Quem assume a culpa do aumento da violência?

A banalização da violência e crime no Brasil é um dos assuntos vastamente discutido nos espaços sociais, e consequentemente nos meios de comunicação. Por ser a violência urbana um problema que alarma a sociedade, ao passo que o crescimento populacional desenfreado tem proporcionado maior incidência de crimes resultantes em morte, a mídia brasileira tem focado grande parte da sua produção noticiosa nos atos criminosos, e principalmente nos atos com incidência psicopatológica ou os denominados crimes com requintes de crueldade, a exemplo de esquartejamentos, chacinas etc.

A partir disso, a imprensa se utiliza desses casos que fogem dos crimes banais do cotidiano para buscar nos atos atrozes chamar a atenção da população seguindo a lógica de mercado que é a de obter mais lucro através da venda da notícia. Em Sergipe, alguns veículos de comunicação, sobretudo na Internet, abusam das notícias com teor sensacionalista e de exploração da imagem dos fatos bárbaros que acontecem. Se a lógica dos meios de comunicação é a de mercado, ou seja, a visão empresarial de vender cada vez mais para obter mais lucro, é necessário entender e explicar os motivos que levaram a essa espetacularização da morte e dos crimes bárbaros que acontecem e por que a anormalidade nesse sentido chama a atenção da população sergipana.

O fenômeno da morte, apesar de ser um processo natural da vida humana, é por vezes tratado como um espetáculo pela sociedade e meios de comunicação, especialmente quando este fato é resultado de uma ação criminosa. Na história do jornalismo consta um período inicial em que os folhetins tinham caráter sócio-político, porém escrito de maneira literária, com o intuito de despertar a sociedade para os problemas sociais da época. De acordo com Nelson Traquina, o caráter estritamente revolucionário do jornalismo impresso durou até aproximadamente o século XIX, quando o jornalismo teve que passar por diversas modificações estruturais por causa da lógica comercial, uma vez que os folhetins não conseguiriam se sustentar com o antigo modelo de jornal impresso.

O caráter comercial do jornalismo incitou mudanças drásticas na sua estrutura a partir da busca pelo lucro, e da determinação de uma linha editorial que alcançasse esse propósito. Ou seja, a partir do momento em que o jornalismo adota essa política de mercado, logo, visa alcançar maior público e lucro, e é através do aumento de propaganda e apelando para as notícias sensacionalistas que o leitor será tentado a comprar a edição. O que antes era um produto de debate sócio-político e com a função de gerar uma consciência crítica na sociedade, virou um produto mercadológico com o objetivo de massificar a sociedade para o aumento das vendas, e consequentemente o aumento do lucro do empresariado. Os donos de jornais, que eram revolucionários, se tornaram grandes empresários da indústria de notícias.

Apesar dos meios de comunicação afirmarem ser objetivos e neutros, ao noticiar um fato, é o jornalista que escolherá o ângulo a ser mostrado, e mesmo que se mostrem outros lados de um fato, inevitavelmente e, mesmo que inconscientemente, o profissional será levado a privilegiar um ângulo. A partir disso, as notícias são construídas com o intuito de formar opiniões e por vezes deliberar certos preconceitos, já que a mídia é mundialmente reconhecida como formadora de opinião. No Brasil, assim como no mundo inteiro, a imprensa possui o papel primordial de informar a população daquilo que não está ao alcance de todos, informações de relevância social, que é determinada pela linha política do meio de comunicação em questão. A relação estabelecida entre a imprensa e a sociedade é estreita, uma vez que a mídia sergipana por vezes faz o papel de ‘justiceira social’, a partir das denúncias e retratações, especialmente dos crimes, feitos pela população local.

Em tempos de indústria de informações falsas, quem é o responsável, então, pelo aumento do índice de violência e a divulgação massiva de cenas de violência nas redes sociais? Podemos acusar a imprensa de incitá-la ao longo do tempo em que o mercado cobra o sensacionalismo para venda,  ou a culpa é do Estado? Não adianta buscar culpados sem apresentar soluções. O jornalismo segue buscando fôlego para se manter, mesmo com a velocidade de publicação de notícias falsas por pessoas que não são jornalistas, e o Estado busca tirar o seu da reta quando aponta que mantém as polícias e políticas públicas de segurança pública (para quem?). E nisso tudo, a sociedade segue consumindo e produzindo a violência de maneira desenfreada, acreditando que faz justiça social, quando está apenas fornecendo o que o mercado quer, audiência e lucro com o crime.

Mas, o que fazer? Primeiramente, eleja pessoas compromissadas, de fato, com as políticas públicas de segurança, que não significa políticas de extermínio da população. Outra coisa importante é parar de consumir e divulgar notícias falsas acerca de crimes, comentar as matérias com frases que incitam o ódio e revolta, fazer perseguição aos envolvidos etc. Além disso, é importante ler, questionar e denunciar atitudes criminosas nos órgãos competentes e não dar audiência a veículos de comunicação que não tenham o compromisso com a ética no jornalismo.

*Esse texto é uma adaptação de parte de um artigo acadêmico apresentado no XCAAS, em 2011, em Buenos Aires.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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