Júlio Seabra: desvalorização da classe é causa de problemas no sitema de saúde (Foto: Portal Infonet) |
"O país nunca teve tantos médicos em atividade e a perspectiva atual é de manutenção dessa curva ascendente". A frase é parte de um artigo divulgado no início de março, de autoria do médico José Júlio Seabra dos Santos. Atual presidente do Conselho Regional de Medicina de Sergipe (Cremese), José Júlio defende a adoção de políticas públicas para distribuição dos médicos como uma das soluções para melhorar o acesso dos brasileiros à assistência de saúde.
Em entrevista ao Portal Infonet, o médico apresenta críticas ao processo de entrada de médicos estrangeiros no país, bem como mostra um panorama da saúde no Estado. Confira:
Portal Infonet – Em seu artigo, você cita que a Organização Mundial da Saúde (OMS) "acredita que dispor de um médico mal formado é melhor do que não oferecer nenhum à população”. O que quer dizer esta afirmação?
José Júlio Seabra-Todo profissional para ingressar em uma profissão onde existe um conselho, precisa fazer uma prova de proficiência. No Brasil, existem 7200 vagas para cursos de medicina em todo o Brasil por ano, e cada estudante para se formar precisa de 12 mil horas de estudo em média. Em países como Cuba, por exemplo, esse número cai para em média cinco mil horas. No Peru, os profissionais formados não ficam lá, por que o governo não quer que ele atue no país. Com isso a gente percebe que o profissional brasileiro é qualificado, e que não convém ao Governo Federal incentivar políticas para trazer médicos de outros países para cá. Não é questão de reserva de mercado, e sim por que esses profissionais de fora não são qualificados como os nossos. Se eles não fazem o exame de proficiência, não há como atestar sua competência.
Portal Infonet- Se existem médicos qualificados e em quantidade suficiente, qual o problema do Sistema de Saúde no país?
JJS- A concentração desses profissionais nos grandes centros. Em São Paulo, por exemplo, existe um número grandioso de médicos na capital. Mas se você for um pouco mais para dentro do Estado, em Guarulhos, a quantidade reduz drasticamente enquanto sobram pacientes. Isso por que o médico vê que no não existe condições de trabalho e de vida que o mantenham no interior. Uma política eficiente para posicionar esses profissionais é uma grande necessidade, em níveis federal, estadual e municipal.
Portal Infonet- E em Sergipe, como você avalia a situação da Saúde?
JJS-Primeiro, é preciso apontar um ponto forte no Estado para entender algumas relações. Sergipe é um dos estados com maior número de médicos especialistas do país. Mas não existe médico que trabalhe só com estetoscópio. Ele precisa de aparelhos, de estrutura para trabalhar. Por isso, por mais que o médico tenha qualificação, o serviço fica prejudicado.
Outro problema é a desvalorização da classe. Antigamente, um médico ganhava igual ao desembargador ou juiz. Hoje em dia, existe aquela ideia de que o médico vai para o interior e ganha uma fortuna. Mas quando ele chega lá, tem que montar um consultório por que não existe estrutura no sistema público, tem que pagar as despesas da casa, não tem alternativas de educação e lazer para a família… A verdade é que o Sistema de Saúde do Estado só funciona pela insistência dos médicos, que se preocupam em atender a população mesmo com as condições mais difíceis.
Portal Infonet-Sobre o pedido de intervenção no Hospital de Urgência de Sergipe (Huse), que desde novembro repercute entre a classe dos profissionais de saúde e inclusive entre o Cremese, houve algum progresso nas discussões?
JJS- Na verdade, é de competência do Cremese pedir a interdição ética, enquanto cabe ao Ministério Público o pedido de intervenção. O conselho tem apenas função fiscalizadora, controlando a atuação do profissional para garantir um bom atendimento ao paciente. Se nós vemos que não há condições de trabalho para o médico, ele é afastado e colocado em outro setor. Se a situação continua, nos resta pedir o fechamento do Hospital. Mas órgãos como a Vigilância Sanitária, por exemplo, não tem “peito” suficiente para impedir o Hospital de funcionar, por que sabem o que isso vai causar. Desde dezembro temos realizado inspeções no Huse, observando irregularidades para a produção de um relatório. Então você me pergunta: não é muito tempo? E eu respondo que quem tem que julgar isso é o governo de Sergipe.
Portal Infonet- Neste cenário, existem perspectivas positivas para a Saúde no Estado?
JJS-Tudo indica que pode acontecer uma greve da rede municipal de saúde, e alguns acontecimentos recentes refletem essa realidade. A coordenadora do setor de Oncologia do Huse foi destituída, e isso não aconteceu por que os médicos não quiseram se submeter a uma enfermeira. Para assumir um cargo, você tem que ser especializado, o que não era o caso. O Hospital Pediátrico tinha previsão de voltar a funcionar em seis meses quando foi fechado. 58 meses depois eles voltaram sem ter ao menos água morna para banho. Antigamente havia um bom número de maternidades, enquanto agora só temos a Nossa Senhora de Lourdes. Isso dificulta qualquer visão otimista.
Por Nayara Arêdes
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