Humor – Paulo Lobo
Cartas do Apolônio
ZENOBISMOS À PARTE
Lisboa, 1 de outubro de 2004
Caros amigos de Sergipe:
Essa vida de fidalgo português me cansa. São solenidades, compromissos sociais de toda ordem e telefonemas, em sua maioria trotes, de gente ávida por ouvir apenas a voz deste colunista pronunciando um lacônico ‘alô’. O tédio se abateu sobre mim.
Ainda mais agora que a Zenóbia resolveu lançar o seu segundo livro, que se chamará “Lírica de Um Universo em Convulsão”.
Título aliás, que – diga-se de passagem – sobrou das várias opções zenobianas para titular o seu primeiro crime literário que acabou se chamando mesmo “Devaneios em Gotas Poéticas”.
Parece coisa do Ledhinaldo Almeida, não? Mas pasmem os senhores, é bem pior. Este livro sim, será a suprema humilhação dos Lisboa de Sant’anna e o fim da minha longa amizade com o Zé Saramago, com quem religiosamente jogo biriba toda semana..
Para quem não teve a coragem de ler sua primeira obra, aí vai um trecho:
“Que fazer nesta tarde outonal/ Recorrer ao abscôndito labirinto dos instintos ou pedalar a esmo pela praça? Onde estão os sonhos que sonhei? Em que gavetas do tempo os esqueci?” Na geveta da casa do Carvalho sem a menor dúvida!
Por falar em Zenóbia, esta semana a beletrista finalmente concluiu a sua pós graduação em psicanálise clínica. E para comemorar a efeméride, a turma organizou grande festa. Horrorosa naturalmente.
A colega zenobiana Patrícia d’ Alem Tejo, teve a infeliz idéia de sugerir uma festa temática em homenagem ao Brasil. Foi o suficiente!
O calor estava insuportável para os padrões portugueses, mas mesmo assim uma banda de pagodeiros fez todo mundo cair no samba, tocando músicas do Roberto Leal vertidas para o ritmo brazuca, imaginem os senhores que tragédia!
Velhos barrigudos suavam em bicas (calma, eu disse bicas!), metidos em ternos cheirando a naftalina. O vinho que serviram era uma afronta à nossa tradição vinícula. Fiquei a noite toda na água mineral.
Mesmo assim, Zenóbia se esbaldou até as quatro da manhã assediada por um portador da Sídrome de Down e por um anão do Grand Circus Birigui, que ainda está na cidade. Quem entende as mulheres?
À propósito, terminei com Shiley Katiane. Estava se intelectualizando demais. Imaginem os senhores que em apenas uma semana a rapariga devorou todas as setenta e duas páginas de uma edição pocket book de ‘O Pequeno Príncipe’. Tá certo que ela me confessou que não entendeu muito bem algumas frases, mas daí a também querer virar poeta, seria só uma questão de tempo. Por via das dúvidas, cortei o mal pela raiz.
De ‘poeta’ aqui em casa basta a beletrista sexagenária, afinal é como sempre vos digo: A poesia é como a Torre de Pizza, é por estar a ponto de vir abaixo que ela se imortaliza.
Até semana que vem.
Um abraço do
Apolônio Lisboa