Sergipana, criada no Rio de Janeiro, filha da atriz carioca Claudete Farias e do jornalista sergipano Bener Nascimento, Patrícia voltou aos 20 anos para sua terra natal e, em pouco tempo, mostrou como o seu talento poderia colaborar com a revitalização da música sergipana. Ao ganhar o Canta Nordeste, viveu um momento de glamour e vaidade, mas ao perceber a armadilha, se voltou para a pesquisa e o estudo. Mais uma vez surpreendeu com a sua capacidade de brilhar atravéz da sua música. RIO, SÓCRATES E FESTINHAS DE FAMÍLIA… Nasci aqui em Sergipe, mas depois que minha mãe, que é carioca, se separou do meu pai, fomos morar no Rio e eu perdi o contato com minha terra natal. Chegando lá, minha mãe conheceu Sócrates, uma pessoa maravilhosa com quem ela casou e que foi muito importante na minha infância. Desse casamento nasceu minha irmãzinha, Carla, que hoje já está com 21 anos. O Sócrates foi muito especial, por ser uma pessoa nobre, que deu todo o conforto e atenção para nós mas, quando eu tinha oito anos de idade, ele faleceu. Minha mãe, que tinha trabalhado com Abujanrra em São Paulo, tinha parado com a carreira de atriz, mas sempre que tinha uma festinha de família, tipo aniversário, casamento, batizado ou coisa parecida, ela encenava algum monólogo ou fazia pequenas peças conosco e eu me divertia muito… POESIA, TEATRO, MÚSICA… Minha infância foi muito rica com muito teatro, poesia, música… Minha casa sempre tinha pessoas ligadas às artes e eu fui absorvendo isso naturalmente. Minha mãe começou a namorar um músico chamado Alex, que ficava ensaiando lá em casa e eu ficava durante horas observando ele, que era ótimo, e me colocava para cantar junto, tanto que a primeira música que eu cantei foi “Aquarela” de Toquinho, na verdade eu nem sei quando começou o meu entendimento do que era cantar ou encenar, porque foi algo que foi acontecendo durante toda minha infância, de uma forma muito natural. VEIGA DE ALMEIDA… Agora, efetivamente, eu comecei pelo teatro. Eu tive a sorte de estudar em colégios muito bons no Rio, e no Colégio Veiga de Almeida eu tinha uma professora chamada D. Dalva que era apaixonada por teatro, ela sempre organizava peças de teatro para os alunos apresentarem nas festas da escola. Agora, o interessante é que D. Dalva sempre me colocava em papéis onde era necessário cantar, então, todo personagem que, além de falar, tivesse que cantar e dançar, lá estava eu…Na verdade, ela via que eu tinha uma relação com a música muito forte, mesmo eu não percebendo isso. Lembro que uma vez fizemos uma peça que contava a história do Rio de Janeiro e eu fiz um arlequim que era o narrador e que, durante todo espetáculo, cantava e dançava. “…NÃO ADIANTA QUE A ARTE ESCOLHEU VOCÊ…” Quando tinha peça na escola, minha família adorava, era um acontecimento, a casa ficava aquela loucura, de escolhe figurino e ensaia texto, enfim, minha família foi muito boa em me estimular para as artes e lembro que, uma vez, minha mãe me disse: “Não adianta que a arte escolheu você… às vezes as pessoas escolhem a arte, mas no seu caso, ela te escolheu…” PUBLICIDADE! …E eu fui crescendo, sempre no meio de músicos, mas eu não queria ser artista, eu queria fazer publicidade, brincava de cantar, mas não queria nada sério… Ficava pensando “…eu viver de música? Não sou maluca!”… Na verdade, eu estava vivendo um outro momento, adolescente, começando a namorar, descobrindo outras coisas… não queria pensar seriamente sobre nada. SERGIPE! Aos 16 anos eu resolvi saber mais sobre o lugar em que eu tinha nascido. O que eu sabia era muito pouco, sabia que tinha um pai que morava aqui, mas não era o suficiente, afinal, eu tinha surgido aqui. Falei com minha mãe que queria conhecer Sergipe e viajamos para passar uns dias aqui e encontrar meu pai… Lógico que foi um choque de gerações, de repente, meu pai se deparou com uma mulher e não com uma menininha, como ele de certa maneira esperava, e eu conheci uma pessoa que era muito parecida comigo. Nosso contato até então, não era muito próximo. Me lembro que, uma vez, eu ainda muito pequena, ele me mandou um disco do “Bolo de Feira”, quando foi lançado, me mandou um outro disquinho e claro existia dentro da minha fantasia de menina a figura de um pai, mas, no momento, em que eu cheguei aqui, essa figura se tornou real e, para se adaptar a isso demora um pouco… Foi uma visita rápida mas, quando eu voltei, alguma coisa tinha ficado ou despertado dentro de mim, que no começo eu não soube identificar… SELF Segundo a psicologia, a menor parte do indivíduo se chama