Receita para tapar o rombo

Foi em nome de uma admitida governabilidade ou de uma não reconhecida sede de perpetuação no poder, temperada por uma habilidade política tosca, que o projeto petista chegou a essa crise que está aí depauperando a economia. E para não fugir ao epigrama “se algo pode dar errado, dará”, o governo enviou ao Congresso um Orçamento com déficit, algo classificado pelo bruxo Delfim Netto como “a maior barbeiragem política e econômica da história recente do Brasil”. É um governo pródigo em garantir discurso alheio.

O rombo estimado para 2016 é de R$ 30,5 bilhões. Como age timidamente, o governo sabe que não vai conseguir cortar os gastos necessários para fechar as contas. Daí a necessidade de se recriar a CPMF, um imposto que a propósito de cobrir o déficit da Previdência, garantiria 55% dos recursos necessários para cobrir o rombo do Orçamento.

Quanto aos cortes, as medidas anunciadas não cortam somente a própria carne, muito menos dos outros poderes — os governos sempre têm medo de mexer com o Judiciário e com o Legislativo. Atingem funcionários públicos e os cidadãos que mais precisam.

O governo propõe adiar o reajuste de salário do funcionalismo de janeiro para agosto de 2016, eliminar o abono de permanência — um acréscimo no salário, que o servidor recebe para não se aposentar — e suspender os concursos públicos. Vai mexer no PAC, tirando mais dinheiro do FGTS para bancar o Minha Casa Minha Vida. E, na agricultura, vai cortar o dinheiro que garantia preços mínimos.

É certo que propõe também cortar salários dos servidores que recebem acima do teto; reduzir gastos como alugueis, manutenção, passagens e diárias; direcionar emendas parlamentares obrigatórias para o PAC; e, na saúde, também quer usar dinheiro das emendas parlamentares para cumprir o gasto obrigatório.

Mas por que não cortar as mordomias do Poder Judiciário, por exemplo? Em 2014, o Judiciário gastou R$ 3,8 bilhões no pagamento de benefícios a magistrados e servidores. A verba inclui auxílios educação, funerário, transporte, entre outros. O valor consta do relatório “Justiça em Números”, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça.

Segundo o documento do CNJ, esses valores pagos aos magistrados e servidores do Poder Judiciário representam 6% de todo o gasto com pessoal nos tribunais do País, de R$ 61,2 bilhões. Os benefícios a magistrados são considerados uma forma de garantir remuneração acima do teto constitucional, pois não entram no cálculo da remuneração passível de corte.

E o cálculo não inclui o gasto com as chamadas verbas indenizatórias, que consumiram R$ 1,2 bilhão em 2014. Fazem parte dessa rubrica o auxílio-moradia, diárias e passagens, entre outros.

Nessa esfera do Judiciário, por que não aproveitar e enxugar uma coisa considerada anacrônica, cara e improdutiva chamada Justiça Militar? Existe proposta de reduzir o número de ministros do Superior Tribunal Militar e diminuir o tamanho da Justiça Militar da União. E acabar com os três únicos tribunais militares que ainda restam, em Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul, que consomem mais de R$ 100 milhões por ano.

Tabela de benefícios de um deputado federal

No Congresso Nacional, o governo deveria cortar as mordomias dos parlamentares. Hoje, somente os deputados federais custam aos cofres públicos R$ 75 milhões ao mês. Além do salário de R$ 33,7 mil, eles têm direito a ajuda de custo, cotão, auxílio moradia e verba de gabinete para até 25 funcionários.

Nessa conta não estão incluídos carros oficiais dos ocupantes da Mesa, impressões e materiais diversos. Por exemplo, cada deputado tem direito a até 4 mil exemplares de 50 páginas por ano. O cotão inclui passagens aéreas, fretamento de aeronaves, alimentação do parlamentar, cota postal e telefônica, combustíveis e lubrificantes, consultorias, divulgação do mandato, aluguel e demais despesas de escritórios políticos, assinatura de publicações e serviços de TV e internet, contratação de serviços de segurança. Varia de estado para estado. Para Sergipe, custa R$ 33.944,35.

O governo também deveria reduzir a propaganda oficial no rádio e na TV. Desde o ano 2000 (quando os dados passaram a ser compilados de maneira mais precisa) até 2012, somente a TV Globo recebeu R$ 5,9 bilhões para veicular publicidade estatal federal, tanto da administração direta como indireta. Os gastos totais foram de quase R$ 11 bilhões.

E poderia também acabar com as pensões e aposentadorias especiais para autoridades e políticos, incluindo as pensões vitalícias para governadores. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal considerou ilegal a pensão vitalícia de ex-governadores e mandou suspender o pagamento do benefício no Pará.

A aposentadoria para os ex-administradores, prevista nas constituições estaduais, existe em 21 unidades da federação e o STF ainda vai julgar ações contra o benefício em outros dez estados, incluindo Sergipe. É uma conta anual para os cofres estaduais de R$ 46,8 milhões. Aqui, quatro ex-governadores dão um gasto anual de quase R$ 1,5 milhão para o Estado. Seguisse essa receita, o governo provavelmente teria dinheiro para tapar o rombo do orçamento.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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