Sergipanos driblam preconceito por não ter namorado (a)

Leily Aglaene: "Homens não querem nada sério e agora deixo acontecer" (Fotos: divulgação)

Sergipanos estão enfrentando o preconceito e a cobrança por não estar namorando, apesar de serem bonitos, inteligentes e possuírem independência financeira. Para a maioria desses antes chamados “encalhados”, hoje “novas solteiras” e “homens sós”, é preciso ter jogo de cintura para lidar com as perguntas do tipo: por que não está namorando?, quando vai apresentar seu namorado (a) à família?, Quando vai casar? Você é homossexual? As respostas passam pela dificuldade em encontrar a alma gêmea devido à exigência na hora da escolha, pela opção em viver feliz sem uma pessoa ao lado ou até mesmo pela fobia do casamento, por conta da temida responsabilidade e do comprometimento.

Segundo o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 65,11% da população sergipana se declarou estar solteira. Isso vem fazendo com que mulheres e homens solitários sejam confundidos muitas vezes com homossexuais e classificados como heterofóbicos [termo usado para quando o normal é ser homossexual, e ser heterossexual é abominação].  Para a Psicologia, as exigências devem ser deixadas de lado quando o que está em jogo é a felicidade.

Rozendo Aragão: "Ser feliz é descobrir a graça de amar, mesmo estando solteiro"

Fazendo parte desse mundo das também chamadas “mulheres sem par”, está a auxiliar de enfermagem da Prefeitura Municipal de Aracaju, Leily Aglaene Santos. Ela tem 31 anos e só teve um relacionamento duradouro [dois anos] até agora. É bonita, independente, nunca foi casada, sabe se arrumar e se expressar, não perde uma festa, mas não consegue um namorado.

"Eu cheguei a um ponto que não vivo mais em busca de um relacionamento duradouro. Agora eu deixo acontecer. Me considero uma pessoa bonita, inteligente, tenho minha profissão e meu emprego, enfim, sou uma pessoa bem resolvida. Talvez até mesmo isso esteja contribuindo. Pelo que estou percebendo, os homens de hoje já não querem nada sério. Até chegam junto nas festas, mas não passam de ficantes. Por outro lado, eu também vou cultivando as minhas experiências e as dos outros, que não deram certo”, entende.

Lidiane Anjos:"Não se espera hoje do homem e da mulher o que se esperava antes

Leily Aglaene é mais uma das mulheres que escutam várias cobranças tanto de pessoas conhecidas, como da própria família. “Cobram demais. Vivem me perguntando: ‘Por que você não está namorando e realmente acham ser porque estou escolhendo demais. Mas não é. A sociedade sempre acha que nós é que estamos escolhendo muito. Eu não perco uma festa e não costumo ir aos mesmos lugares”, complementa.

Muitas adolescentes também estão vivendo esse novo momento. “Eu não quero aparecer para não virar motivo de piada na escola. Mas, tenho 16 anos, minhas amigas dizem que sou muito bonita. Tenho um corpo definido. No colégio, na academia e nas festas, percebo que os meninos estão me olhando, alguns se aproximam, mas a conversa não avança para um namoro. E olhe que tenho um papo bom”, destaca a estudante do ensino médio de uma escola da rede particular de ensino, Mirele Diniz [o nome é fictício à pedido da entrevistada].

“Homens sós”

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Os solteirões de antigamente, que se tornaram “homens sós” na sociedade atual também sofrem a pressão da sociedade. Principalmente eles. É que antes, o homem só ficava solteiro se escolhesse ser padre. Era importante casar cedo e ter filhos, prova da masculinidade. Agora, eles podem até não optar por relacionamentos sérios, podem até espalhar aos quatro cantos que escolheram viver assim e são felizes, mas que são cobrados são. Sem contar que deixam dúvidas quanto à sexualidade, por aparecerem nas festas sempre sozinhos ou acompanhados de amigos.

Muitos deles conseguem lidar com a solteirice tranquilamente e garantem estar felizes sim, até mais do que amigos casados, que se sentem sozinhos, mesmo acompanhados, isolados sob o mesmo teto, por diversas razões.  Outros acreditam mesmo na dificuldade de encontrar a alma gêmea e compartilhar gostos semelhantes. Nos dois casos, o mais difícil é provar aos que insistem em cobrar um relacionamento sério que estão conseguindo sobreviver, sem assumir um compromisso e a tão temida responsabilidade nos dias atuaís.  Há ainda os que têm medo do casamento com mulheres cada vez mais guerreiras e competitivas. 

