Vera Ferreira construiu sua própria história, independente de ser neta de Lampião e Maria Bonita. Foi a primeira cinegrafista mulher a empunhar uma câmera no Brasil, criou reboliço no Senado Nacional e hoje leva, no peito e na raça, o projeto de manter vivo esse momento tão importante da história do Brasil que foi o cangaço. Mas também o que se poderia esperar dessa que é da “raça de Lampião” e tem como avó uma mulher que é exemplo da força feminina… RAÇA DE LAMPIÃO! Quando éramos crianças, ninguém chegava perto da gente. Só brincavamos com os nossos primos… Para as pessoas nós éramos “raça de Lampião” e vivíamos assim. Minha mãe teve quatro filhos, Dejair, Vera, Gleuse Meire e Iza Cristina, além de três bisnetas que são karla que faz faculdade em São Paulo, Cleudi que faz Arquitetura na Unit e Luana que é campeã brasileira de natação. Muita gente acreditava, ou acredita, que descendente de cangaceiro viria a ser bandido; e não se tem nenhuma informação que algum descendente de pessoas que estiveram no cangaço tenham tido problema com a justiça. EXPEDITA AOS 21 DIAS Minha mãe, aos 21 dias de nascida, foi dada para ser criada por um casal, porque todas as crianças que nasciam no cangaço eram dadas, visto que não se tinha a menor condição de se ter crianças no bando. E foi assim que, até os oito anos de idade, minha mãe foi criada por Severo, que era vaqueiro, e sua esposa, Aurora. Depois ela foi para Propriá, para ser criada por João Ferreira, que foi o único irmão do meu avô que, por determinação dele, não entrou para o cangaço para tomar conta das irmãs e do irmão mais novo, que era Ezequiel. Aos dezesseis anos, minha mãe veio trabalhar em Aracaju e aos dezoito anos se casou. VERA AOS TREZE ANOS Aos treze anos de idade eu fui para São Paulo, junto com minha mãe, pela primeira vez, para um encontro de cangaceiros. Até então, eu não sabia nada da vida de meu avô, só sabia que éramos “raça de Lampião”, e que as pessoas não gostavam disso. Nesse encontro, em São Paulo, organizado pela autora do livro “Táticas de Guerra de um Cangaceiro”, Cristina da Mata Machado, que conheci Dadá, Balão, Criança, Sila, Zé Sereno, Labareda e outros; eu fiquei impressionada como tratavam com respeito minha mãe e eu. Era como se meu avô estivesse presente. Foi então que eu prometi, pra mim mesma, que iria pesquisar e cuidar da memória dos meus avós. DADÁ, MULHER DE CURISCO Era uma mulher fantástica! Foi quem me esclareceu muita coisa sobre meus avós e o cangaço, ela tinha uma memória fantástica e muito detalhista, além de contar realmente os fatos, sem fantasiar, porque hoje em dia, ainda existem cangaceiros que fantasiam. MULHER CINEGRAFISTA Aos dezenove anos, casei e fui morar em São Paulo. Separei, fui para Brasília e comecei a fotografar. Daí para câmera foi um pulo, fui a primeira mulher, no Brasil, a empunhar uma câmera. Trabalhei na Rede Globo, Manchete, Bandeirantes, TV Sergipe e depois em produções independentes. Tenho muito orgulho de ter sido a primeira jornalista cinegrafista. SAIAS, CALÇAS E SENADO Eu fui designada pela Globo para trabalhar como repórter cinegrafista no Senado e lá mulher só podia entrar de saia. E como eu, com uma câmera de quase dez quilos no ombro, tendo que subir em mesa, nos ombros do meu assistente, poderia usar uma saia? Muitas vezes peguei o paletó do meu assistente, outra vez tranquei uma fotógrafa enorme dentro do banheiro para pegar a saia dela e fazer as imagens que eu não podia perder, até que o Moacir Dala me liberou para entrar no Plenário de calça. MUSEU DO CANGAÇO… Em 88 foi comemorado os cinqüenta anos de morte de Lampião e Maria Bonita, além de outros cangaceiros que estavam no momento da tocaia no coito. Então resolvemos criar um museu que seria uma homenagem aos meus avós e ao