As escolas de direito nasceram no século XIX no Brasil. Por mais de um século não foram senão “clubes” em torno dos quais os membros das classes altas se reuniam e de onde planejavam seus futuros nas carreiras políticas, empresariais, intelectuais e até jurídicas. No final do século XX ( anos 70 e 80 ), com uma crescente especialização profissional no Brasil, transformaram-se aos poucos e agora quase que completamente em escolas preparatórias para concursos públicos. Ainda são freqüentadas por pessoas oriundas das classes altas, mas hoje é a classe média a mais importante fração discente dessas escolas. Dentro desse quadro geral, um outro traço importante foi a emergência das escolas privadas de direito, espécies de fábricas de diplomas jurídicos – coisa que desvalorizou bastante a titulação do bacharel em direito.
Embora a primeira escola de direito de Sergipe (depois transformada em departamento da UFS) tenha sido criada muito tardiamente (nos anos cinqüenta), ela conheceu um pouco da trajetória mencionada acima e logo se tornou uma escola preparatória para concursos públicos. Vista numa perspectiva histórica e comparada, não se distingue em nada da maioria das escolas de direito do Brasil em termos de métodos de ensino, de treinamento profissional e de ideologia jurídica. Do ponto de vista da produção intelectual, os juristas de Sergipe tiveram maior importância enquanto literatos e pioneiros das ciências humanas do estado. Qual o quadro atual?
Começo pelos estudantes. Estes são os melhores universitários de Sergipe, ao lado dos alunos de Medicina. Na sua maioria são brancos e de classe média, provenientes grandemente de escolas privadas. A pontuação que obtêm no exame vestibular é alta e, comparados com os da UFS, os alunos das escolas privadas dificilmente entrariam para o Departamento de Direito (DDI) da federal. Eles possuem grande motivação e geralmente não querem exercer advocacia, mas preparar-se para as profissões jurídicas públicas. Possuem um centro acadêmico (o seu sindicato) que nos últimos tempos não tem funcionado, mas que agora volta a todo vapor. Anualmente entram 100 alunos e eles somam ao todo 500.
Os servidores são três bons funcionários. Prestam inestimáveis serviços, mas não são devidamente reconhecidos pelo MEC – especialmente em termos salariais. São auxiliados três estagiários, essa forma barata encontrada por Brasília para não fazer concursos públicos para os cargos de servidores.
Existem duas espécies de professores, os substitutos e os efetivos. Os primeiros são 17 professores temporários ( quase metade do corpo docente), dão aulas em muitas turmas e com freqüência são deslocados para disciplinam não conhecem. São “pau-para-toda-obra” e às vezes super-explorados. Os professores efetivos são 23, sendo a sua maioria também oriunda da classe média branca. Sua titulação está assim distribuída: 2 são doutores, muitos mestres e alguns graduados em direito. Seu perfil é o mesmo do resto do Brasil, no sentido que exercem o magistério como atividade secundária.
As instalações físicas do departamento incluem duas salas para os servidores e os estagiários, uma sala para uma professora, uma sala para o chefe de departamento, três salas para o Neprin e uma sala para o futuro laboratório de informática. Não existe uma biblioteca específica para os alunos de direito, estando o seu acervo no Biblioteca Central da UFS.Qual a situação do ensino, da extensão e da pesquisa no DDI?
O ensino é semelhante às demais escolas de direito do país. Está dividido em três partes, uma introdutória e teórica ( Filosofia, Sociologia, etc.), outra dogmática ( que consiste na leitura e interpretação dos códigos e leis ) e o estágio curricular. Trata-se de um ensino demasiado teórico, merecendo um reforço nas áreas do estágio curricular e extra-curricular. Em termos de medidas a serem tomadas urgentemente, é preciso fazer uma revisão do sistema de pré-requisitos, que está dificultando enormemente que alunos possam avançar o seu curso. As monografias são uma introdução recente e muitas têm a qualidade de verdadeiros livros a serem consultados por toda a comunidade jurídica de Sergipe.
