TCE e Assembleia devem explicação

A Assembleia abre os trabalhos da 18ª Legislatura, nesta quinta-feira, 19, envolta na névoa que paira sobre o Poder Legislativo sergipano desde que eclodiu a denúncia de mau uso do dinheiro das subvenções. Nada menos que 15 dos deputados empossados no primeiro dia deste fevereiro estão às voltas com a Justiça por terem distribuído a benesse em ano eleitoral e 10 deles também por terem destinado os recursos a entidades que não prestam nenhum serviço à comunidade ou sequer de fato existem.

Os 15 deputados que foram reeleitos e estão denunciados são os seguintes: Ana Lúcia Menezes (PT), Augusto Bezerra (DEM), Capitão Samuel (PSL), Francisco Gualberto (PT), Garibaldi Mendonça (PMDB), Gilson Andrade (PTC), Goretti Reis (DEM), Gustinho Ribeiro (PSD), Jeferson Andrade (PSD), Luiz Mitidieri (PSD), Maria Mendonça (PP), Pastor Antônio (PSC), Paulinho da Varzinhas (PTdoB), Venâncio Fonseca (PP) e Zezinho Guimarães (PMDB).

Também foram denunciados os ex-deputados estaduais, que não se reelegeram, não disputaram a reeleição ou se elegeram deputados federais: Adelson Barreto (PTB), Angélica Guimarães (PSC), Arnaldo Bispo (DEM), João Daniel (PT), Raimundo Vieira/Mundinho da Comase (PSL), Susana Azevedo (PSC), Zé Franco (PDT e Zeca da Silva (PSC). Ou seja, os 24 que iniciaram a última legislatura são acusados de terem cometido crime eleitoral, já que distribuíram recursos em ano de eleição, de aplicarem mal ou desviarem o dinheiro das subvenções.

De todos esses, o Ministério Público Federal pede a cassação de 13: Adelson Barreto e João Daniel, que agora são deputados federais, dos reeleitos Augusto Bezerra, Capitão Samuel, Gilson Andrade, Gustinho Ribeiro, Jeferson Andrade, Luiz Mitidieri, Maria Mendonça, Paulinho da Varzinhas, Venâncio Fonseca e Zezinho Guimarães, e mais de Arnaldo Bispo, que não disputou a reeleição. O pedido de cassação foi protocolado quando todos ainda exerciam mandatos.
Ao mesmo tempo, a Associação Nacional do Ministério Público de Contas entidade representativa dos membros do Ministério Público de Contas junto aos 34 Tribunais de Contas do Brasil, quer anular a posse da ex-deputada Angélica Guimarães no cargo de conselheira do Tribunal de Contas de Sergipe.

Atuando no Ministério Público Eleitoral, a procuradora da República Eunice Dantas Carvalho investigou a constatou que muitas entidades não-governamentais ditas de utilidade pública são um ralo por onde escorre o dinheiro público.
No ano passado, cada deputado dispunha de R$ 1,5 milhão para patrocinar ações de interesse coletivo. Muito pouco foi destinado a entidades de reconhecida eficiência e idoneidade na prestação de serviço.

Enquanto isso, a Associação de Moradores e Amigos do Bairro Nova Veneza, por exemplo, aparece na relação de beneficiárias como se tivesse feito jus no ano passado a R$ 2,325 milhões. Só Paulinho da Varzinhas deu R$ 1,085 milhão, Augusto Bezerra deu R$ 940 mil e a hoje conselheira do TCE Susana Azevedo, R$ 300 mil. Mas Luzinaide dos Santos, integrante do conselho fiscal da associação, garante que nunca recebeu recurso público nenhum. Detalhe importante: daquele montante, R$ 478 mil retornaram, em forma de cheques nominais, para o deputado Augusto Bezerra.