cangaço em geral. Montamos ele onde fica o Centro de Turismo de Sergipe, e esse museu tinha tudo para dar certo, porque em agosto daquele ano, que não é um mês forte para o turismo, tivemos 3.327 visitantes, que é mais do que tiveram os três museus daqui em três anos. Recebemos a visita de jornalistas da Bélgica, da Romênia e de outros lugares do mundo… Pena que o museu só funcionou 4 meses, em novembro caiu uma chuva forte e choveu através do teto e perdemos muitas coisas. Perdemos documentos históricos, fotos, armas… O NOVO MUSEU! Nós temos propostas de alguns lugares para fazer o museu, Alagoas, Bahia, o Shopping Rio Mar… Aqui a Emsetur nos ofereceu um lugar na Orla, mas já nos tirou, inclusive o Arquiteto Eduardo Carlos Magno, que projetou a planta do museu, disse que se o museu não for na orla, quem sairá perdendo é a própria Orla e, claro, Sergipe… Enfim eu sei que eu vou montar esse museu não sei aonde, gostaria muito que fosse aqui, mas acredito que seja preciso que as pessoas que estão a frente do governo percebam o quanto é preciso valorizar os acontecimentos históricos da sua terra. ENQUANTO ISSO… Uma parte do acervo está no Memorial da UNIT que fica na Av. 13 de julho, e pode ser visitado… MAS NÃO DURA MUITO TEMPO! Nós queremos muito montar esse museu aqui, mas não vou ficar muito tempo esperando que políticos percebam o quanto isso seria importante para o nosso estado. A minha familia não ganha nada com isso, muito pelo contrário, perde, porque temos que botar do próprio bolso para viajar, pesquisar e manter essa passagem histórica do Brasil que foi o cangaço… paciência tem limite. AS QUATROS OPÇÕES DE LAMPIÃO! Ele poderia calar, virar jagunço de um coronel rico, volante (polícia) ou cangaceiro… ele optou pela última, mas só quando o pai foi morto, que era um homem muito pacato e que se mudou quatro vezes para não brigar e foi morto assim mesmo. MARIA BONITA! A revista Desfile Internacional colocou as cem mulheres do século, minha avó estava presente, um encarte da Folha de São Paulo colocou as maiores mulheres brasileiras, minha avó estava presente, saiu agora na revista Cláudia as mulheres mais importantes, minha avó estava presente. Então acho que só isso basta para dizer qual a importância dessa mulher como referencial para as mulheres brasileiras e do resto do mundo. DE VIRGOLINO A LAMPIÃO… Quem escreveu o livro foi eu e Antônio Amaury, que é o maior pesquisador sobre cangaço que existe atualmente, com um trabalho de cinquenta anos dedicado a esse tema. A Dana Corporation foi quem patrocinou o nosso livro juntamente com o Ministério da Cultura, Através da Fundação Augusto Franco. e o que me deixou muito feliz foi que, durante dois meses, ele foi o mais vendido na Livraria Escariz e a saída continua muito boa. Lançamos agora em Porto Alegre, e estaremos fazendo outros lançamentos durante o ano todo… O FILME? Nós já fomos procurados por alguns diretores para comprar os direitos de filmagem do ” Virgolino a Lampião” e estamos estudando a melhor proposta, porque chega de filme mentiroso sobre o cangaço… o único trabalho que é um pouco fiel foi um Globo Repórter Especial que se chamou ” O último dia de Lampião’’… LAMPIÃO, MENTIRAS E VERDADES… Eu e o Antônio Amaury já estamos trabalhando em outro livro que vai revelar as mentiras que se falam sobre o cangaço… existem coisas absurdas do tipo que meu avô só usava perfume francês e que só escrevia os bilhetes em máquina de escrever, imagina em pleno sertão fazendo bilhetes em máquina de escrever, a pessoa que escreve um négocio desse é um irresponsável.
Portal Infonet no WhatsApp
Receba no celular notícias de Sergipe
Acesse o link abaixo, ou escanei o QRCODE, para ter acesso a variados conteúdos.
https://whatsapp.com/channel/
0029Va6S7EtDJ6H43
FcFzQ0B