Certa vez, eu falava para um grupo de pré-vestibulandos e entre as muitas perguntas por eles formuladas, uma delas chamou-me atenção especial.
A pergunta foi a seguinte: “se o seu filho fosse pré-vestibulando, qual curso você o aconselharia a fazer?”.
Surpreendi-me com a resposta que dei, pois, naquela época, quando alguém me perguntava sobre o que deveria cursar, eu, de pronto, dizia: faça “Direito”, já que, como bacharel em ciências jurídicas, você terá um leque maior de opções: a escolher: advogado, delegado, promotor, juiz, procurador, professor, defensor público.
Porém, naquele dia eu disse: aconselharia ao meu filho, como aconselho a qualquer um de vocês a fazer aquilo que realmente mais gostam. Busquem cursar uma disciplina que agrade e que lhes dê uma profissão na qual vocês se realizem.
A atividade exercida tem que dar prazer. Embora o curso seja o mais penoso ou aparentemente mais “fraco”. Mesma que a profissão não seja aquela “da moda”, embora seja aquela que a grande maioria desaconselha por não ser a mais “rentável”. Mas, se é isso que realmente lhe dá prazer, é com esse mesmo que você deve seguir.
Invista no seu tempo, naquilo em que você não tenha que TRABALHAR, pois quem faz o que realmente gosta não TRABALHA, mas BRINCA. Já pensou, BRINCAR e ainda ganhar para isso?
O TRABALHO ou BRINCADEIRA quem vai exercer é você. É você quem vai conviver no dia-a-dia do resto da sua vida produtiva com ele ou com ela. Imagine passar tantos anos fazendo uma coisa de que não gosta? Neste caso, TRABALHO é um castigo. Aliás, TRABALHAR é historicamente tido como uma punição.
Desde o início da história da humanidade, TRABALHO é considerado castigo.
Quando Deus expulsou Adão do Paraíso, puniu-o dizendo: “a partir de agora, ganharás o pão com o suor do teu rosto…” O que Deus afirmou? Exatamente isso: como punição, terás que trabalhar, se quiseres comer.
A partir de então, o “pão nosso de cada dia” passou a ser uma compensação pelo castigo imposto em decorrência do pecado original. Igual ao salário de hoje. Se for mínimo então, sequer compensa o TRABALHO, ou seja, o “castigo”.
Alguém aí sabe a origem da palavra TRABALHO?
Vamos ver de onde ela se origina? A palavra TRABALHO vem do termo em latino “tripalium”, que significa um instrumento de tortura usado pelos romanos: uma espécie de tripé formado por três estacas cravadas no chão, onde eram supliciados os prisioneiros, escravos, ou hereges. É uma reunião dos elementos “tri” (três) e “palus” (pau) – literalmente, ‘três paus’.
A palavra está, portanto, ligada diretamente à dor, à punição, ao sofrimento, ao tormento, à agonia.
Mais exemplos de como TRABALHO significa dor, castigo, punição?
Quando encontramos dificuldades com a realização de uma tarefa, dizemos que ela é custosa, difícil, cansativa, TRABALHOSA.
Quando uma mulher está para dar à luz, afirmamos que ela está em “TRABALHO de parto”.
Quando temos que conviver com uma pessoa difícil, dizemos que ela dá um TRABALHO, uma TRABALHEIRA e, às vezes, até um TRABALHÃO.
Sem falar naquelas célebres frases que dizemos: quando nos dirigimos ao nosso TRABALHO e alguém se aventura a perguntar: para onde vais? A resposta sai automática: “vou à luta”, “vou para o inferno” “vou pro batente”, “vou para a guerra”, “vou para a batalha…”.
Todos anseiam para que chegue logo o fim da semana, porque fim de semana é um prêmio. Todos os que TRABALHAM durante aquele período, teoricamente de sábado em diante não TRABALHAM mais, a partir de sábado só haverá BRINCADEIRA: festas, almoços, churrasco, praias, amigos, futebol, descanso…
Se perguntarmos a quem TRABALHA, se você ganhar um grande prêmio na loteria, qual a sua primeira decisão? Certamente ele responderá: “sumir, nunca mais eu passo nem na porta do meu TRABALHO”.
No entanto, se perguntarmos a quem BRINCA, quer dizer, quem faz o que gosta, como os artistas, por exemplo, eles responderiam “minha vida em nada mudará, pois à noite estarei no palco, como sempre”.
