No próximo dia 5 de fevereiro, a Fundação Projeto TAMAR, que tem o patrocínio oficial da Petrobras, realiza o evento virtual “Madrugada Iluminada”, quando artistas baianos, além do pernambucano Lenine, exploram diferentes linguagens artísticas para falar sobre os acontecimentos que precederam o nascimento do projeto, história nunca antes contada e que agora ganha uma noite especialmente para marcar esse registro. A transmissão será pelo canal da Fundação Projeto TAMAR no YouTube, às 19 horas, diretamente do Espaço Cultural no Centro de Visitantes do Projeto TAMAR na Praia do Forte.
A apresentação será uma mescla de música, poesia, história e mostra audiovisual, com a participação de nomes como Lenine, Ana Mametto, Yacoce Simões, Taís Nader, além de artistas da região, como Better Togheter, Edno Sá e Fredy Oliver. A banda base conta com os músicos Allan Amaral na bateria, André Santana no teclado, Márcio Pereira na guitarra e Luciano Calanzas, que assume o contrabaixo e também a direção musical do espetáculo. Lenine, fará participação remota, do Rio de Janeiro.
Como tudo começou – Poucas pessoas sabem, mas antes de o Projeto TAMAR nascer, o propósito de salvamento de tartarugas rendeu aventuras desafiadoras e conquistas valiosas, como a criação da Reserva Biológica do Atol das Rocas em 1979. Tudo teve início a partir da dedicação e espírito aventureiro de um grupo liderado por estudantes universitários de Oceanologia da Universidade Federal de Rio Grande (FURG), Rio Grande do Sul, que, após primeira expedição no verão de 1975 para Fernando de Noronha, viajou com destino ao Atol das Rocas, no litoral do Rio Grande do Norte, no verão de 1977, para coleta de moluscos com fins de coleção científica.
Era início de fevereiro de 1977 e os dias eram exaustivamente dedicados à coleta de mexilhões, e caracóis de forma cientificamente correta. Por algumas manhãs, passaram a notar, ao acordarem, que havia areia por cima dos pertences e uma certa bagunça no acampamento, sem jamais imaginar que visitantes marinhas passavam por ali. Numa madrugada de lua cheia, no entanto, aconteceu o inesperado. Em meio a uma sinfonia de aves num volume maior que o normal, o grupo despertou com o grito de uma das colegas da expedição, pedindo ajuda, pois um massacre estava acontecendo na praia. Onze tartarugas viradas de barriga para cima estavam sendo abatidas por pescadores que compunham a tripulação contratada pela expedição.
“Foi uma cena chocante para nós, jovens estudantes, que vimos aqueles animais imensos e magníficos totalmente indefesos no momento mais frágil do seu ciclo de vida: a desova”, conta Guy Marcovaldi, diretor e um dos fundadores do Projeto TAMAR. Ele lembra que se sucedeu um momento delicado de conversa com os pescadores, o que garantiu que pelo menos sete tartarugas retornassem ao mar a salvo. As demais já estavam feridas, sendo que uma entrou no mar sangrando, mas ainda com vitalidade.
O salvamento das sete tartarugas marinhas naquela “madrugada iluminada” de 5 de fevereiro de 1977 fez surgir uma nova missão: proteger o Atol das Rocas, suas tartarugas e todos os animais lá existentes. Esse era o objetivo dos estudantes quando, de volta ao continente, com slides, projetor e fotografias em mãos, aproveitavam qualquer oportunidade para contar sobre a aventura e descobertas que tinham marcado a vida de cada um.
“Foi quando surgiu a ideia de escrever uma carta formal do Museu Oceanográfico – que integrava a FURG – para o Governo Federal, então Governo Geisel, contando tudo o que aconteceu”, comenta Guy. Dois anos depois, já no Governo Figueiredo, a Reserva Biológica do Atol das Rocas foi criada. Um feito do Departamento de Parques e Reservas Equivalentes do IBDF (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal), com apoio da diretora Maria Tereza Jorge Pádua, através da Divisão de Vidas Silvestres (DVIS). Para sorte das tartarugas e áreas de conservação marinha, DVIS havia ganhado a direção de Renato Petry Leal, antes diretor do Zoológico de Sapucaia (Porto Alegre), muito frequentado por estudantes de Oceanologia, incluindo o próprio grupo.
