Perito independente atesta que delegado Ademir teve morte encomendada

Momento da reprodução simulada da cena do crime realizada pela SSP na presença do réu (Foto: Arquivo Portal Infonet)

Um novo laudo, produzido por um perito criminal independente, será anexado ao processo judicial relativo à morte do delegado Ademir Melo, morto a tiros no dia 18 de junho de 2016 no bairro Luzia em Aracaju. O chileno Eduardo Llanos, especialista em inteligência policial e análise de local de crime, foi contratado pelos pais da vítima há cerca de dois anos e concluiu o trabalho há aproximadamente duas semanas. Ele assegura que o laudo que produziu traz provas contundentes, demonstrando que a morte de Ademir Melo foi encomendada.

Eduardo Llanos anexará novos documentos ao processo (Foto: Arquivo Pessoal)

E, com base nesta versão, o advogado Guilherme Henrique da Silva, que atua como assistente de acusação também contratado pelos pais de Ademir Melo, tem a convicção que o crime tem envolvimento de várias pessoas. Para Gustavo Henrique, a morte do delegado teria sido articulada por pessoas próximas que conheciam a rotina do delegado. Mas ele não forneceu detalhes sobre os suspeitos nem sobre a motivação, sem também descartar a possibilidade do assassinato estar associado à atuação profissional de Ademir Melo.

Entre as provas que atestam a versão do crime de mando, o perito Eduardo Llanos destaca o depoimento de uma das testemunhas que assegura ter ouvido o autor dos disparos da arma de fogo ter chamado a atenção da vítima, chamando-a pelo nome: ‘doutor Ademir’. O perito também aponta a existência de uma testemunha que descarta semelhanças entre a pessoa vista no local, no dia do crime, e que teria disparado a arma e o acusado Anderson Souza Santos, que permanece preso apontado como autor do disparo da arma que tirou a vida do delegado.

Francisco Carlos e Gustavo Henrique pedem nova reprodução simulada (Foto: Arquivo Pessoal)

Além destes detalhes, o perito aponta diferenças entre a motocicleta vista na região pilotada pelo criminoso e a moto que a polícia civil apresentou, durante a investigação realizada pela Secretaria de Estado da Segurança Pública, como o veículo usado por Anderson para cometer o roubo contra o delegado. E assegura que pessoas o viram parado na região, supostamente esperando o delegado, por um período de aproximadamente 2 horas. “Por que uma pessoa esperaria uma vítima por duas horas para fazer um roubo?”, questiona o perito, narrando que outras potenciais vítimas de assalto passaram pelo local, no momento em que o criminoso se encontrava na região, com celulares e bolsas expostas, que seriam presas fáceis de assaltantes. E que, mesmo nessas condições, não foram importunadas pelo criminoso que teria se posicionado no local, aguardando o momento para, supostamente, matar o delegado.

O perito também contesta a versão de legítima defesa apresentada pelo próprio Anderson Souza, que figura como réu naquele processo judicial e garante que o delegado não apontou a arma contra o agressor. “O delegado não teve tempo de sacar a arma”, diz. “Ele caiu no gramado e a arma dele estava nas costas, travada”, oberva. O perito garante que o criminoso permaneceu na cena do crime após atingir o delegado, como forma de garantir que tinha efetivamente matado a vítima. “O indivíduo ficou no local por 10 segundos para ver a reação dele [do delegado] e, quanto viu que o objetivo foi cumprido, foi embora”, conta.

Na ótica do perito, não tinha como o criminoso perceber que o delegado estaria portando uma arma. Ele explica que a motocicleta ocupada pelo criminoso estava à frente do delegado e que a arma da vítima estava presa nas costas. “Não tinha como ele ter visto a arma do delegado. Ele caiu e a arma estava nas costas travada”, repete, argumentando que nenhuma autoridade policial em circunstância semelhante sacaria e apontaria uma arma travada contra o agressor.

O promotor de justiça Rogério Ferreira, logo que começou a atuar junto ao processo criminal, identificou inconsistências nas investigações da Polícia Civil e considerou que o inquérito policial teria sido encaminhado incompleto à justiça.

Motivação desconhecida

O perito não entra no mérito da motivação do crime, mas não tem dúvida de que o autor dos disparos da arma de fogo que atingiram o delegado da Polícia Civil de Sergipe conhecia a rotina de Ademir Melo. Segundo o perito, o criminoso aguardou o delegado por um longo período, cerca de duas horas, parado ao lado de uma motocicleta que ficou estacionada, nesse período, nas proximidades da residência do delegado. “Se foi ele [Anderson, o autor do disparo], foi contratado para matar o delegado”, assegura o perito.

