Sergipe e o Conselheiro (VII)

                                                                                                        Luiz Antonio Barreto

 

                           

Padre Daltro (Foto: Divulgação)
Lagarto é ponto central de uma região rica de experiências originais e inusitadas. Em seu redor estão Itabaiana, Simão Dias, Tobias Barreto, Boquim, ocupando vasta área produtiva, onde floresceu uma civilização mesclada de utopias, como a tornar possível uma civilização justa, sob as graças de uma religiosidade popular. A figura do Monsenhor Daltro é a referência dominante, por conta de sua ação como vigário, por algumas décadas, na transição entre o Império e a República.

Monsenhor João Batista de Carvalho Daltro nasceu e morreu no engenho Baixão, em Simão Dias, propriedade de sua família, que depois de retalhada entre herdeiros sobreviveu com o nome de Baixão, na divisa entre Simão Dias (que também chamou-se Anápolis) e Paripiranga (antiga Coité). Depois de aprender as primeiras letras, Daltro matriculou-se no Liceu Sergipense, escola secundária fundada em 1847, que funcionou até 1855, sendo fechado pelo Presidente da Província Inácio Joaquim Barbosa. O hiato do ensino  secundário durou 16 anos, até que foi criado e instalado, em Aracaju, o Colégio Ateneu Sergipense, ainda hoje em atividades.

Corre como lenda que o padre Daltro só celebrava casamento de noivos que tivessem um cavalo e um pedaço de terra. Na oralidade circula, também, que ele exigia dos nubentes a posse de uma vaca. O cavalo para o transporte da produção, a terra para a lavoura e o criatório, base da colonização sergipana, e a vaca para garantir a alimentação da prole. Esta forma de administrar o sacramento do matrimônio deu ao padre Daltro uma força moral, que suplantou o desgaste de ter constituído família, permanecendo na Igreja e na mesma vigararia.

Outro aspecto da ação pastoral do padre Daltro foi a doação de bens e recursos financeiros para dotar o Lagarto de equipamentos, como Hospital e Cemitério, úteis para a saúde pública. Foi em meio a tais atividades, que projetava sua ação sacerdotal, que encorajou o vigário do Lagarto, na segunda metade do século XIX e na primeira década do século XX, a combater os adeptos de Antonio Conselheiro, agindo para impedir que as pessoas mais simples tomassem o caminho de Canudos e engrossassem as fileiras do líder cearense. Estrategicamente bem situado, na geografia sergipana, com entradas pelas terras baianas, padre Daltro conseguiu evitar que uma legião de homens e mulheres aderissem às práticas do Conselheiro. É claro que ele contava com influentes amigos e parentes, com interesse na guerra, como Pedro Freire de Carvalho, que fornecia animais, comidas e gêneros necessários às tropas das expedições do Exército brasileiro, especialmente a expedição comandada pelo general Savaget, que acampou em Simão Dias, no seu deslocamento de Aracaju para Canudos.

Parente e biógrafo de Daltro, o desembargador Gervásio Prata, em dois pequenos textos sobre Lagarto e o padre Daltro, registra e comenta a disposição do sacerdote em frear o ímpeto dos que eram atraídos pela pregação e pela resistência do Conselheiro, formavam filas para a viagem a Canudos e o alistamento nas tropas conselheiristas. Mesmo sendo um padre do melhor estilo messiânico, Daltro não entendeu o movimento do Conselheiro, combatendo-o ferozmente.Ttalvez tenha peso em sua posição, o fato dos políticos de sua família, que não eram poucos, terem aderido aos militares da República.

A ação apostólica do Monsenhor Daltro deixou na tradição lagartense uma adesão que pode ser identificada, por exemplo, na organização da Colônia 13, cooperativa que deu ao município um desenvolvimento singular, incomparável com qualquer outro. O 13 realiza, em certa medida, o desejo daltriano de organização da família, pelo casamento, com a garantia econômica da sobrevivência. Ainda hoje, na memória dos lagartenses, resiste a utopia do vigário, tal qual sobrevive a sua própria imagem, como se viu na festa do Centenário de sua morte, em 2010.

Em reforço à sua oposição ao Conselheiro, padre Dalteo combateu o seu colega viga de Frei Paulo, Felismino da Costa Fontes, que praticava o Catolicismo como uma Seita.    

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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