O TESOURO DOS JESUÍTAS EM SERGIPE (final)

No dia 13 de maio de 1931 A Tribuna dava voz a Pedro de Alcântara, que assim contava a sua versão do Tesouro de Jaboatão: “Há um ano mais ou menos sonhei com um padre vestido de branco, com enfeites amarelos, pelas costas apontava com o dedo para duas caixas de aço, caixas douradas e amarradas com cordas também cor de ouro. Dois meses depois sonhei com um frade de roupa cor de vinho, com a cabeça coberta com um capucho. Este frade, estendendo a mão apontava duas caixas amareladas e amarradas com as mesmas cordas que vi nas outras do primeiro sonho. Como da primeira vez, não guardei segredo e diversas pessoas tiveram conhecimento do fato”. Na entrevista Pedro de Alcântara declarou que passou muitos dias sem sonhar, atribuindo o bloqueio onírico a ter contratado uma mulher, como cozinheira, colocando-a dentro de casa. Ele continua com suas declarações: “Por último, vindo até Aracaju, regressando saltei em Japaratuba, dormindo em casa de Manoel Sucupira. À noite, às 10 horas, fui surpreendido ainda quando estava acordado, por uma visão que não pude divulgar bem. Passado aquele momento perturbador (ele chegou a pensar que existia uma pessoa dentro da casa) adormeci e sonhei com um frade, que, pegando-me pela mão, conduziu-me até a fonte da Bica e aí mostrou-me uma grande pedra onde estava a chave pregada. No dia seguinte fui verificar a veracidade do sonho, encontrando um pedaço da chave do lado de fora a qual foi por mim arrancada sem a menor dificuldade. Sete pés dos meus, adiante da chave, encontrei estas placas enterradas dois palmos debaixo de grossas raízes por indicação do sonho. Tudo isso fiz em companhia de Raimundo que foi quem ciscou o chão, às 2 horas da manhã, apanhando as placas. Quando acabamos de retirar as placas fomos tomados por um pavor horrível, pois ouvimos uma fuzilaria enorme e o espoucar de bombas. Por cima de nossas cabeças flechas de foguetes cruzavam o ar. Saímos sem ânimo de prosseguir, embora atribuíssemos a algumas pessoas da localidade já cientes do nosso segredo. Até hoje, ninguém, mas ninguém mesmo, que eu saiba, voltou à fonte da Bica. Os sonhos e visões de Pedro de Alcântara levaram à descoberta de uma chave e duas placas, logo entregues ao padre Evêncio Guimarães, vigário local, que as trouxe para o bispo Dom José Tomás Gomes da Silva. O fato tomou aspecto jurídico, tendo o bispo atribuído ao padre Basilício Raposo o estudo para a proteção dos bens do hipotético tesouro. O interventor prometeu garantir os direitos, enquanto o chefe de Polícia tomou depoimentos das diversas pessoas ligadas diretamente ao fato. Pedro de Alcântara foi presenteado com um sapato Clark, pela Casa Mascarenhas, de João Mascarenhas, ganhou entradas para o Cinema Rio Branco, e diversos convites para refeições e outros encontros. O sonhador do tesouro teve seus dias de celebridade, sendo assediado por muita gente que queria por as mãos, de alguma forma, na riqueza antiga. Depois de examinadas pelo ourives Sindulfo Barreto, para quem “Nas placas não há chumbo. Nota-se ausência absoluta deste metal. A base é estanho com uma mistura de prata fina” e mostradas a autoridades e curiosos, as placas foram, enfim, transcritas em seus dizeres: “Ano 1717. MDCCXVII Escritura perpétua gravada em placa metálica. Em tempo declaro neste metal aos homens futuros o grande Patrimônio pertencente a N. S. das Agonias, Padroeira do Monte Jaboatão. A qual foi desterrada para Roma no ano XVII do século acima por ocasião da guerra holandesa pelos frades jesuítas e carmelitas. Trecho. Escritura, bens e móveis, terrenos pertencentes LX braças a contar parte central do mesmo acha-se colocado o cruzeiro de pedra São Pio I para está depositado um grande cabedal de ouro e metal em toda circunferência do cruzeiro estender-se quatro mil e quinhentas e doze braças de terra firme. Doação do flamengo Arenk Ará antes de sua morte à Padroeira N. S. das Agonias. Nos fins do século XVI. 2º A fazenda denominada Ladeira quase irmanada rumando o sul três mil e quatrocentos braças de terra firme, doação feita pelo antigo frei Jerônimo capucho antes de sua morte a N.S. das Agonias. 3º A fazenda Gamela anexa a Várzea Verde com três mil novecentas e dezoito braças, doação feita pelo antigo flamengo Gym Luan (ou Juan) frade antes de sua morte a N. S. das Agonias. IV Fazenda Santana dos Frades com dois mil e quatrocentas braças rumando à costa do mar, doação do antigo flamengo Bastim antes sua morte a N. S. das Agonias. A fazenda Cardox e Pontal dos Mangues a 1ª com três mil e dez braças de terra firme, a 2ª com mil novecentas e treze braças de terra firme doação do Burguês Sandeno Cardox por sua morte a N. S. das Agonias, Padroeira do Monte Jaboatão desterrada em XCI para Roma por ser muito milagrosa”. Apesar da euforia do tema, posto diariamente na imprensa, o Tesouro de Jaboatão não se tornou compreensível na cabeça dos sergipanos. Muitas questões precisam ser respondidas, no enquadramento dos fatos da história. O próprio Pedro de Alcântara era uma figura estranha, esperta, astuta, agindo como o fez belchior Dias Moreya ao despistar os interessados nas suas minas de prata. O assunto do Tesouro de Jaboatão saiu do noticiário, silenciado pelo fracasso da Comissão técnica, chefiada por Leandro Diniz de Faro Dantas. O que restou já existia antes, era a tradição, a crença, a lenda, o mito da riqueza, associada a capítulos verdadeiros da história de Sergipe, como a presença das ordens religiosas – jesuítas, carmelitas, oratorianos, franciscanos, dentre outras -, a invasão holandesa, a expulsão dos jesuítas e o confisco e arrematação dos seus bens. Ficou na oralidade que tudo não passou de uma armação, na qual teria tomado parte destacada Sindulfo Barreto, que usara sua arte para confeccionar, na sua loja comercial da rua de Laranjeiras 187, a chave e as placas reveladoras do Tesouro de Jaboatão. O próprio Lauro Fontes, autor do livro Baú do Turco, filho de Sindulfo Barreto, registra: “Quando as discussões jurídicas entre o Estado, o Clero e o advogado de Pedro de Alcântara atingiam o seu climax emocionam, a bom estourou. A autenticidade das placas foi posta sob suspeita, sob a alegação de eram falsas, após os exames altamente competentes realizados por um grupo independente de professores e peritos. As suspeitas de falsidade estavam fundamentadas em dois pontos indiscutíveis: 1º – a ortografia de algumas palavras das placas era recente e não utilizada no século XVII; um erro crasso, certamente cometido involuntariamente pelo inteligente a hábil autor das inscrições; 2º – a liga do metal das placas não era conhecida à época em que foram confeccionadas, de baixa resistência à corrosão e ao tempo em que estiveram enterradas.” (Baú do Turco, página 107.) Permitida a reprodução desde que citada a fonte “Pesquise – Pesquisa de Sergipe / InfoNet”

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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