Llanos garante possuir provas incontestáveis que induzem à hipótese de crime de mando, derrubando por completo a tese do crime de latrocínio [matar para roubar] apresentada pela Secretaria de Estado da Segurança Pública ao final da investigação. Novos documentos com essas provas apontadas pelo perito deverão ser anexadas aos autos, mas em um momento oportuno.

O perito não estabelece data para apresentar o laudo ao Poder Judiciário, justificando que qualquer informação nesse sentido poderia atrapalhar o curso do processo, que continua tramitando na 5a Vara Criminal de Aracaju, em segredo de justiça. Ele acredita que, analisando os novos documentos, o próprio Ministério Público e o juiz que conduz o processo solicitarão novas diligências. “Obrigatoriamente por lei, o Ministério Público e a justiça precisam determinar novas diligências. Se não forem solicitadas, há conivência”, insinua.

Acusação e as divergentes versões

Nesse processo, três advogados estão atuando como assistentes de acusação, além do profissional para atuar na defesa do réu, acusado pelo disparto da arma de fogo que matou Ademir Melo. Atuam na acusação os advogados Gustavo Henrique da Silva e Francisco Carlos da Silva, contratados pelos pais de Ademir Melo, e ainda Alonso Campos Filho, que defende os interesses da viúva de Ademir Melo. Apesar de estarem atuando com o intuito de desvendar o crime e punir os culpados, as teses são antagônicas.

Alonso Campos não tem dúvida de que a investigação policial concluiu de forma correta o inquérito policial que indiciou Anderson Santos Souza pelo crime de latrocínio. Ele diz que o acusado já tinha o costume de roubar celulares naquela região, onde ocorreu o assassinato do delegado Ademir Melo, e que já está condenado a cerca de 40 anos de prisão, em diferentes processos judiciais, por práticas idênticas: roubos. “Mesmo sendo revogada a prisão preventiva, ele [Anderson] não sairia da prisão”, diz.

O advogado diz que o Ministério Público o denunciou por homicídio, sem apontar motivação, embora tenha desprezado a versão do latrocínio. Mas estranha o empenho dos pais de Ademir em permanecer contestando os autos. E garante que há testemunhas no processo que viram o delegado com arma em punho, assim como o agressor, na cena do crime. “Absolutamente, uma testemunha que passava de carro na hora, viu um empunhando a arma para o outro”, comenta, contestando a versão do perito.

Alonso diz desconhecer esse outro laudo produzido que será apresentado pelo perito chileno e assegura que não há como se manifestar contra a tese do latrocínio devido à consistência das provas apresentadas durante a investigação policial.

Reprodução simulada

Por outro lado, o advogado Gustavo Henrique acata a tese do perito chileno, critica a condução dos trabalhos realizados pela Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP) durante a reprodução simulada no local do crime e diz que o réu, durante a reprodução simulada, apenas se comportou atendendo as orientações que eram transmitidas pelos investigadores que participaram daquele procedimento. Para o advogado Gustavo Henrique, a SSP agiu de forma proposital para não elucidar esse crime. “Quem tinha que dizer como agiu era o réu naquela reprodução simulada”, diz Gustavo Henrique.

Nas alegações finais, os advogados Gustavo Henrique e Francisco Carlos solicitaram novas diligências, inclusive a realização de uma outra reprodução simulada. “Todas as testemunhas quando questionadas sobre a reprodução simulada disseram ‘não foi assim que o fato ocorreu’. Não houve uma reprodução simulada”, comentou.

Os advogados continuam cobrando da SSP a apresentação na íntegra das imagens capturadas pelas câmeras do circuito de segurança dos prédios existentes na região onde o crime aconteceu, assegurando que a Polícia Civil fez a edição daquelas imagens de forma a comprometer a própria investigação. O advogado Gustavo Henrique explica que não fornece mais detalhes para preservar os procedimentos que continuam em tramitação na 5a Vara Criminal e observa que, estranhamente, nos autos constam o envolvimento de uma prima do réu, beneficiada com uma recompensa para ajudar a localizar Anderson Souza durante a investigação policial.

Procurada pelo Portal Infonet, a assessoria de imprensa informou que a Secretaria de Estado da Segurança Pública não se manifestará a respeito do novo laudo que será anexado ao processo judicial. A assessoria de imprensa informa que o inquérito policial foi concluído há cinco anos, que não tem qualquer dúvida sobre o indiciamento do acusado por crime de latrocínio e classifica como legítimo o direito às partes de travar novos debates dentro da ação penal.

 

por Cassia Santana

 

 

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