Liberdade ou vigilância:a grande contradição da internet

Enquanto surgem cada vez mais apropriações criativas e contra-hegemônicas das novas tecnologias de comunicação, crescem as tentativas dos governos e instituições de usar a internet para monitorar e controlar usuários. Essa ameaça à liberdade de expressão tem preocupado não só adeptos do software livre, movimentos sociais e ativistas da informação, mas a sociedade em geral, que vem se habituando a ter voz em espaços como blogs, sites e mídias sociais, muito mais acessíveis após a popularização dos celulares e das wireless.

As chamadas novas mídias possibilitaram um ambiente informacional mais horizontal que redefiniu os tradicionais papéis de emissor/receptor e potencializou a livre expressão num cenário em que cada um pode ter sua própria mídia para produzir arte e cultura, fazer política e afirmar sua cidadania. Com a popularização da internet nas grandes cidades explodiram coletivos juvenis que usam as tecnologias digitais para produzir resistência, modificar a periferia e reapropriar o espaço urbano, como é o caso do Quilombaque e do Sarau Poesia na Brasa, na Grande São Paulo.

Também despontaram novos tipos de ativismo (ciberativismo, hacktivismo e game-ativismo), a exemplo das organizações WikiLeaks e Avaaz.org, do grupo hacktivista Anonymous e do grupo suíço Etoy – que organiza ações online, num misto de performance, jogos eletrônicos e técnicas hacker. Outro resultado do uso inovador da rede são as licenças Creative Commons, criadas com o objetivo de expandir a disponibilidade de obras e facilitar seu uso por meio de licenças que permitem a cópia e o compartilhamento de maneira mais flexível, sem as rígidas restrições dos direitos autorias.

No entanto, é importante lembrar que – como afirmam os estudiosos Alexander Galloway e André Franzosi -, a comunicação entre computadores é regida por princípios técnicos chamados de ‘protocolos’, que permitem o rastreamento de dados e informações. Essa é a grande contradição da internet: a mídia potencialmente mais livre do mundo é, ao mesmo tempo, a mais vigiada do mundo. Não é a toa que regimes autoritários buscam formas de monitorar dissidentes e controlar a vida dos cidadãos.

No Irã e na China, por exemplo, há a obrigatoriedade de cadastros diversos de websites e um controle rígido dos cibercafés. Desde o início deste ano, o governo chinês fechou 3.193 sites, prendeu 1.071 pessoas, suspendeu o serviço de comentários online de microblogs populares no país, como Sina Weibo e o Tencent QQ, e ainda apagou 208 mil mensagens com conteúdos considerados subversivos ou inadequados.

Até na nação que se intitula a “mais democrática” do planeta surgem tentativas de cercear a rede. Após a passagem do furacão WikiLeaks, autoridades americanas começaram a falar de um conflito cibernético iminente e alguns políticos chegaram a propor a criação de um polo centralizador do fluxo informacional da internet. Existem ainda propostas absurdas de desligá-la temporariamente, nos casos de ameaça terrorista, segurança nacional e outros apelos histéricos pós-11 de Setembro.

No Brasil, o senador Eduardo Azeredo apresentou um projeto de lei (apelidado de AI-5 digital) que propõe a regulamentação de cibercrimes por meio de medidas controversas como a obrigatoriedade de os servidores armazenarem dados dos usuários. Há uma grande mobilização contra essa iniciativa nas redes sociais (“Meganao”), envolvendo artistas, intelectuais, ativistas e defensores do software livre. Circula em diversos blogs e sites a informação de que as maiores economias do mundo negociam nos bastidores um Acordo Comercial Anticontrafação (ACTA) para estabelecer padrões internacionais ao cumprimento da legislação de propriedade intelectual.

A medida, que usa o argumento de ser uma resposta "ao aumento da circulação global de bens falsificados e da pirataria de obras protegidas por direitos autorais", na verdade é mais uma estratégia dos países desenvolvidos de manter o domínio cultural e tecnológico sobre o resto do mundo subdesenvolvido. Como consequência, teremos a censura e o controle para garantir a manutenção do poder econômico das empresas que dominam o mercado. No mundo digital em rede, a liberdade de expressão desponta como um dos maiores desafios do século XXI.

*Carole Ferreira da Cruz é mestranda em Comunicação pela Universidade Federal de Sergipe, bolsita Fapitec, integrante do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/CNPq/UFS) e editora dos Cadernos do Tempo Presente.

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