Sergipano concorre ao prêmio Jabuti de literatura

O sergipano Anderson da Silva Almeida é um dos finalistas do Prêmio Jabuti deste ano (Foto: Divulgação/ cedida por Anderson)

O sergipano Anderson da Silva Almeida é um dos finalistas do Prêmio Jabuti deste ano. Ele concorre na categoria biografia com o livro “Como se fosse um deles: Almirante Aragão – memórias, silêncios e ressentimentos em tempos de ditadura e democracia”. O Prêmio Jabuti comemora 60 anos em 2018. Essa é a maior premiação literária do Brasil e a premiação ocorrerá no dia 8 de novembro, às 19h no Auditório do Ibirapuera.

Portal Infonet – O livro conta a vida de um soldado da Marinha que se colocou contra o golpe militar de 1964 e sofreu as represálias por esta posição. Como você se interessou por essa história?

Anderson da Silva Almeida – Durante minhas pesquisas no Mestrado em História da UFF, o almirante Aragão apareceu com muita frequência. Nos documentos oficiais, jornais, livros de memórias, entrevistas e documentários, o oficial fuzileiro naval era mencionado ora de uma forma simpática, ora de uma maneira, digamos, não tão positiva. Setores das esquerdas o acusavam de falastrão e boquirroto por não ter organizado a resistência armada contra o Golpe de 1964, visto que se dizia brizolista/janguista e era o comandante geral do Corpo de Fuzileiros Navais. Grupos da Marinha não o viam com bons olhos justamente por causa de sua proximidade com Brizola. Também por esse motivo, parte da imprensa passou a se referir a Aragão como o almirante vermelho. Já os seus simpatizantes o apelidaram de almirante do povo. Eu tinha aí um personagem desafiador no campo das memórias, mas ainda não era a hora de investigá-lo detalhadamente. Naquele momento, meu foco era os marinheiros e fuzileiros excluídos da instituição após o Golpe. Tive a felicidade de a pesquisa ganhar o Prêmio Memórias Reveladas do Arquivo Nacional e segui para o doutorado, em 2010, ainda na UFF, agora com um projeto totalmente dedicado ao almirante misterioso, orientado pela professora Samantha Viz Quadrat, grande incentivadora da empreitada.

Infonet ? Como foi a trajetória dele dentro das Forças Armadas?

A.S.A– Aragão chegou ao Rio de Janeiro na década de 1920 e foi admitido como recruta no Exército Brasileiro, em 1924. Em entrevistas concedidas ao longo de sua vida, dizia que tinha saído da Paraíba tangido pela fome. Fui investigar se isso tinha fundamento e constatei que a então Parayba do Norte sofreu drasticamente com as estiagens de 1919/1920 e, também, vamos combinar, ser recruta ainda hoje é uma alternativa vislumbrada apenas pelas camadas mais pobres da sociedade.  Ao sair do Exército, Aragão ingressou como um simples soldado fuzileiro naval em 1926 e chegará a vice-almirante. Nesse sentido, embora nem todos os praças o vissem com bons olhos, o almirante Aragão da Paraíba, como ele mesmo se definia, tinha a simpatia de grande parte de tropa. Nos setores políticos simpatizantes do chamado nacionalismo de esquerda, Aragão era a esperança de uma Marinha mais afinada com as demandas populares e menos aristocrática.

Infonet – O que aconteceu com ele?

A.S.A– Após o Golpe de 1964 ele foi preso, depois oi para o exílio no Uruguai, passando posteriormente por Cuba, Vietnã, China, Chile, Portugal – durante a Revolução dos Cravos em 1974, Argentina e Venezuela, só retornando ao Brasil no final de 1979 após a lei da Anistia, vindo a falecer em 1998, no ostracismo.

Infonet- Como e onde foi feito o processo de levantamento de informações sobre a vida do Almirante Aragão?

A.S.A– Realizei pesquisas em diversos arquivos do Rio de Janeiro, Brasília, Paraíba, São Paulo, Campinas e Portugal. Nesses lugares investiguei como e a partir de que momento Aragão passou a ser vigiado por seus opositores. Constatei que desde a década de 1950 os órgãos de vigilância já acompanhavam os passos do almirante. Utilizei também as fontes jornalísticas, para ter uma ideia de como a grande imprensa noticiava as aparições do personagem e realizei dezenas de entrevistas com seus contemporâneos para cruzar com as fontes “oficiais”, visto que os documentos elaborados pela Ditadura devem ser analisados através de uma maneira muito cautelosa e crítica.

Infonet- Quanto tempo foi levado para construir a obra?

A.S.A– Juntando o período do Mestrado, quando já comecei a coletar as fontes, até o término do doutorado, com a revisão posterior para a edição e editoração do livro, foram cerca de seis anos.

Infonet- Nos tempos em que vivemos hoje, que há clamores de partes da população por um retorno da ditadura, como você, que estudou a fundo o período do regime militar, encara essa situação?

A.S.A– Existem estudos que mostram que as marcas da Ditadura estão em diversos setores da sociedade. Um exemplo muito claro é a atuação das Polícias Militares, com uma hierarquia oriunda do modelo das FA; protocolos de enfrentamento não cumpridos muito bem explicitados nos tristemente famosos “autos de resistência”; a prática de tortura de presos sob custódia do estado; o “desaparecimento” de pessoas  e sistemática resistência das FA e setores da sociedade civil, como é o caso do STF, de julgar os crimes praticados pelos militares durante da Ditadura. Tudo isso nos remete a uma memória social que, em muitos casos, pede a volta dos militares ao poder justamente por não reconhecer  nessas práticas a presença de crimes contra a humanidade perpetrados por agentes do estado. Sabemos que é doloroso reconhecer isso, mas, como disse Bertold Brecht, “a cadela do fascismo está sempre no cio”. Eu diria que a serpente do fascismo está sempre a expelir seus ovos. O apelo ao poder centralizado, à ordem, a anulação dos conflitos, a ocultação das diferenças, a ojeriza à diversidade e o pavor à liberdade, são marcas de um tempo que teima em não passar, um passado-presente que transita, necessariamente, em todas as instâncias da sociedade, não apenas nos setores militarizados.

Infonet- O Prêmio Jabuti é um dos mais conceituados do país e a premiação acontece dia 8 de novembro. Qual a expectativa e como você se sente em ser um dos finalistas?

A.S.A- Foi com grande surpresa que recebi a notícia. Fiz a inscrição individual e estou muito feliz. Acredito que essa visibilidade proporcionada pelo Prêmio Jabuti contribui de forma muito significativa para que o livro circule entre um público mais amplo e não fique restrito aos meios acadêmicos. Acho que está aí a grande importância. Sem contar, para um escritor desconhecido como eu, figurar na mesma lista de autores e personalidades como Jô Soares, Anita Prestes, Arthur Xexéo, Lília Schwarcz, Vavy Pacheco Borges, Benito Schmidt, dentre outros, nos anima a seguir pelo caminho das letras, que é infinito…

Sendo bem realista, acho que já cheguei longe demais. Chegando lá, dia 08, vou aproveitar bastante todos os momentos, porque a gente não sabe quando e se isso pode voltar a acontecer (risos).

Infonet- Qual a categoria em que é finalista? Qual a editora?

A.S.A- Biografias. Editora da Universidade Federal Fluminense (Eduff)

Infonet- Como ter acesso? Quanto custa?

A.S.A- Disponível no site: www.eduff.uff.br. O valor R$ 66,00. Quem comprar até o dia 30 a editora está dando 30% de desconto sobre esse valor.

Por Victor Siqueira

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