A extensão é ponto fraco do Departamento de Direito. Embora exista uma grande oferta de estudantes dispostos a fazer trabalhos de extensão social, muito pouco é feito. Há, entretanto, movimentações da parte dos alunos para reativar o SAJUR ( Serviço de Assistência Jurídica ) e alguns professores estão se movimentando para fazer um grande projeto de educação jurídica junto a setores da frágil sociedade civil sergipana.
A pesquisa sofre de problema semelhante ao da extensão, ou seja, existem alunos interessados em fazer pesquisa mas poucos são os professores disponíveis. A pesquisa que existe é geralmente informal e não institucionalizada, mas de boa qualidade; Os professores fazem suas pesquisas, publicam em periódicos jurídicos ou em forma de livros. Não existe mais a velha Revista da Faculdade de Direito e durante algum tempo foi publicada a revista Cadernos de Direito – UFS, que está sendo publicada novamente este ano. O Neprin também pretende publicar sua própria revista em breve.
Agora o que poderia alavancar mesmo a pesquisa jurídica seria a criação do ensino de pós-graduação em direito. Esse é um projeto coletivo dos professores. Ele entretanto encontra um obstáculo na inadequada titulação da maior parte de seus quadros. No momento é possível pensar em especialização em direito com os quadros existentes e na possibilidade de mestrado em parceria com outros departamentos. Um doutorado está num horizonte muito longe, a não ser que o MEC distribua, em curto prazo, mais vagas para professores efetivos para o DDI.
Voltando agora a atenção para o funcionamento do departamento, entendo que o principal problema é administrativo. O DDI precisa urgentemente de um choque de administração. Explico em detalhes. Particularmente defendo que a administração de todos os postos de comando das universidades púbicas deveriam ser ocupados por administradores universitários profissionais, ou seja,pessoas com treinamento específico em administração de universidades – como acontece em muitas instituições nos EUA. Na sua impossibilidade ou inexistência, entendo que professores com experiência administrativa e dedicação exclusiva devam assumir a direção dos departamentos. Em que situação se encontra o DDI?
Essa instituição tem dois órgãos coletivos, o Colegiado do curso ( encarregado de tratar de questões pedagógicas ) e o Conselho Departamental ( instância burocrática superior que reúne todos os professores e representantes estudantis ). O que acontece com esses órgãos? Simplesmente não funcionam ou funcionam mal – à exceção de uma ou duas administrações passadas. Por quê não funcionam? Porque, apesar de tratar-se de um departamento de direito, não se aplica a lei e, além disso, há falta de liderança e de dedicação exclusiva ao cargo de chefia.
Com efeito, por conta disso são recorrentes problemas como perda de prazo nas suas relações com a Reitoria e o MEC, atraso na contratação de professores substitutos, lentidão extraordinária em despachar os processos em trâmite no departamento, ausência contumaz de quórum para as reuniões que precisam remarcadas infinitamente, fracasso no acompanhamento pedagógico, entrega atrasada de cadernetas ao DAA, atas por fazer, etc, etc. Se, a despeito disso, o DDI tem obtido boas avaliações do MEC e seus ex-alunos têm sido bem-sucedidos nos exames da OAB e nos concursos públicos, imagine só quão melhor não seria se tivesse um administrador experiente, professor com educação exclusiva e respeitado por ser ético e responsável?
Haverá eleição para o DDI no dia 6 de abril próximo. Faço parte daquele grupo de professores que defendem que professores efetivos e substitutos, servidores e estudantes devem participar igualmente do escrutínio – exatamente como a eleição para reitor. Infelizmente esse foi um voto vencido. Ainda assim, o colégio eleitoral de professores efetivos e dois discentes não terá muita escolha. Terá de decidir se quer uma liderança que possa pôr ordem administrativa e prover liderança para elevar a qualidade do ensino jurídico ou voltar às velhas práticas já mencionadas. Sendo o DDI um patrimônio público sergipano, é melhor que seja administrado pelas mãos corretas.
(*) Afonso Nascimento é professor do Departamento de Direito da UFS.
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