Já perceberam que os verdadeiros BRINCALHÕES não se aposentam? Aposentadoria é mais um prêmio pelo suplício de uma vida sacrificada pelo TRABALHO. Quem BRINCA, no entanto, não pára, só porque atingiu a idade de aposentação. Procurem lembrar: Chico Anísio, Renato Aragão, Fernanda Montenegro, Paulo José, todos, por doenças e idade, já poderiam estar aposentados; mas estão em plena atividade. Lembram a Dercy Gonçalves? É outro construtivo exemplo. Não se aposentam porque amam o que fazem. Não TRABALHAM, BRINCAM.
Se TRABALHO é punição e se BRINCADEIRA é prêmio; se a pessoa está na idade e tem oportunidade para escolher uma profissão, nada melhor do que fazer aquilo que num futuro não represente um SACRIFÍCIO e sim um PRAZER; pois, repito, quem faz o que gosta não TRABALHA, BRINCA.
Os cursos que fazemos as preparações por que passamos durante a vida, são formas de adquirirmos SABERES para que exerçamos, com eficiência, alguma atividade.
Quer dizer que aquilo que aprendemos, são, na verdade, “FERRAMENTAS” que nos habilitam ao exercício de uma profissão.
É nesse ponto que somos forçados a concordar com a afirmativa do mestre Rubem Alves, quando, citando Nietsche, disse: “o homem para ser feliz, só necessita de duas coisas: FERRAMENTAS e BRINQUEDOS”.
FERRAMENTA é aquele instrumento que usamos para realizar uma tarefa, a exemplo de uma chave de fendas para apertar um parafuso, um alicate para cortar ou segurar uma peça, um martelo para bater um prego, um serrote para serrar uma madeira, etc.
E, onde guardamos as nossas ferramentas? Normalmente dentro de uma caixa: a tão conhecida “caixa de ferramentas”.
Na informática, também esse conceito de ferramenta é por demais conhecido. Quando se abre a tela, lá está, na primeira barra do computador a tal “caixa de ferramentas”, ali denominada apenas de “ferramentas”.
Em qualquer atividade exercida, se faz necessário o uso de ferramentas. Nas nossas profissões não é diferente. Então o que são as nossas ferramentas profissionais? Os SABERES que aprendemos para bem realizar aquele ofício. E, onde guardamos estes SABERES? Quer dizer essas ferramentas? Na nossa “caixa de ferramentas” também conhecida como cérebro, memória, ou qualquer outra denominação que queiramos dar.
Por exemplo: o pedreiro pode, até consertar um computador, desde que ele tenha na sua “caixa de ferramentas” aquele conhecimento, quer dizer, aqueles SABERES, aquelas ferramentas, que se prestem para tal. Como nunca se pode usar o prumo ou uma desempoladeira para abrir uma máquina, também não se usam as suas Ferramentas Intelectuais de pedreiro para consertar um computador.
Mas, se por acaso, estiver entre os seus instrumentos de trabalho uma chave de fendas, já é possível realizar o serviço de abrir o computador.
Porém, para efetivar o reparo, se faz necessário que ele saiba fazer, quer dizer, que ele possua, também, no seu cérebro, ou melhor, na sua “caixa de ferramentas intelectual”, os conhecimentos de informática, que são os seus SABERES, ou seja, as suas ferramentas.
Peço sua especial atenção para o raciocínio a seguir, imaginemos que você seja um pedreiro e uma pessoa lhe diga: gostaria de construir uma casa, mas antes preciso saber de que o senhor necessita para iniciarmos a obra. Como bom profissional, você procura na sua “caixa de ferramentas” e diz de pronto: preciso de blocos, areia, ferro, cimento, picareta, pá, lavanca, carrinho de mão etc… Por que você enumera tão bem todas aquelas “ferramentas”? Porque lá na sua memória, no seu cérebro, ou seja, lá na sua “caixa de ferramentas intelectual” elas estão todas armazenadas. Você tem aquelas ferramentas, aqueles SABERES guardados. Então as conhece e com facilidade enumera o que se faz necessário para construção daquela obra encomendada
Porém, se aquela mesma pessoa lhe pedir que prepare uma feijoada, provavelmente você terá dificuldades, pois vai procurar na sua memória, na sua “caixa de ferramentas intelectual” aqueles SABERES relativos a uma feijoada e possivelmente não vai encontrar, pois você é um pedreiro e não um cozinheiro: aquelas ferramentas não existem na sua caixa de ferramentas.
A você que teve a paciência e a boa vontade de chegar até aqui, eu agradeço e digo: fiz toda essa digressão para deixar claro que SABERES são ferramentas e que quem faz o que gosta não TRABALHA, BRINCA.
Portanto, complementando a resposta que dei naquela época àqueles que estavam no momento de decidir, repito: faça aquilo que mais lhe agrade. Não queira TRABALHAR, escolha BRINCAR e ganhar com isso. FELIZ ESCOLHA