Um homem exemplar

José da Silva Ribeiro Filho
Neste ano findante de 2007, Sergipe perdeu a oportunidade de reler a sua história e de atualizar as novas gerações com um conhecimento próximo, em vários campos da atividade cultural. Vários centenários marcaram 2007, fazendo supor a atenção que as figuras dos aniversariantes, por muitos títulos ilustres, desfilariam com suas obras e fortunas críticas. Afinal, não é sempre que Severiano Cardoso, professor e escritor de vasta obra literária e pedagógica, Francisco Leite Neto, político que marcou toda uma geração, João Bosco de Andrade Lima, magistrado, que presidiu o Tribunal de Justiça do Estado, Enoch Santiago, poeta, crítico, professor e também magistrado, e José da Silva Ribeiro Filho, poeta, administrador público, professor, magistrado da Justiça do Trabalho, autor do livro A estrela e a flor, editado ao fim da vida, como um canto de despedida, de sotaque íntimo e sentimental, que embora prenda o poema como um rasgo da universalidade humana, faz das palavras um sussuro, ao alcance de qualquer ouvido, como a água na paráfrase de José Sampaio.

José da Silva Ribeiro Filho nasceu em Aracaju, na rua de Japaratuba (atual João Pessoa) em 15 de janeiro de 1907, e morreu em Aracaju, em 10 de setembro de 1976, poucos dias depois de receber, no leito de dor e de sofrimento, seus amigos e admiradores, de todas as idades. Viveu exemplarmente. Filho do coronel José da Silva Ribeiro, rico comerciante e mecenas da literatura, conviveu desde muito jovem com a atmosfera de homens de letras, no jornalismo, no magistério e nas obras publicadas, reunidos sob a égide da Hora Literária. Quando a entidade mudou para o bairro Santo Antonio, ele mudou com ela, sem perder o contato direto com os seus integrantes, salvo quando foi estudar Direito na Bahia, morando na Pensão de Alexandre Freifer, onde convivia com outros sergipanos, atraídos pelos fascínios das ruas e das noites de Salvador.

Professor de Direito, e Diretor da Faculdade de Sergipe, José da Silva Ribeiro Filho deixou seu nome destacado na relação dos grandes mestres, que honraram a tradição tobiática e ensinaram, mais que a doutrina, como um acervo comum, levaram às salas de aula a reflexão, na busca de renovar, no cotidiano dinâmico da sociedade, a cidadania, como um objetivo permanente, que é mesmo a representação da luta pelo Direito, no sábio enunciado de Jhering, propagado por Tobias Barreto e pela Escola do Recife. Na Justiça do Trabalho, o juiz reto, ilustrado, admirado por todos, soube cumprir um longo percurso do seu ofício, harmonizando-se com atividades outras, públicas, e com o engajamento, já antigo, com as causas da vida ilustrada de Sergipe.

José da Silva Ribeiro Filho entrou para a Academia Sergipana de Letras, sucedânea da Hora Literária, como um filho pródigo, que volta para casa, no dizer do padre Carlos Camélio Costa, seu velho amigo, que o recebeu dizendo “Benvindo o filho que volta à casa paterna”, aludindo a seu pai, José da Silva Ribeiro, ainda hoje Patrono da ASL. Ocupou, com todos os méritos,  próprios, a Cadeira 11, cujo Patrono era Francisco Antonio de Carvalho Lima Júnior, um dos grandes esquecidos da cultura sergipana, e que teve como último ocupante Luiz José da Costa filho, outro polígrafo sobre quem pouco ou quase nada se fala. O discurso de José da Silva Ribeiro Filho é um peça da mais alta qualidade literária, entranhada com a essência humanística que marcou gerações em todo o mundo, própria para ser recitada numa entrada acadêmica, em si consagradora, e para ele da mais inteira justiça. Parecia, naquele instante solene e elevado, que a voz que alçava o discurso aos ouvidos atentos, não era do filho do coronel José da Silva Ribeiro, não era do menino que aprendeu a admirar os escritores da Hora Literária, era, ele próprio, um poeta, um escritor, um pensador, com toda a responsabilidade de deixar nos anais daquela casa, tão familiar, a demonstração do seu talento, da sua aprendizagem, da sua formação, das suas idéias e reflexões.

O padre Carlos Camélio Costa, seu velho e querido amigo, falou pela Academia e destacou virtudes, singularidades, traços da biografia de José da Silva Ribeiro Filho, lendo alguns poemas, retirados de velhos álbuns femininos, ou das páginas dos jornais, nem todos aproveitados na seleção de A estrela e a flor, que volta ao circuito das leituras, em nova edição, graças ao acadêmico e notável poeta Wagner da Silva Ribeiro, expressão simbólica da continuidade intelectual da família, onde Marcelo e José, seus irmãos, andam pelas mesmas trilhas, com versos e estórias. José da Silva Ribeiro Filho entrou para a imortalidade das letras, e honrou sua Cadeira, seus Patrono e ocupante, com uma imagem doce, fraterna, ao mesmo tempo decidida, justa. Homem que sabia ouvir e dialogar, frustrou a muitos, quando como Secretário de Segurança Pública, em dias azíagos para a liberdade de muitos sergipanos, tomou as rédeas dos mais afoitos, restabeleceu direitos, distribuiu atestados, saneou, enfim, o arbítrio dominante naquela quadra triste. Orlando Dantas, entre o reparo e o elogio, costumava dizer que o perfil cordato, amável, civilizado do Dr. José da Silva Ribeiro Filho combinava mais com um nincho, do que com uma Secretaria de Segurança Pública, que era, quase sempre, uma máquina de truculência e intimidação.

Sergipe, para dizer o mais simples, deve muito à memória de José da Silva Ribeiro Filho.

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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