TRÓIA – (O Presente de Grego e o Calcanhar-de-Aquiles)

A imaginação que na Antiguidade deu vida a deuses, reis e personagens, atravessa o tempo sem perder o fascínio das narrativas. Homero, um antigo que viveu entre os séculos XIX e XVIII antes de Cristo, escreveu suas epopéias tomando como fonte a oralidade, reconstituindo épocas e fatos supostamente passados entre os anos 1200 e 1100 a.C. A Ilíada, de Ilos, cidade que mais tarde recebeu o nome de Tróia, narra o cerco de dez anos, feito pelos gregos contra as muralhas até então inexpugnáveis da capital de Troada; e a Odisséia, de Odisseus (Ulisses), tem seu enredo depois da queda de Tróia. Mitologia e literatura se fundem na obra do poeta, como se fossem ingredientes de um padrão coletivo de valores, éticos e estéticos, que devesse estar nas epopéias. Homero foi, talvez, o melhor modelo de escritor da Antiguidade, considerado por Platão como “O Educador da Grécia”. O cinema, que tantas vezes revisitou o passado, revivendo episódios da história humana, toma Tróia como cenário e recria com as técnicas da computação gráfica os embates que deram glória e fama a Aquiles, Menelau, Agamenom, Helena, Páris, Heitor, Briseida e Príamo, dentre muitos outros que compõem o núcleo das contendas. O resultado é um filme fiel ao tema central da Ilíada, – a guerra de Tróia -, rico em ação, repleto de efeitos especiais, correto como linguagem artística, capaz de arrebatar entusiasmos. A trama é simples: Páris, príncipe de Tróia, conquista Helena, mulher de Menelau, e conta com seu irmão Heitor, para levá-la a Tróia.Agamenom, irmão de Menelau, consegue reunir diversos reis da Grécia para cercar Tróia e recuperar Helena. Centenas de embarcações e milhares de soldados ameaçam Tróia, onde o rei Príamo toma as suas decisões ouvindo o filho Heitor, o sacerdote e o chefe das armas. Aquiles, o invulnerável guerreiro grego também foi à guerra, pelo prazer de lutar e pela busca dos louros da vitória. Nos primeiros anos da guerra os troianos vencem os gregos, principalmente porque Aquiles, ofendido por Agamenom que roubou Briseida, retirou-se do campo de batalha e desmobilizou seus soldados. Seu primo e amigo Pótocles, com sua armadura e suas armas, foi ao combate e morreu nas mãos de Heitor. O fato provocou a chamada “cólera” de Aquiles, que desafiou e matou Heitor, amarrando o corpo no seu carro para exibi-lo como troféu em redor do palácio de Tróia. A morte de Heitor muda a guerra. O velho rei Príamo vai a tenda de Aquiles e pede o corpo do filho para realizar os solenes funerais. Diante de Aquiles, o rei falou com o coração: “Passei por coisas que nenhum outro mortal na terra passou; beijo as mãos do homem que matou meus filhos”. O rito funeral levava doze dias e Aquiles prometeu trégua a Priamo, pelo tempo das exéquias. Quando a guerra já contava dez anos, os gregos construíram um cavalo de madeira e deixaram-no nas proximidades do portão de Tróia, cheio de soldados. Surpresos, os troianos atribuíram aos deuses, especialmente a Apolo, aquele grande e inusitado presente que fazia lembrar Pégaso. Utilizando de tal estratégia, os gregos penetraram em Tróia e dominaram a bela cidade, incendiando-a completamente, sob o comando de Agamenom. Para os gregos não bastava levar de volta Helena, honrando o marido Melenau, tomar Tróia era a maior façanha guerreira. Apaixonado, Aquiles procura Briseida no palácio troiano até encontrá-la e ser morto por Páris, depois de ser atingido na única parte vulnerável do seu corpo, o calcanhar. (A lenda, que Homero não conhecia, dizia que Thetis, mãe de Aquiles, para torná-lo invulnerável, mergulhou o corpo do filho no rio Etígio – que rodeava sete vezes o inferno -, segurando-o pelo calcanhar). Duas expressões: Presente de Grego e Calcanhar – de – Aquiles, passaram a integrar o repertório da cultura popular brasileira, como mais uma herança da Antiguidade. Presente de Grego é algo indesejado, uma falsidade. Cavalo de Tróia passou a ser sinônimo de traição por meio de infiltração. E Calcanhar – de – Aquiles indica o ponto vulnerável, o lado fraco de qualquer indivíduo (físico, moral, emocional, intelectual) ou instituição. A sobrevivência, pelo uso, de tais expressões, nascidas no contexto dos temas homéricos, fascina tanto quanto as próprias narrativas. As epopéias antigas, conotadas pela imaginação, ganharam lugar na história literária dos povos, desde a Grécia, até que Camões tomasse os feitos dos mareantes portugueses na descoberta de uma nova geografia universal, como ação digna da poematização. Depois de Camões poetas de várias partes do mundo têm voltado, assiduamente, aos temas das viagens e aventuras, produzindo uma literatura de referência e de qualidade. Em Sergipe dois poetas têm os mitos e lendas da Antiguidade como temas das suas artes: Santo Souza, com sua aventura órfica, e Wagner Ribeiro, aedo do Mar Egeu. Ainda hoje Tróia simboliza a beleza, a glória, a harmonia, a coragem, a resistência, a prudência, a sabedoria, como se viu, em síntese, no filme dirigido por Wolfgang Petersen. O cinema, como a arte das artes, tem o poder de recriar o mundo e a vida, eletrizando as platéias com imagens e sons fortes, atemporais, como linguagem universal dos povos. Revisitar Tróia para a arte é como remexer no passado mais longínqüo, como o fez o alemão Schliemann, em 1871, para localizar os restos da velha cidade. Ele encontrou quatro cidades sobrepostas a uma profundidade de 16 metros. Na terceira encontrou vestígios de um grande incêndio. Mais tarde, nas mesmas pegadas do arqueólogo, Doerpfeld procurou as ruínas de Tróia, construindo um novo conhecimento que tinha como objetivo comprovar a existência física e histórica do reino de Príamo. Tróia, o filme, torna maior a crença na existência de Tróia, a cidade, e dos personagens que a dirigiam, bem como dos confrontos e enfrentamentos que reuniram, no mesmo lugar, figuras que se tornaram para a história e para a literatura heróis e mitos. Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”

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