Fim de semana no Sertão do Seridó

Você por acaso já ouviu falar numa pequena cidade chamada Cruzeta? Ela tem, segundo o prefeito Geraldo Alves, 8.246 habitantes (assim mesmo, precisos) e fica no alto sertão do Seridó, no Rio Grande do Norte. Mais 40 quilômetros ao sul e você atravessa a fronteira em direção a Paraíba. Se for em direção norte, são apenas 18 quilômetros para se encontrar com Acari, que funciona como uma espécie de quartel general da região.

Tanto Cruzeta quanto Acari não têm cinema, nem teatro. A população é carente de tudo e diverte-se na pracinha para onde convergem moças e rapazes da cidade que se paqueram timidamente. No meio do caminho entre Acari e Cruzeta tem – pois é, isso mesmo! – um motel chamado P. P. Motel. Quando passamos por ele, nas várias viagens entre uma e outra cidade, todos se perguntavam o que seria P. P. – e meio à memória logo que o publicitário Nazário Pimentel, décadas passadas, criou uma PPP. Neste caso, sabia-se que a sigla significava Pimentel Promoções Publicidade.

O leitor pode estar aí se perguntando: e o que eu tenho a ver com essa história de Cruzeta? Bom, eu também jamais imaginei em minha vida ir passar um final de semana entre Acari e Cruzeta. Mas, fui – e até por um bom motivo. Em Cruzeta, o Centro Experimental de Formação e Pesquisa Teatral, órgão da Fundação José Augusto (que faz às vezes de Secretaria de Cultura do Rio Grande do Norte) tornou realidade o Projeto de Integração de Atores do Nordeste.

Sob a direção do espanhol naturalizado brasileiro Moncho Rodriguez – que os sergipanos conhecem da primeira montagem de “Ópera do Milho” e que esteve recentemente aqui em Aracaju para uma oficina de teatro no Centro de Criatividade – estreava na praça principal de Cruzeta, a Praça de Eventos, o seu mais recente trabalho, “Ditirambos”, um projeto de integração de atores do Nordeste.

Foi uma festa para a cidade. Às 8 da noite em ponto, já não havia mais lugares a serem preenchidos na praça, a não ser aqueles reservados para os convidados da Fundação José Augusto. Lá estavam, por exemplo, secretários de Cultura da Paraíba, de Recife, o presidente da Fundação, além de jornalistas, equipes de televisão – e este escriba aqui.

Mais uma vez, Moncho realizou um belo trabalho. Algo como teatro de rua, mas a lembrar as tragédias gregas (pelo uso de máscaras cobrindo exageradamente o rosto dos artistas) e um pouco da alegria do circo – a banda da cidade vestida com cores berrantes como palhaços de uma farsa. No primeiro ato, não há diálogos, a mímica conta a história de uma jovem casada, cobiçada pelo padre que consegue mandar o maridão à guerra. No retorno, o jovem rapaz encontra um filho que ele tem certeza que não fabricou. O segundo ato é uma variação de ato de Natal, só que o texto foi baseado em literatura de cordel. Aqui, sim, já há diálogos, dispensam-se as máscaras, mas não a forte e vibrante música composta especialmente para o espetáculo e os painéis anunciando os momentos essenciais da ação.

A música consegue envolver a platéia de tal forma que, ao final, toda a platéia – e Moncho garante que toda a cidade – está entoando a melodia de encerramento. Se Moncho está feliz com o resultados, todos nós, na platéia, aplaudimos com entusiasmo o espetáculo.

Principalmente porque, além de um belo resultado plástico, Moncho conseguiu pôr no palco artistas de vários Estados do Nordeste. “Ditirambos” foi montado com a parceria com a Secretaria de Cultura e Turismo de Sergipe, Secretaria de Cultura da Paraíba, Secretaria de Cultura de Recife, Universidade Estadual de Mossoró (RGN) e Prefeitura de Cruzeta.

Para o espetáculo, Sergipe contribuiu com dois atores, aliás duas atrizes, ambas selecionadas pelo próprio Moncho durante a oficina realizada aqui. Diane Veloso já tinha realizado alguns espetáculos de rua, mas não se pode dizer exatamente que tenha uma larga experiência teatral. A Joelma Araújo tocou uma responsabilidade maior. Ela é a Teodora, a personagem principal do primeiro segmento e tem participação especial no segundo momento. São dela também as máscaras que dão um colorido especial ao “Ditirambos”. Em Natal, durante os ensaios, Joelma deu uma oficina desta sua especialidade e o que parecia problemático virou coisa fácil: as máscaras são, realmente, expressivas.

Os demais do elenco – os sete restantes – vieram da Paraíba, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, numa integração especialmente curiosa e, diríamos mesmo, feliz.

Moncho diz que prefere levar este espetáculo, “Ditirambos”, para cidades pequenas, aquelas que são carentes destas coisas. Mas, se fizer tournées pelos Estados nordestinos interessados, não quer se separar da bandinha do maestro Bem-Bem, um senhor dos seus 40 anos, que forjou em Cruzeta a instalação de uma Escolinha de Música que é um primor de idealismo. A gurizada da cidade começa cedo a tocar os instrumentos que lhe interessa. É quase impossível pensar numa montagem de “Ditirambos” sem a Filarmônica 24 de Outubro da cidade de Cruzeta.

E aí, senhores prefeitos, vamos fazer uma parceria entre meia dúzia de prefeitura, para mostrar um “Ditirambos” de linguagem exatamente nordestina?

   

 

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