Musiqualidade

R E S E N H A

Cantor: FRANCIS HIME
CD: “NAVEGA ILUMINA”
Selo: SESC

Talvez o período de maior reconhecimento na carreira do cantor e compositor carioca Francis Hime tenha se dado nas décadas de setenta e oitenta do século passado quando ele concebeu várias parcerias com Chico Buarque, o que terminou por resultar em verdadeiras pérolas do nosso cancioneiro, a exemplo de “Trocando em Miúdos”, “Atrás da Porta”, “Vai Passar”, “Meu Caro Amigo” e “Embarcação”. Mas o fato é que, antes disso, Francis já possuía uma história própria, tendo participado com sucesso de festivais de música e composto ao lado de feras como Vinicius de Moraes, Paulo César Pinheiro e Ruy Guerra.
Pianista de formação clássica, ele, ao longo dos últimos anos, vem lançando discos com regularidade e, no final de 2014, pôs no mercado, através do selo Sesc, o interessante álbum “Navega Ilumina” em que, pela primeira vez, traz o seu nome completo na capa: Francis Victor Wagner Hime.
Composto por uma dúzia de faixas autorais e inéditas, esse novo projeto mostra que, do alto de seus setenta e dois anos, Francis continua em pleno processo de efervescência criativa. Ele, que também é o diretor artístico e o responsável pelos arranjos do CD, o qual traz a assinatura de Paulo Araújo na produção musical, apresenta sua safra mais recente de canções, algumas letradas por parceiros já frequentes em sua obra (a esposa Olivia Hime e o poeta Geraldo Carneiro estão neste rol) e outras feitas ao lado de novos colaboradores (caso da filha Joana Hime e do emergente Thiago Amud). Até o já citado Vinicius se faz presente através dos versos de “Maria da Luz”, canção composta a partir de manuscrito encontrado recentemente por Francis ao revirar seu baú de partituras.
Dividido entre músicas delicadas (“Canção Noturna”, que surge somente com Francis ao piano, e “Canção Apaixonada”, que transporta o ouvinte para um ambiente de fim-de-noite de boate) e sambas contagiantes (”Ilusão” e “Mistério”, dois dos destaques do repertório), o disco também abre espaço para três temas eruditos, compostos em homenagem às suas netas (“Cecília”, “Beatriz” e “Isabel”).
No mais, entre saudação esperançosa ao Rio de Janeiro (a valsa “Amorosa”, faixa de abertura) e alusão a algumas escolas de samba (o delicioso samba-enredo que dá título ao CD), o artista bebe ainda em fontes bossanovistas (em “Sessão da Tarde”) e de influência afro (em “Breu e Graal”).
Enfim, um CD que mostra um Francis ao mesmo tempo atual e eterno e que, por ser de inatacável qualidade, merece fazer parte de toda e qualquer cedeteca que se preze!

N O V I D A D E S

* Revelado no circuito da Lapa Carioca, o Grupo Semente, atualmente já com mais de dezesseis anos de estrada, se tornou inicialmente conhecido por acompanhar a sambista Teresa Cristina em suas apresentações. Formado por João Callado (no cavaquinho), Bernardo Dantas (no violão), Mestre Trambique, Bruno Barreto e Marcos Esguleba (estes três alterando-se na voz e percussão), já há algum tempo o grupo tinha a intenção de se lançar em um trabalho solo, anseio que se concretizou recentemente com o lançamento do primeiro CD homônimo, o qual chegou às lojas através da gravadora Biscoito Fino. Trata-se de um grande disco, daqueles que o apreciador da genuína música popular brasileira não vai se cansar de ouvir. Já na faixa de abertura, a buliçosa “Mestre Marçal” (malandra homenagem criada por Mestre Trambique, Wilson das Neves e Paulo César Pinheiro), os caras dizem a que vieram. E misturando o samba de raiz com o samba moderno, passando pelo partido alto e flertando até com ritmo eminentemente nordestino (em “Baião da Penha”, de Guio de Moraes e David Nasser), o Semente conseguiu marcar sua estreia solo de maneira bastante feliz. São doze faixas, algumas criadas por seus integrantes como, por exemplo, “Nós e o Luar” (de João Callado) e “Quem Tem Põe” (de Mestre Trambique e Nei Lopes, gravada unida a “É Garoa”, outra de Trambique, agora em parceira com Ney Silva e Paulinho da Aba), as quais terminam por se harmonizar de invejável forma, ainda que entre elas existam dois (ótimos) temas instrumentais (“Na Maciota”, de João Callado e Mauro Aguiar, e “Ideia”, de Bernardo Dantas). Abrilhantando a festa, surgem três convidados bastante especiais que fazem parte da história da galera: além de Diogo Nogueira (apropriado na releitura de “Disritmia”, de Martinho da Vila), fazem-se presentes a já citada Teresa Cristina (particularmente à vontade na espirituosa “Alô João”, de Baden Powell e Cyro Monteiro) e Pedro Miranda (o primeiro cantor do grupo, no medley que reúne “Tumba Lê Lê, de Francisco Netto, Nilton Neves e Jarbas Reis, e “O Facão Bateu”, tema de capoeira de domínio público). Entre os melhores momentos estão as faixas “Por Todos os Santos” (de Nelson Rufino e Carlinhos Santana), “Mulata Beleza” (de Zé Roberto) e “No Balanço do Mar” (de Bruno Barreto e Thiago Cunha). Realmente imperdível!

