Pedro Carvalho Oliveira
Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Estadual de Maringá.
Orientador: Prof. Dr. Sidnei J. Munhoz (PPH-UEM).
Bolsista financiado pela CAPES.
Integrante do Laboratório de Estudos do Tempo Presente (LabTempo-UEM)
Colaborador do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET-UFS).
E-mail: pedro@getempo.org.
Desde julho do presente ano, o Reino Unido vem testemunhando crescentes ondas de violência contra imigrantes. Não é uma novidade no país. Mas, segundo dados da polícia, os crimes de xenofobia aumentaram mais de 40%, sobretudo em cidades menores, em comparação ao ano anterior. Isso se deu exatamente um mês após os britânicos irem às urnas para uma polêmica votação que, apoiada por conservadores e ultranacinalistas, teria um resultado sintomático sobretudo quando justaposto a esforços antigos para barrar a presença de estrangeiros, bem como para valorizar o nacionalismo.
Em junho de 2016 os britânicos votaram majoritariamente, por meio de um referendum, a favor de que o Reino Unido deixasse a União Europeia. Foi a primeira vez que um dos países membros do bloco decidiu, por vontade própria, consultar a nação a respeito de sua permanência. A proposta para essa consulta foi colocada pelo então primeiro ministro David Cameron, do Partido Conservador, ainda em sua campanha ao cargo. Essa iniciativa surgiu de pressões internas de seu partido a respeito do exacerbado crescimento do bloco europeu e de uma dita considerável perda de autonomia dos birtânicos. Em meio a isso, organizações políticas nacionalistas de extrema-direita vislumbraram uma oportunidade de visibilidade.
O Partido de Independência do Reino Unido (em inglês, United Kingdom Independence Paty, ou Ukip) talvez seja o mais relevante entusiasta do que ficou conhecido como Brexit, termo que une as palavras “britain” (birtânico) e “exit” (saída) para se referir ao processo de retirada da Grã-Bretanha da União Européia. Nigel Farage, líder do partido, foi personagem protagonista nas pressões pró-Brexit alegando que para uma maior autonimia dos britânicos, era necessário reafirmar sua identidade. Consequentemente seria necessário, de acordo com sua visão, restringir ao máximo a presença de estrangeiros no país e valorizar o nacionalismo em todos os âmbitos possíveis.
Esse tipo de posicionamento político não é novo no Reino Unido. Inclusive, em um passado não muito distante, os discursos nacionalistas de algumas organizações políticas flertavam abertamente com ideias neofascistas, quando não as defendiam explicitamente. Foi o caso do National Front (NF), nos anos 1970, e do British National Party (BNP), na década seguinte, ambos parte da linha de frente neofascista britânica. Naquele tempo se vivia uma crise profunda do capitalismo e a ascensão do neoliberalismo ao poder. O BNP, mais do que o NF, estendeu sua militância até os dias atuais e recentemente se colocou amplamente favorável ao Brexit.
Em sua página na Internet (htt://bnp.org.uk/), o BNP lançou uma matéria na qual acusa militantes da esquerda de praticarem crimes de ódio. Com o título “Brexit abastece onda de crimes de ódio esquerdistas”, os autores relatam como defensores da esquerda tem agredido, verbal e fisicamente, grupos políticos e votantes que apoiaram o Brexit. Se utilizando de dados não comprovados e de estatísticas pouco confiáveis, a matéria acusa esses militantes de opressores numa clara dinâmica de reversão, por meio da qual buscam se tornar vítimas.
Tal recurso é antigo e o BNP já o utilizou em campanha política. No início dos anos 1990, o partido buscou por meio da campanha “Rights for Whites” (direitos para os brancos) falsamente mostrar à sociedade britânica que a presença de outras etnias, presentes no país em decorrência da imigração com a qual políticos liberais eram coniventes, era a princpal causadora de tensões sociais. Dessa forma, diziam que os brancos ingleses deveriam reaver seus direitos por meio de um nacionalismo que execrasse os imigrantes. Nesse contexto, tentavam soar como vítimas e dar aos estrangeiros as feições de algozes.
O Partido Conservador, proponente do referendum, está longe de se aproximar do Ukip ou do BNP em suas propostas extremistas. Ocorre que, nesse ponto, o que envolve o Brexit, há a aproximação por meio de um ponto comum: questionar a perda de autonomia britânica. Parece que, de alguma forma, essa sensação de perda de autonomia, de ameaça, se estende para além das relações políticas externas. Parece que ela alcança as ruas e estabelece “inimigos”, os “outsiders”, que recebem a violência energizada pelas noções nacionalistas do que eles representam. Nesse momento, parece que, com o “sim” tendo vencido no referendum, existe no ar uma espécie de segurança muito perigosa: a de que os agressores de imigrantes se sentem respaldados pela população.