Ao Falso Crítico

Em minhas mãos cresce a vontade de riscar. Em minha voz a de cantar. Meus ouvidos ouvem músicas e recriam outras com acordes meus. Minhas pernas dançam, é disso que gostam. E meu desejo é mostrar isso. Que gosto de riscar, cantar, compor, dançar e me mostrar. Não me questiono se sei. Afirmo que gosto. Você, sentado, me vê, aponta meus erros voluntários de concordância; ri de minha pieguice, humilha meus pensamentos, despreza a “mediocridade” de meus textos. Minha voz não lhe agrada: não sou Ney Matogrosso, Milton Nascimento ou Nana Caymmi. Que pena! Como são simples meus acordes, comuns meus dedilhados, pobres minhas versões de batidas pop-rock. Imóvel na festa, você tenta “decifrar” o que é isso que faço com as pernas. Eu danço. Você não. Você zomba de minha falta de ritmo; diz que é feio o que faço, admira minha coragem de me expor assim. Mas seus textos mofando nas gavetas de seu quarto, seu sonho de aprender piano e estudar canto lírico, seu bater o pé no chão, marcando o tempo do pé-de-serra, eu acho bonito. É bonito também sua vontade de ser elogiado pelo que escreve, pelo que sabe fazer e não só pelo que admira. Também sabe que é bom. Tem segurança de sua inteligência. Argumentos não lhe faltam nas discussões, nem postura e nomes de pensadores famosos- os quais você queria ser. Você é demais! Você sabe! Mas tem medo. Medo daquele que ler tanto quanto você, que toca piano e é maestro, que dança tango de olhos vendados; para quem o mundo tem muito mais páginas do que o que você já estudou. Ele também conhece Hegel, e, como você, ostenta isso como os alemães ostentavam sua “superior” raça ariana. Discute política, economia, arte escandinava, arquitetura boliviana, culinária surinamita e ainda entende tudo de astrologia. Diante destes, seus textos escondem-se ainda mais, e tudo que você é capaz de produzir parece vergonhoso e diminuto. E esta é sua doença, Falso Crítico. Você é covarde: esconde-se atrás do que sabe. E o que sabe não é por prazer pessoal, por curiosidade e sim para competir, testar, para defesa, por obrigação. Você blefa: posta-se como entendedor da sociedade e do ser humano, sustendando-se, muitas vezes, em trechos de livros e música que decora. Você é mero espectador: acomoda-se para assistir à próxima “comédia” ou ao próximo “drama”. Você é frustrado: quer ser reconhecido, mas amedronta-se com o dedo indicador dos que, como você, não respeita a produção alheia. Você, Falso Crítico, pode ser respeitado- por seu conteúdo teórico-, mas não vai ter pelo que ser elogiado, escondendo-se atrás de seu medo em arriscar expor-se á rejeição e ao fracasso. Por Marina Ribeiro

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