self que é a menor, porém, a mais concentrada, e Sergipe tem isso. É o menor estado da federação, mas tem uma densidade muito grande, que talvez venha da força das águas salgadas dos rios. Eu acabei sentindo isso, sem decodificar de imediato. O PRIMEIRO TRABALHO PROFISSIONAL… Um belo dia, eu estava passando por Botafogo e vi em um bar chamado Das Shoppem uma placa escrito “Precisa-se de Cantores” e aí resolvi fazer um show, já tinha um repertório que eu cantava nas rodas das festinhas, chamei alguns amigos para ensaiar e nos apresentamos lá. Eu fui toda glamurosa, vestido longo preto, luvas, apesar do show ser bem amador, eu queria estrear com todo glamour. E assim foi. Na platéia, só amigos, parentes e alguns curiosos, mas foi muito legal. Deu até para ganhar uma graninha, pouca, mas deu! O SINAL! Quando eu tinha 19 anos, meu pai foi para o Rio participar de um congresso e o hotel em que ele ficou, era em Copacabana, bairro onde eu morava, então ele me ligou, nos encontramos, e ele me fez o convite para morar em Aracaju, que aqui ele produziria minha carreira musical. Isso foi um grande sinal. Era uma época, em que eu estava vivendo minha vida de uma forma muito intensa, ter 17, 18 anos no Rio de Janeiro é, muitas vezes, complicado; a gente fica com uma sede de experimentar tudo e quanto mais você mata sua sede, mais sede tem… e a sede nunca passa… Quando meu pai apareceu e me fez o convite para morar aqui, foi um basta em toda loucura. Minha mãe me deu a maior força, disse “vai que eu fico com o Moreno”, que é o meu filho. Eu tinha engravidado de um namorado, mas não casei, essas coisas de adolescente. MORRENDO DE MEDO! Resolvi aceitar o convite de meu pai, mas fiquei morrendo de medo, não tinha muita informação daqui, visitei a cidade uma vez, mas isso é diferente de morar. Enfim, cheguei aqui e meu pai já estava comprando um som, contatou Jairo Bala e Ademir Bassur que tinham tocado com meu pai no “Bolo de Feira”, que fez muito sucesso na década de 80, viajaram pelo norte, nordeste e chegaram até o sul levando a música de Sergipe… pois, montamos um show e começamos a tocar na noite… PRIMEIRA VEZ! Na verdade, a primeira vez que eu cantei aqui, foi quando estive visitando a cidade, mas foi só uma canja, profissional mesmo, foi em um projeto que meu pai criou chamado “Depois das Seis”, que era um Happy Hour no Auditório da ASI, na rua de Itabaininha. Era muito legal, só que aqui não se tem a cultura de sair do emprego e parar em um barzinho para desfrutar de uma boa música, as pessoas vão logo para casa, acho que até por causa do tamanho da cidade…Depois comecei a tocar no Habeaus Corpus e no Teimonde que são bares, principalmente o Teimonde, que servem como referência para o cantor. NOVOS REPERTÓRIOS, NOVAS IDÉIAS… O que aconteceu, e foi dito não por mim, mas por críticos e pelo próprio público, é que houve uma abertura na escolha do repertório depois que eu levei essa possibilidade para o palco, até então, as pessoas estavam presas a um repertório de barzinho sempre igual. Outra coisa foi a possibilidade de levar um show para o bar e não apenas ficar de som ambiente. Os donos de bar precisam perceber que, às vezes, é muito mais interessante para o cliente ver um show de uma hora e meia, ao invés do cantor ficar horas cantando, chega um ponto em que o próprio cliente cansa…O que eu levava para o bar era realmente um show, com figurino, cenário, tudo… A DRAMATIZAÇÃO! O problema é que existe o estigma de que as pessoas não vão para um barzinho ver o cantor cantar… e por que não? A pessoa não pode saber que vai ter tal show, em tal barzinho, sair de casa e ir para lá? É claro que pode, então, o que eu fazia era um show e tinha que ter uma interpretação muito forte. O CANTA NORDESTE! Foi engraçado no início porque na primeira eliminatória, muita gente ainda não me conhecia aqui, e ficavam perguntando “Quem é essa garota?” até que eu ganhei o festival, que foi o marco divisor em dois sentidos, primeiro porque foi a catapulta para o meu trabalho, para o reconhecimento da artista que eu sou, ali estava tudo que eu aprendi cantando na noite, na vida, como compositora, enfim, cantar “Camará” no palco do Canta Nordeste representava tudo isso, e foi ali que eu resolvi, definitivamente, que era nesse oceano que eu ia mergulhar, nem que passasse fome, era isso que eu queria, esse foi o lado positivo, agora, o lado negativo foi que eu não consegui segurar tudo isso com equilíbrio, não estava pronta para isso… A VAIDADE, O DESLUMBRAMENTO… A questão talvez tenha sido, que