Sem constrangimento

Para o jornalista Rozendo Aragão, 33, é interessante esta questão de ser cobrado por ser ou não casado. "Meus pais mesmo não cobram. Minha família em si também não, mas alguns parentes do interior vivem a perguntar se já sou casado. Eles ainda têm esta cultura de se não casar, 'ficar para titio ou virar padre'. Até mesmo já me perguntaram se eu seria religioso.  No meu caso não tem nada a ver. Já tive namoradas, foi bom o tempo de duração de cada relacionamento, mas não deu certo. Não me sinto constrangido se eu estiver só ao chegar o dia 12 de junho [namorados]. Não adianta estar fisicamente com alguém quando o coração não está perto também. Namorar ou ter um relacionamento como o casamento requer muito mais que beijos, abraços e carinho. Tem que ter respeito, compreensão, vivência, etc. Se o relacionamento ficar apenas no físico é igual a casa de areia: sem alicerce não fica muito tempo em pé. Sei que os relacionamentos evoluíram. Não é mais igual como antigamente, na época de nossos pais ou avós. Mas é preciso compromisso e responsabilidade para amar", acredita.

Indagado se está feliz sozinho, o jornalista não pensou para responder. "Se sou feliz? Sim, como sou feliz. Trabalho naquilo que gosto, tenho pais maravilhosos, uma família unida, tenho colegas bacanas. Seria legal estar casado? Sim, não sou contra o casamento. Ao contrário, feliz do homem e da mulher que conseguem casar-se, mas não só casar no sentido da cerimonia. O casamento vai além de véu e grinalda e festa bonita. Casamento é o dia a dia. É ter que entender o porquê o outro estar chateado ou não ter gostado de algo. Casar é amar 'todos os dias, até o último dia da vida'. E para ter este casamento duradouro, é preciso o alicerce: o namoro. Ser feliz é descobrir todos os dias a graça de amar, mesmo estando solteiro", entende Rozendo Aragão.

Heterofobia

O termo heterofobia é definido como aversão, ódio ou repúdio as pessoas que se relacionam com pessoas do sexo oposto. Há quem defina como “mundo ao contrário”, onde o normal é ser homossexual, e ser heterossexual é abominação, é levar a caminhos auto destrutíveis. O heterofóbico não aceita a ideia do amor entre homens e mulheres, não admite a concepção natural entre homem e mulher.

De acordo com a psicóloga Lidiane dos Anjos, o estar sozinho de hoje não é o mesmo estar sozinho de antes. ”Os tempos mudaram, as exigências nas relações sociais também. Não se espera hoje do homem o que se esperava anos atrás, assim como também não se espera da mulher. A heterofobia, definida como medo ao sexo oposto, se apresenta como termo midiático para não apresentar questões muitos mais profundas acerca da relação homem-mulher. Não há receita de bolo, não há regra geral. Estar numa relação ou estar só são fatos únicos e complexos, impossíveis de serem analisados de forma geral”, ensina a psicóloga.

Independência

A psicóloga destaca que se for mais longe e buscar dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), dá para perceber que a proporcionalidade entre homens e mulheres não varia muito durante os anos. O que muda são os atributos que se busca nesse outro, em relação a renda, educação, status social.

No que se refere à mulher, fazendo uma análise em um processo  histórico-social, percebe-se uma demarcação de submissão ao homem e preconceito.

“Numa sociedade marcada pelo machismo e autoritarismo, a mulher enfrentou [e ainda enfrenta] diversos desafios sociais mesmo com os avanços no trabalho, no esporte, na liderança da família. Parafaseando Eliane Gonçalves em seu artigo Novas solteiras: ecos do feminismo na mídia Brasileira, a emergência da expressão "novas solteiras" remete ao ideário feminista de autonomia, liberdade e independência, em oposição à solteirona do passado”, ressalta lembrando que as "novas solteiras", que recusam modelos tradicionais de homens e de relações conjugais, podem morar sozinhas ou não.

Ela acrescenta que, comparando a Arábia Saudita, onde as mulheres são proibidas de dirigir automóvel, sentar-se sozinhas num restaurante ou viajar sem o marido, o que acontece hoje no Brasil parece loucura! Há mulheres que buscam o príncipe encantado, que querem ter família, filhos e um amor “até que a morte os separe”. O imaginário socialmente construído de segurança, afeto, carinho está revelado na ideia do casamento ideal, bem como assumir o papel social de mãe e esposa circunstanciado no mesmo fato”, entende.

Sem “cura”

Para Lidiane dos Anjos, o que está delineado socialmente nem sempre serve a todos, pois não há tratamentos, muito menos “cura”. E a solução que parece estar em seguir a norma heterossexual de formar um par precisa ser desafiada pela razão de estar feliz, seja sozinha (o) ou acompanhada (o).

“As exigências devem ser deixadas de lado quando o que está em jogo é a sua felicidade. É um princípio da psicóloga (o), o respeito à livre orientação sexual dos indivíduos e o apoio à elaboração de formas de enfrentamento no lidar com as realidades sociais de maneira integrada.  É dever do profissional de Psicologia fornecer subsídios que levem à felicidade e o bem-estar das pessoas considerando sua orientação sexual”, entende.

Por Aldaci de Souza

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