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(Foto: Divulgação) |
“Enquanto houve escravidão no Brasil, os negros se revoltaram e marcaram sua revolta em protestos armados, cuja iteração não encontra paralelo na história de qualquer outro país do novo mundo” disse Décio Freitas em seu livro Palmares a guerra dos escravos (1982). Imbuído não só de tal pensamento, mas, influenciado também por novas ideologias que estavam nascendo no Brasil, Carlos Diegues produz em 1984 o filme Quilombo, onde conta a história do mais famoso e maior reduto escravo do Brasil, o quilombo dos Palmares.
O longa-metragem contou com um elenco de artistas já consagrados da época, como Grande Otelo, Toni Tornado, Vera Fischer, Zezé Motta, Antônio Pompeu, entre outros. A produção musical ficou a cargo do cantor Gilberto Gil, o que lhe rendeu um Cd inédito com as trilhas sonoras do filme. O apoio principal da produção veio da Guamont francesa, uma produtora que Carlos Diegues conheceu quando do seu exílio na França.
O filme está centralizado em três personagens principais. Inicialmente é apresentada a provável líder Acotirene protagonizada pela atriz Alaide Santos. Ao que parece, a narrativa tenta mostrar exatamente o surgimento e o lado religioso de Palmares. Num segundo ato, o filme mostra a liderança de Ganga Zumba (Toni Tornado), homem forte e guerreiro, mas também guiado pelo espírito de Xangô. Segundo Décio Freitas, Ganga Zumba teria nascido na África e trazido para o Brasil como muito outros africanos, retirados de suas raízes e escravizados em outro continente. De acordo com a obra, foi no comando desse chefe guerreiro que Palmares cresceu e se fortaleceu economicamente. Neste mesmo período, o quilombo passa a construir uma grande rede de solidariedade e de comercialização entre a sua vizinhança.
Várias expedições foram lançadas em direção a Palmares no intuito de destruir os seus mocambos, principalmente o seu reduto maior, o povoado de Macaco. Em contrapartida, o quilombo resistiu fortemente contra essas investidas, e fez surgir o terceiro personagem principal do filme, conhecido pela história como o Zumbi dos Palmares, este representado pelo ator Antônio Pompeu. Zumbi, com o passar dos anos, se tornaria o maior símbolo da resistência escrava e negra no Brasil, da Colônia à República, de meados do século XVII até os dias atuais.
A película conduzida por Carlos Diegues ainda apresentaria traços importantes daquele reduto escravo. Um desses aspectos que aparece em várias cenas do filme são as relações étnico-culturais, ou transculturais (para alguns) dentro do território palmarino. Lá, conviviam negros/escravos, índios e brancos, todos aqueles que estavam de certa forma “insatisfeitos” com a ordem social. Vale ainda ressaltar que, a Capitania de Pernambuco sofreu a intervenção por alguns anos dos holandeses, e esse contato gerou muitos conflitos armados. Desta forma, vários moradores se deslocaram para outros lugares longe desses combates, e inclusive em direção ao quilombo dos Palmares.
O resultado desse encontro de diferentes culturas foi sentido fortemente na religião. E o filme conduz de maneira clara e didática a questão da aculturação, apesar de haver cenas estereotipadas dessa “nova” relação entre os habitantes e do que seria o próprio quilombo. Diegues, talvez, tentando buscar uma válvula de escape que o alentasse perante as circunstâncias políticas do período de redemocratização brasileira, encontrou na resistência escrava de Palmares o sonho de uma geração inteira, a liberdade.
Apesar desta produção cinematográfica ser do século passado, o longa-metragem “Quilombo” de Carlos Diegues mostra a sua importância quanto à utilização do filme como um material didático e de pesquisa para os historiadores e professores que lecionam nas escolas. Há muito o cinema vem se apresentando como uma alternativa às novas abordagens historiográficas. Cada vez mais, a arte fílmica se transforma numa ferramenta imprescindível de Clio.
Luiz Paulo Bezerra é graduando em História pela Universidade Federal de Sergipe. Bolsista do Programa de Educação Tutorial (PET História/UFS) e orientando do professor Dr. Itamar Freitas. O artigo integra as colaborações à coluna do Grupo de Estudos do Tempo Presente (GET/CNPQ/UFS).
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