eu não estava completamente integrada com a história, não estava totalmente preenchida pela idéia de ser uma artista, e quando existem lugares vazios dentro da gente, eles são preenchidos por outras coisas e acho que foi exatamente isso que aconteceu. Veio a vaidade, o deslumbramento, todas as pessoas que chegavam perto só falavam que eu era maravilhosa e isso me fez mal também, nunca chegava alguém para dizer ” Olha! Legal, mas pode melhorar mais…”, minha cabeça pirou, então…Subiu para cabeça! E comecei a ficar mal psicologicamente, e o meu rendimento profissional começou a cair, enfim, fiquei totalmente desfigurada do que sou hoje… Eu era muito nova, tinha um ano de carreira, não tinha como segurar essa onda… A PERSISTÊNCIA DE MARCOS Foi uma época muito difícil para mim, tinha brigado com meu pai e isso me marcou muito pela segunda vez. A grande burrada nossa foi que a gente deveria primeiro ter se encontrado e vivido um tempo como pai e filha, e o que houve não foi assim, partimos logo para trabalhar juntos e acabamos não nos entendendo. Mas surgiu Marcos e eu descobri que o encontro com o aprendizado que eu vim buscar em Aracaju não era só do pai, mas, principalmente, e a maior parte era com Marcos, que esteve comigo o tempo inteiro sempre me dando força, me clareando as idéias. Em um momento dessa minha piração eu resolvi voltar para o Rio, porque lá estava minha família e não ia mais querer saber de música, e ele falava “…cara você está equivocada, bota a cabeça no lugar, isso que você está passando é provação que se tem que passar para se chegar em outro lugar e eu estou com você, porque acredito em você…” e com isso eu tive certeza de que a maior parte do aprendizado seria com ele, pois ele tem a persistência e isso é muito legal… EM OFF… Eu participei ainda de um festival lá no Paraná e de outro Canta Nordeste com a música “Em Off”, que na minha opinião é mais bonita que “Camará”, só que esse Canta Nordeste foi muito obscuro, estou falando isso não é porque eu não ganhei, mas quem participou sabe do que estou falando, era aniversário de Recife, o primeiro e segundo lugares foram de lá, quando a organização geral do festival chegou, eu não consegui me classificar nem entre as 24 finalistas… PUREZA! Depois fiz um show chamado “Pureza” que era temático, todas as músicas falavam do Sol, e foi uma fase um pouco incompreendida, mas isso é compreensível, pois tratava de coisas muito pessoais e nem sempre as pessoas conseguem assimilar isso… O ESCORPIÃO… Meu signo é escorpião e ele tem muito de ter que morrer para renascer e acho que é isso que aconteceu comigo. Estou renascendo…Durante esse tempo todo me dediquei à pesquisa, mais uma vez a presença de Marcos foi importante, pois ele sempre me disse que eu precisava ler muito mais, precisava escutar mais músicas, precisava pesquisar, e foi o que eu fiz, pesquisei primeiro o folclore sergipano, que me levou a Idade Média, que me levou a música oriental… eu quase pirei de tanta informação, perceber o quanto a música oriental influenciou a nossa música é fantástico… Dessa pesquisa, surgiu o show “Cântis” que é um romance coletado do folclore sergipano por Jackson da Silva Lima, pessoa maravilhosa, fólclorista, super acessível, me abriu as portas da casa dele, que é um verdadeiro museu, de tantas coisas lindas e raras que guarda. Eu ouvi uma gravação de cântis, cantada por uma intormante, e quase caí para trás, de tão bonito que era … A MÚSICA BAIANA E O NOSSO CARNAVAL Não tenho nada contra a música da Bahia, porque tirando aquelas letras horríveis, você está escutando samba de coco, samba de roda, cânticos negros, ou seja, coisas que têm a ver com a cultura deles, em maior parte africana, é mais euro-indigena só que a nossa é totalmente diferente, e se continuarmos insistindo em promover a música deles, vamos continuar perdendo e só eles vão ganhar. Imagina nossos grupos folclóricos desfilando no corredor da folia, apresentando para turistas a quantidade de ritmos que nós temos, seria a forma mais eficaz de colocar Sergipe em evidência no país e no mundo… O CD! Já houve oportunidade de lançar o CD na época do Canta Nordeste, só que ali seria mais oportunismo que oportunidade, e eu acho que um CD deve ser lançado quando se tem um material de qualidade para as pessoas poderem adquirir algo de valor real, e não apenas um produto para consumo. Acho que essa maturidade já esta chegando e, com isso, a qualidade do meu CD. Então, em breve, isso vai acontecer…
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