênção da Igreja Universal do Reino de Deus, com católicos, tucanos e ateus, os que crêem e até os que não têm medo de ser descrentes, claro!
Governar é para todos. Compartilhar a vitória também. É do jogo democrático, dizem os conciliadores de plantão. E os (muitos) que pegaram o bonde andando fazem coro. Amém!
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