Em Aracaju haveria uma prosaica Associação de Produtores de Eventos que teria recebido R$ 942 mil: R$ 375 mil de Paulinho da Varzinhas, R$ 350 mil de Zeca da Silva, R$ 127 mil de Susana Azevedo e R$ 90 mil de Raimundo Vieira, o Mundinho da Comase. O homem que foi ouvido como dirigente da entidade, Márcio José Goes, sequer sabia o endereço da associação. Mas disse à procuradora lembrar de ter recebido uns R$ 400 mil.
A Associação Nossa Senhora do Desterro, em Japoatã, recebeu R$ 580 mil da então presidente da Assembleia, Angélica Guimarães. Então eleita conselheira do Tribunal de Contas do Estado, quando estourou a denúncia ela devolveu o dinheiro ao Poder Legislativo. A instituição é dirigida pela mãe da agora conselheira.

A Associação de Moradores e Amigos do Conjunto Siri, localizada no município de Nossa Senhora do Socorro, também é um caso interessante. Recebeu R$ 500 mil, sendo R$ 450 mil de Gustinho Ribeiro e R$ 50 mil de Augusto Bezerra, mas na localidade ninguém sabe onde ela funciona ou se já prestou algum serviço.

Caso parecido com a Associação de Moradores e Agricultores do Povoado Visgueiro, em Muribeca, que recebeu R$ 480 mil do deputado Jeferson Andrade. No endereço indicado consta apenas um terreno baldio. O mesmo deputado doou R$ 450 mil para a Associação Comunitária Nossa Senhora da Conceição do Povoado Cobra D’Água, em Pacatuba, mas no local há uma construção ainda sendo erguida.

A Associação Antonio Vieira da Silva Neto, em Itabaianinha, recebeu R$ 439 mil de Mundinho da Comase. A entidade estava fechada, abre eventualmente e tem como vice-presidente a esposa do ex-deputado.

Em Malhador, são citadas duas associações: uma não funciona e a outra nem existe. Uma é a Associação de Moradores de Malhador, que recebeu R$ 85 de Venâncio Fonseca; a outra é a Associação Comunitária de Malhador, que recebeu R$ 105 mil, sendo R$ 85 mil de Venâncio, R$ 15 mil de Maria Mendonça e R$ 5 mil de Susana Azevedo. Mas no quesito município bem assistido Moita Bonita seria campeão se o povo de lá recebesse os benefícios que os deputados alegam ter feito. O pequeno município do agreste sergipano, com pouco mais de 11 mil habitantes, possui três associações comunitárias.

A Associação dos Moradores Carentes de Moita Bonita teria recebido no ano passado R$ 270 mil de Angélica Guimarães (R$ 80 mil), Augusto Bezerra (R$ 60 mil), Venâncio Fonseca (R$ 60 mil), Arnaldo Bispo (R$ 45 mil), Luiz Mitidieri (R$ 20 mil) e Adelson Barreto (R$ 5 mil), mas funciona numa garagem; a Associação de Moradores de Moita Bonita, que recebeu R$ 155 mil, sendo R$ 125 mil de Venâncio Fonseca e R$ 30 mil de Luiz Mitidieri, funciona na casa de um vereador que colocou uma placa indicativa depois das denúncias; já a Associação Comunitária de Moita Bonita, que recebeu R$ 40 mil de Maria Mendonça, é a única que aparenta realizar um trabalho voltado para os idosos.

Nenhum dos deputados ou ex-deputados se pronuncia sobre o escândalo. O Tribunal de Contas do Estado, que teria a obrigação de acompanhar a destinação das subvenções, agora está praticamente de mãos atadas, já que quatro dos sete conselheiros estão diretamente envolvidos com o problema: Angélica Guimarães e Susana Azevedo pelas razões aqui citadas, Ulices Andrade e José Augusto Ribeiro por serem pais dos deputados Jeferson e Gustinho.

Nesse escândalo, o levantamento inicial identificou R$ 12,4 milhões desviados de sua finalidade. Agora não é só uma questão de acabar com as subvenções e transformá-las em emendas ao orçamento do Estado. A Assembleia Legislativa e o Tribunal de Contas do Estado devem explicação à sociedade. Senão por outras denúncias que nunca deram em nada, pelo menos por esse escândalo.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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