* O terceiro e próximo CD da cantora portuguesa Cuca Roseta, uma das vozes do fado lusitano contemporâneo, será produzido por Nelson Motta. O repertório trará canções inéditas de Djavan, Ivan Lins e Jorge Drexler, além de regravações de temas criados por Ary Barroso e Zé Kéti. A conferir!

* Dona de bela voz, doce e afinada, a cantora goiana Bel Maia lançou recentemente o seu mais novo CD. Intitulado “Canções que minha Avó Cantava”, o álbum, cuja produção foi entregue a Marcelo Maia, se faz composto por dez faixas, sete autorais (quatro das quais compostas em parceria com o pianista Chico Chagas), delas se destacando “Vó Juquita”, “Charanga” e “Carnaval das Flores”. Completam o repertório as regravações de dois conhecidos temas criados por Chiquinha Gonzaga (“Lua Branca” e “Abre Alas”) e de uma obra-prima de Noel Rosa (“Com que Roupa”).

* Em seu terceiro CD, o cantor e compositor Rodrigo Campos abordará a influência oriental na vida e na cultura da cidade de São Paulo. O projeto contará, entre outros, com as participações de Juçara Marçal, Ná Ozzetti e Romulo Fróes.

* Embora tenha começado sua carreira, nos anos sessenta, cantando canções de Bossa Nova, Beth Carvalho veio a se consagrar mesmo, anos após participar com êxito de alguns festivais de música, como intérprete de samba. Ela que, ao lado de Alcione e Clara Nunes, já marcou definitivamente seu nome entre as grandes sambistas de todos os tempos, conseguiu colecionar, ao longo da vitoriosa trajetória de quarenta e oito anos, vários sucessos que se entranharam no inconsciente coletivo nacional, a exemplo de “Saco de Feijão”, “Vou Festejar”, “Coisinha do Pai”, “A Chuva Cai” e “Folhas Secas”. Uma das artistas que mais entende as sutilezas das músicas dos bambas Cartola e Nelson Cavaquinho, Beth passou por percalços no que diz respeito à saúde, mas, já praticamente restabelecida, realizou, em março do ano passado, no Parque Madureira, no Rio de Janeiro, um vigoroso show, o qual, devidamente registrado, chegou há pouco ao mercado através da gravadora Som Livre nos formatos CD e DVD (este com doze números adicionais às quatorze faixas contidas naquele). Famosa por lançar nomes como Zeca Pagodinho, ela fez questão de convidá-lo para participar dessa celebração e este surge com a costumeira vivacidade em três momentos (com destaque para “Ainda É Tempo Pra Ser Feliz”, de Arlindo Cruz, Sombra e Sombrinha). Sob a direção musical do maestro Ivan Paulo (que também assina os arranjos), Beth, com a voz novamente em forma, revive grandes canções como “O Show Tem que Continuar” (de Arlindo Cruz, Sombrinha e Luiz Carlos da Vila), “Senhora Rezadeira” (de Dedé da Portela e Dida), “Tendência” (de Dona Ivone Lara e Jorge Aragão), “Ô Isaura” (de Rubens da Mangueira) e “Caciqueando” (de Noca da Portela, Valmir e Amauri). Vale a pena conferir!

* Sob a produção de Sacha Amback, a cantora, compositora e pianista carioca Maíra Freitas, filha de Martinho da Vila, anuncia que em breve estará entrando em estúdio para registrar as canções que farão parte de seu segundo CD. Entre os compositores selecionados estão BNegão, Jonas Sá, Nina Becker, Pedro Luís e Rubinho Jacobina.

* De Pernambuco surge o CD “Negona”, o novo trabalho independente da cantora e compositora Karynna Spinelli. Com a direção musical dividida entre Lucas dos Prazeres e Yuri Queiroga, o álbum bebe na fonte do sincretismo afro-brasileiro. Temático, é composto por onze faixas e comprova o talento de uma artista que recebe influência direta de Clara Nunes, mas que já possui identidade delineada. Dona de bonita voz, segura e afinada, Karynna mergulha no samba e seus afins com personalidade e transforma as canções “Santo Barroco” (de Leandro Fregonesi), “Quatro Cantos” e “Meu Mestre, Meu Caminho” (ambas autorais) nos melhores momentos do repertório apresentado.

* A cantora e compositora mineira Carla Gomes está lançando de maneira independente o CD “O Tempo Sou Eu” com o qual marca sua estreia no mercado fonográfico. Produzido por Liminha, o álbum conta com as participações especiais de Toni Garrido na faixa “Baixada News” (de Samuel Rosa e Chico Amaral) e do percussionista Marcos Suzano em “4 Horizontes” (de Pedro Luís e Lenine).

RUBENS LISBOA é compositor e cantor.
Apresenta o quadro "Musiqualidade" dentro do programa "Estúdio Aperipê”, veiculado pela Aperipê FM todas as segundas-feiras, às 11 horas.
Quaisquer críticas e/ou sugestões a este blog serão bem-vindas e poderão ser enviadas para o e-mail: rubens@infonet.com.br

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