As Câmaras Municipais: instâncias locais de poder

Câmara Brasil Colônia (imagem: grupo get)

Em tempos de efervescência política devido à movimentação das eleições municipais, o papel da Câmara nas muitas partes do país foi o centro das atenções. A Câmara municipal e suas funções, às vezes desconhecidas por muitos são – nunca deixaram de ser – de grande importância para cada cidade e principalmente para a população. Nesse órgão, os representantes do povo, os vereadores, elaboram leis que devem ajudar a sociedade no seu desenvolvimento, além de fiscalizar o cumprimento e as ações do prefeito, assim exercendo uma função de órgão legislativo e fiscalizador.

Por isso, deve-se valorizar o significado do voto para, a cada eleição, compor este importante órgão legislativo, pois os escolhidos irão tratar dos interesses da comunidade, buscando alternativas e soluções para os problemas enfrentados pela população. Nas eleições municipais contemporâneas há certa tendência a valorizar a escolha do prefeito, e a seleção de vereadores parece ser deixada à parte, como se a estes coubesse apenas o papel de apoiar o cargo do prefeito, ou fazer o jogo das negociações partidárias.

Contudo, não foi sempre dessa forma. Houve um tempo em que cabia aos vereadores a gerência das questões politicas da localidade. Aqui daremos destaque ao papel desse órgão no período colonial, evidenciando sua importância e capacidade de exercer um importante poder nas áreas da América portuguesa. Herdamos as câmaras municipais da legislação lusa e esta instituição passou por transformações de acordo com os traços de cada período histórico. No período colonial, as câmaras foram um dos principais órgãos de controle local. Esta instituição criada pela metrópole portuguesa visava organizar e fiscalizar a administração nas vilas, estando sempre administrativamente submetida ao Governador-Geral da Capitania.

Os cargos da Câmara eram preenchidos por meio de eleições organizadas a cada três anos em que três a quatro vereadores, chamados de edis, eram escolhidos, além de um escrivão, um tesoureiro e um procurador, todos eles “homens bons”. Os elegíveis deviam fazer parte da “nobreza da terra” (proprietários de enraizamento mais antigo na localidade), da milícia e do clero, grupos de onde saiam também os eleitores. Os vereadores ou camarários reuniam-se em média duas vezes por semana, e eram algumas de suas responsabilidades: administrar os bens da vila; organizar policiamento; cobrar multas e arrecadar as rendas locais.

As Câmaras funcionavam como órgãos executivos locais do governo da capitania, exerciam um amplo papel de discussão e decisão sobre assuntos envolvendo a vida dos colonos, além de se colocarem como “elo” entre o povo e as autoridades metropolitanas, locais e reinóis. Possuíam um grande patrimônio formado por terrenos públicos, edificações, terras aforadas e por parte do tributo real, além daqueles tributos de caráter local.

Com tantas atribuições e poder de decidir sobre os acontecimentos locais, as Câmaras acabaram ganhando muita autoridade, pois cabia a elas propor e recusar tributos reais, tratar da elevação das povoações à vila e até denunciar as ações dos governadores ao rei.Sobre o perfil das câmaras na Capitania de Sergipe, a historiadora Maria Thetis Nunes defendeu que sua atuação política se deu em defesa somente dos interesses de seus membros, em grande maioria proprietários rurais; por outro lado, estas se constituíram nos únicos órgãos existentes de protesto contra as arbitrariedades do poder metropolitano, bem como contra as determinações das autoridades da Bahia, nem sempre favoráveis aos interesses dos produtores de Sergipe.

Em Sergipe colonial, a Câmara de São Cristóvão foi a única existente até os fins do século XVII, quando foram criadas as quatro primeiras vilas sergipanas: Santo Antônio e Almas de Itabaiana (por volta de 1675), Nossa Sra. Da Piedade do Lagarto(1697), Santa Luzia do Itanhy (1698) e Santo Amaro das Brotas (1697), com a instalação das suas respectivas câmaras. As Câmaras foram por muito tempo porta-voz das reclamações dos colonos contra o abuso do poder exercido pelas autoridades civis e eclesiásticas locais. A autonomia dos camarários chegava ao ponto destes se dirigirem diretamente ao Rei, através de correspondências, fazendo algum pedido ou reclamação.

Como se percebe, este órgão administrativo foi instituído como uma das formas de intervenção política e controle da metrópole nas colônias, mas ele não se restringia a isso; aos poucos foi se tornando um dos principais meios de reivindicações e atuação das elites coloniais. Importante frisar que a Câmara também serviu para que o poder de muitos proprietários rurais nas vilas se consolidasse. Diante da autoridade exercida pelos camarários, e a grande autonomia conseguida por estes em determinadas situações, ocorreu que foi necessário à metrópole tomar medidas que limitassem o poder das câmaras nas colônias, processo próprio do século XVIII.

A sua transformação, passando de um órgão que exercia considerável poder nos assuntos administrativos, comerciais e políticos da colônia nos quais tinha certa autonomia, para ser este órgão legislativo ao qual se conhece foi um processo longo. Contudo, sua função ainda continua, na sua essência, a mesma: a de representar o povo, defender os interesses da população e cuidar dos assuntos da localidade. Por isso, a importância de olhar com mais atenção a escolha de cada representante do legislativo.

*Crislane Dias Santana é bolsista do PET-História, graduanda em História pela UFS e orientada pela Prof. Drª. Edna Maria Matos (DHI/UFS). O artigo integra as colaborações à coluna do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/CNPQ/UFS).

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