Amigos, na mensagem de Natal deste ano em vez de falar sobre o costumeiro e já esperado: “Feliz Natal e um próspero Ano Novo”, resolvi deixar uma reflexão sobre um assunto que, invariavelmente, nos afeta.
Em maior ou menor intensidade, ele permeia todas as famílias. Espero que entendam e, de coração, torço para que o caso aqui tratado não guarde nenhuma semelhança com eventos de suas vidas, pois trata-se da observação de variados episódios presenciados ou imaginados, que tentei juntar para tornar mais claro o aviso e, quem sabe, influenciar, se possível, numa mudança de comportamento. Trata-se de um monólogo desfiado por um pai a seu filho que, dormindo, provavelmente não o escuta. Eis o texto:
— Filho, permita-me adentrar seu quarto, você já descansa a sono solto, para se refazer desse atabalhoado dia que, tenho certeza, você gostaria muito que não tivesse existido. Como você sofreu desilusões hoje, hem, filho? Nem imagino o que você deve ter escrito em seu diário. Como deve ter doído em seu coraçãozinho as grosserias e indelicadezas que pratiquei desde que fui acordar você pela manhã. Ah… filho! Como eu gostaria de poder voltar no tempo e fazer tudo diferente! Não posso mais… Já fiz. Só me resta lamentar e pedir perdão. Como eu gostaria que não houvesse nenhum relato referente a esse dia em suas anotações, pois descobri, há poucos minutos, ter sido eu o responsável por todo seu sofrimento, por toda sua tristeza de hoje e em todos os outros dias em que, inexplicavelmente, o tratei tão mal. Ah, meu querido! Você não imagina como estou arrependido… E é exatamente por isso que estou aqui para lhe pedir perdão, não quero importunar você, filho. Quero apenas dizer da minha tristeza. Até parece que não conhecia nem fazia nenhum esforço para reconhecer e entender o maravilhoso filho que é você. Nunca havia passado pela minha cabeça que você seria uma criança e que nasceu bem depois de mim, por isso não conhece o que eu conheço. Mas eu insistia em fazer valer os valores que eu já conhecia há muito tempo, até mesmo antes de você nascer. Eu tentava, mas logicamente você não entendia o processo e, por isso, eu o fazia sofrer, mas acredite isso agora faz parte do passado, pois, numa ligeira reflexão, descobri o quanto eu estava errado, querendo que você entendesse o que sequer conhecia.
Hoje pela manhã o acordei aos berros de “Levanta preguiçoso, passas a noite vendo televisão e não acorda para ir à aula…”. E na hora do café, sagrada hora que eu deveria ter aproveitado para lhe dar um beijo e um abraço. Não fiz, ao contrário: ralhei com você por ter tomado café rápido demais e por não ter querido a fruta que sua mãe lhe ofereceu. Reclamei, porque você não se arrumou rápido, aleguei que não poderia me atrasar para o trabalho e emendei: “Se eu não chegar na hora e perder o emprego, você será o culpado, viu? Culpado! Foi essa a primeira sentença que prolatei hoje para você logo pela manhã. Além, é lógico, do grito de: “Acorda, preguiçoso!
Julguei, sentenciei e condenei, sem lhe dar uma única chance de defesa ou explicação… Que maneira, hem, filhinho? Que forma errada de um pai desejar ao filho um bom dia! Triste mesmo é iniciar um dia assim. Que maneira grosseira de te dizer bom-dia? Meu Deus, como o feri, filho querido. Culpado… Culpado de quê você seria? “O que fez de tão mal para ser condenado logo pela manhã?” E o dia apenas começava. A sucessão de crueldades tinha apenas iniciado, você ainda não estava livre das truculências que certamente viriam, afinal era comigo que você iria para a escola e dela voltaria ao meio dia.
É…, definitivamente, percebo agora que não o poupei… Reclamação, admoestação, indelicadeza, incompreensão…
“Limpa os pés para entrar no carro. Cuidado para sua lancheira não vazar no assento. Endireite sua coluna. Não carregue os livros numa mão só, ande ereto, obedeça às tias. Não me arranje problemas. Preste atenção às aulas. Só coma seu lanche na hora do recreio. Não tome refrigerante, não coma fritura, não, não, não, não…” Não pude sair na hora para pegá-lo ao meio dia, atrasei na volta, cheguei quase uma hora depois, você, faminto e cansado, estava sozinho, todos os outros alunos já tinham ido embora. Só você e o vigia da escola estavam a me esperar. Pedi desculpa pelo atraso? Não. Apenas balbuciei que fiquei preso na repartição com um compromisso de última hora. Você, triste e quase chorando, perguntou:
— Por que demorou tanto, pai?
Qual foi a minha resposta?
— Tentando ganhar o dinheiro para pagar seu colégio, sou empregado, sabia? Devo obedecer ao chefe, não deu para sair mais cedo. Você calado ficou. Não percebi ainda o quanto estava sendo mal com você. Mas vi uma lágrima rolar em seu rosto…
Nem sua lágrima comoveu o meu ímpeto perverso. É, filho querido, realmente esse não foi o seu dia de sorte. Por que exatamente hoje você tinha de trazer o maldito boletim, para o ‘ciente de seus pais’? Exigência infeliz desse sistema de Educação cheio de cobranças.
E, você, como eu, não é muito bom em Matemática… Foi a gota-d’água. Sua mãe não queria que eu visse o bendito boletim. Você já tinha se recolhido em seu quarto, pois sabia que, se acaso eu soubesse daquela nota vermelha a bronca seria feia. Não adiantou, sua mãe foi obrigada a mostrar-me. Determinação minha:
— Não esconda as notas de mim. — Adverti.
Você nem almoçou direito. Correu para seu quarto e trancou a porta, refugiando-se no único canto do mundo, onde acreditava estar protegido de seu algoz. Você sabia que quando eu visse aquela “nota vermelha” não ia gostar, sequer consideraria as boas notas auferidas em outras matérias; todas acima de oito, porém dirigiria todo o meu olhar para aquela nota de Matemática. E ia mesmo era querer explicações, dizendo:
— Coloco-o no melhor dos colégios, gasto tanto dinheiro com você. E você que só tem de estudar ainda me tira uma nota dessas?! O que você está esperando da vida, hem? Me responda, seu moleque, por que você não estudou? Por que, por que e por quê?
Hoje, alegando doença não quis ir à aula de Inglês. Foi sua mãe que veio me avisar: — Ele não está bem, não pode ir à aula.
— Manhoso, é isso que ele é. — Respondi e saí resmungando.
Meu Deus, que absurdo! O que está acontecendo comigo? O que estou fazendo com o meu filho? O meu filho se escondendo de mim…
Percebo agora como estava errado, e acredite: tudo farei, filho amado, para mudar o meu jeito de conduzir as situações da vida. E ao mudar devo corrigir o rumo de nossas vidas para que possamos conviver como verdadeiros pai e filho. Sigamos em frente e, de fato, teremos a possibilidade de vivenciar o ano que se inicia de modo feliz.
Bom natal e feliz 2011, filho querido.