O poder vicia
Ele, em dose alta, deixa o “profissional da política” em um caminho sem volta. Vai da luxúria ao assassinato. Os jogos, diálogos, trocas, negociações, tudo o que envolve este campo de trabalho autônomo, é visto pela maioria dos civis como algo ou muito distante, ou algo já
apodrecido. Isso porque o poder, numa república (a chamada “coisa do povo”), deveria emanar dessa maioria. Essa maioria, que é um conjunto de minorias.
House of Cards, série que já é adaptada ao contexto norte-americano, libera à plateia de espectadores – esta que é tanto eleitora quanto audiência, em um jogo de poder que se faz “do povo” – , um novo modelo de filme, série, produção sobre política. Dá pra chamar de “filme político”. Dá pra chamar, também, de trama de intrigas. Ou, drama-policial.
Tudo junto, porque na política contemporânea, principalmente aqui no território americano (tanto do norte quanto do sul), a situação é de construção de bases imperiais. Washington, capital, como Brasília, é uma cidade que vive isolada – do mundo, das pessoas, do país. Lá se dá o jogo de cartas marcadas. A mediação única é dada pela mídia, que está, também, viciada pelo poder: prostituída. As eleições mudam as cartas, mas o jogo permanece. A máxima de Tomasi di Lampedusa nunca foi tão atual: “Para que as coisas permaneçam iguais, é preciso que tudo mude”.
E, na política contemporânea, não há mais distinção entre “direita” republicana e “esquerda” democrata. A guerra se dá em outros termos: entre projetos e posições. Quais são os projetos? Como eles são confeccionados? Como são negociados os votos? De que maneira eles são aprovados entre os deputados?
Essas forças se dão no parlamento. E tem força, quem tem influência. Quem não tem influência, fica marginalizado(a). A não ser que este profissional mude do legislativo para o executivo… Temos um caso que se destaca atualmente no Brasil. Temos casos antigos, nas repúblicas romanas.
A grande questão de House of Cards, como uma série política, é recriar o olhar do espectador. Mudar a maneira como ele percebe o tal jogo político. Ele está configurado, nas américas – já é possível dizer isso -, de forma a concentrar poder. A democracia, portanto, encontra-se corroída não pelas pessoas, mas por sua própria forma adaptada às colônias europeias. Continuamos.