Posteriormente, foi criado o Orçamento da União para o Projeto Tartaruga Marinha em 5 de junho de 1979, tendo sido efetivado em meados de 1980. Anos depois, foi batizado com o nome de Projeto TAMAR que, em 1982, recebeu o patrocínio da Petrobras. Já em 1988, nasceu a Fundação Projeto TAMAR, que recebe esse importante patrocínio até os dias de hoje.
“Esse relato deixa claro que o Projeto TAMAR foi fecundado no idealismo de estudantes de Oceanografia, num período precioso de gestação entre fevereiro de 1977 e maio de 1980. Foram anos férteis de incubação”, avalia Guy. No total,19 estudantes estiveram envolvidos nesta fase embrionária (ver foto e relação completa abaixo), estando até hoje à frente do projeto Guy Marcovaldi (Coordenador Nacional de Comunicação da Fundação Projeto Tamar), Neca Marcovaldi (Coordenadora Nacional de Conservação e Pesquisa da Fundação Projeto Tamar) e Nice Oliveira (Conselheira da Fundação Projeto Tamar).
Em 2021, o Projeto TAMAR completa 42 anos, com bases de pesquisa e atuação em seis estados brasileiros (PE, RN, SE, BA, ES, , SC) e um total de seis Centros de Visitantes, sendo eles o de Fernando de Noronha (PE), Oceanário de Aracaju (SE), Praia do Forte (BA), Vitória (ES), Ubatuba (SP), Florianópolis (SC), além do espaço Casa do Projeto TAMAR no Beto Carreiro World (Penha/SC).
Surpresa durante voo – Guy chama atenção para outro aspecto interessante. Antes da viagem em que salvaram as tartarugas, o grupo acreditava não existir atol no litoral brasileiro, até avistar com surpresa o Atol das Rocas num voo de carona em aeronave das Forças Armadas, quando os jovens tentavam, após estada na Bahia, chegar em Fernando de Noronha para sua primeira expedição. Para chegar à ilha, eles contaram com a ajuda de um comandante da Aeronáutica, que conheceram num camping em Itapuã, em Salvador (BA).
“Era 1975, e nós embarcamos no Hércules, chamado de Patinha das Forças Armadas. Logo depois da partida, o comandante avisou que desviariam um pouco a rota para sobrevoar o Atol das Rocas. O fato nos surpreendeu já que havíamos aprendido na faculdade que não havia atol no Atlântico Sul. Sem pestanejar, aproveitamos a oportunidade, fotografamos o que foi possível e decidimos naquele momento que organizaríamos uma futura expedição para lá”.
Outro fato impossível de esquecer aconteceu no caminho até o Atol das Rocas. Com bagagem e suprimentos para todo o tempo da expedição, o grupo alugou um barco para alcançarem o destino, até que um incêndio foi detectado na embarcação, decorrente do excesso de peso. “Perdemos equipamentos importantes, as barracas emprestadas pelo Exército foram as primeiras a serem queimadas, mas as chamas foram controladas, porém o incidente nos rendeu dois dias à deriva”, conta Guy. “A habilidade do mestre numa técnica chamada “navegação grega” permitiu retomar o destino. Na madrugada seguinte, avistamos a luz piscante do farol. Que alívio!”.
Em 5 de fevereiro de 2021, o grupo de estudantes que originou o Projeto TAMAR comemora 44 anos daquela “madrugada iluminada”, em que ajudaram a salvar a vida de sete tartarugas marinhas. Foram as primeiras tartarugas salvas de mais de 40 milhões que hoje o Projeto TAMAR contabiliza. Um dia para ficar na história.
Fonte: Projeto TAMAR
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