A sífilis é uma doença infecciosa de transmissão sexual e também da mãe infectada para o filho (Sífilis Congênita). A bactéria denominada Treponema pallidum, quando presente na corrente sanguínea da gestante, atravessa a barreira placentária atingindo o feto. A infecção do feto pode ocorrer em qualquer fase da gestação. O risco de transmissão ao feto varia de acordo com o estágio da doença na gestante. A sífilis congênita pode ser causa de prematuridade, abortamento espontâneo, óbito fetal (em até 40% dos casos de sífilis na gestação poderá ocorrer morte do feto ou do neonato); recém-nascidos sintomáticos (com as manifestações clássicas – baixo peso, anemia, aumento do fígado e baço, icterícia) e recém-nascidos assintomáticos.
A prevenção da sífilis congênita pode ser feita com medidas simples, de baixo custo e altamente eficazes, traduzidas no diagnóstico da sífilis materna e no tratamento adequado da mãe e de seu parceiro sexual , resultando no tratamento simultâneo do feto. A ocorrência de casos de sífilis congênita revela falhas graves no sistema de saúde. A sífilis congênita é considerada, portanto, um indicador para avaliação da qualidade da assistência à gestante.
A falha no Pré-natal não é necessariamente, falha do profissional de saúde. Existem falhas com relação à própria gestante. Por exemplo, existem gestantes itinerantes, isto é, mudam de endereço com frequência e a equipe de saúde da família tem dificuldade de acessar para iniciar o pré-natal. Existem gestantes usuárias de drogas, cujo pré-natal é muito difícil. O convite para a participação do parceiro sexual no pré-natal nem sempre e fácil. Por outro lado, existem falhas dos gestores, como a dificuldade de disponibilizar a penicilina e dos exames confirmatórios, municípios que possuem recursos financeiros específicos parados. Existem gestores que não valorizam as ações de prevenção na comunidade. Não podemos negar de que existem também falhas dos profissionais de saúde: alguns se esquecem de recomendar o uso do preservativo nas relações sexuais durante a gravidez, tratamento incorreto da gestante e/ou do parceiro, rejeição na administração da penicilina na própria unidade de saúde, alguns se negam realizar o teste rápido na própria UBS, não avaliam as causas do surgimento do caso de sífilis congênita na UBS.
No Nordeste, Sergipe ocupa o primeiro lugar em casos de sífilis congênita notificados, uma média de 300 casos por ano. Atualmente 42% do diagnóstico da sífilis da gestante ocorrem na maternidade. O Pré-natal é o momento para detecção precoce das doenças da gestante, seu tratamento e das parcerias sexuais.
A Secretaria de Estado da Saúde vem desenvolvendo ações específicas para o controle da Sífilis Congênita desde 2010. As principais ações foram: Capacitação para o diagnóstico e tratamento da Sífilis em adulto e gestante com todos os gestores das áreas técnicas municipais e os profissionais de saúde da atenção básica, Capacitação dos profissionais para implantação do teste rápido de HIV e sífilis na atenção básica, Criação da Unidade Móvel Fique Sabendo em 2013 colaborando com o diagnóstico precoce do HIV e sífilis em adultos e gestantes, Realização de uma licitação para compra da medicação Penicilina Benzatina para tratamento da sífilis em gestantes nesse momento de desabastecimento nacional, Participação nos Colegiados Regionais para discutir com os secretários municipais a problemática da sífilis nas regiões e Estado e o papel de cada ente para reversão desse panorama e diversas Campanhas Publicitárias voltadas para mães, pais, população em geral.
Campanha contra a Sífilis ia virar caso de polícia
Após a realização de várias campanhas dirigidas a gestantes, parceiros e população geral, decidimos realizar uma campanha específica para os profissionais de saúde, não para apontar culpados, mas para pedir mais empenho nas atitudes que podem contribuir para redução dos casos.
A Campanha a ser lançada oficialmente apresenta as seguintes peças publicitárias: folder com recomendações para ações estratégicas a serem desenvolvidas pelos municípios para prevenção da transmissão vertical do HIV e sífilis, colete a ser disponibilizado para os profissionais da atenção básica que executam teste rápido com o slogan: “SOU PROFISSIONAL DA SAÚDE E AJUDO NA PREVENÇÃO DAS INFECÇÕES SEXULAMENTE TRANSMISSÍVEIS”, uma sacola com o mesmo slogan que será disponibilizada aos agentes comunitários de saúde para as ações de mobilização e o cartaz com a mensagem “ESSAS CRIANÇAS NASCERAM COM SÍFILIS CONGÊNITA POR FALHA NO PRÉ-NATAL. PROFISSIONAL DE SAÚDE FAÇA SUA PARTE!”.
Lamentavelmente, os membros do Sindicato dos Enfermeiros de Sergipe entenderam que a campanha apontava culpados pelo nascimento de crianças com Sífilis e, numa cena cinematográfica, atendendo ao convite do Senhor Secretário José Sobral, chegaram ao gabinete, acompanhados de uma equipe de televisão, para exigir que fossem retiradas as frases “ESSAS CRIANÇAS NASCERAM COM SÍFILIS CONGÊNITA POR FALHA NO PRÉ-NATAL. PROFISSIONAL DE SAÚDE FAÇA SUA PARTE!”, sob a ameaça de penalizar o Secretário, pois já estava tudo pronto para uma queixa crime na delegacia. Inicialmente, a exigência era de suspender a campanha.
Como sanitarista e ativista pelas causas ligadas ao SUS, sentimo-nos decepcionados pela pressão que sofremos para tirar a frase que causou tanta polêmica. Por outro lado, os representantes do COREN – Conselho Regional de Enfermagem, também convidados pelo secretário José Sobral, apoiaram a campanha e sugeriram que fosse feita uma pequena alteração, incluindo nas peças publicitárias, a palavra “GESTORES e Profissionais de Saúde façam a sua parte”. Tal mudança não foi aceita pelos representantes do Sindicato dos Enfermeiros.
Como o objetivo nosso é obter adesão dos diversos profissionais de saúde no enfrentamento à grave situação da Sífilis congênita e, diante de tantas ameaças e pressões, onde certamente a campanha seria “boicotada” nas unidades básicas de saúde, optamos por realizar mudanças na tão “criminosa” frase.
O caso da campanha da sífilis que viraria “caso de polícia” mostra como está a nossa saúde pública. A polêmica poderia ter sido bem menos desgastante se o Sindicato de Enfermeiros procurasse o diálogo, pois somos todos responsáveis pelos problemas de saúde pública no nosso país.