A (RE)VOLTA DA SUDENE

Finalmente uma notícia que redime o Nordeste de uma das mais graves acusações perpetradas durante o Governo FHC, ao menos na minha sergipana opinião. Causou-me revolta, na época, a forma com que “justificaram” a decisão oficial que extinguira a Sudene – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste. Como se sabe, extinção da Sudene fora a solução encontrada pelo Governo FHC, tão-logo revelada publicamente a já conhecida corrupção que reinava impunemente no órgão criado para desenvolver o Nordeste.

Sempre enxerguei nesta decisão governamental a reprodução do velho preconceito, às vezes sacado em tom de brincadeira por várias autoridades que se eternizam em importantes cargos federais e estaduais, de que os nordestinos são indolentes, festeiros e coniventes com a corrupção. A lógica da decisão seria, portanto, a de que o poderoso câncer que atingiu a Sudene era incurável, pois oriundo e inerente ao cidadão que nasceu na área em que estava geograficamente localizada. Como os nordestinos não seriam capazes de apurar, punir e acabar com a corrupção, pois adeptos dela, a única solução seria acabar com a faminta “boquinha federal” que devorava tantos recursos públicos.

Daí o porquê da efetivação da tese de que matar o paciente era a melhor forma de acabar com a doença, ou melhor escrevendo, a melhor forma para acabar com a corrupção na Sudene não era a de punir os corruptos (a causa), mas sim de acabar com a própria vítima da ação delituosa. É bem verdade que os corruptos adoraram a idéia, até porque continuavam livres para atuar em outros armazéns públicos, alguns inclusive conquistando mandatos eleitorais, outros fazendo bilionários investimentos em outras regiões ou países. Os escândalos envolvendo o Banestado, as obras do TRT de São Paulo e as famosas remessas ilegais de dinheiro para o exterior, dentre outros, bem provam que a corrupção não tem berço predileto para nascer, crescer e se multiplicar.

Penalizado ficou mesmo o Nordeste, mais uma vez estigmatizado com a pecha de corrupto, perdulário e dependente crônico dos favores misericordiosos dos seus irmãos mais ricos. A correta idéia de que é dever constitucional do Governo Federal a promoção de políticas que combatam as desigualdades regionais foi simplesmente ignorada quando se extinguiu a Sudene. Não é sem razão que os investimentos no Nordeste têm diminuído consideravelmente nos últimos anos, sequer se devolvendo os impostos aqui penosamente arrecadados.

Agora que a Sudene é recriada, com toda pompa e merecido marketing governamental, é hora de se arregaçar as mangas, fazendo com que a sua nova estrutura não repita os erros do passado. O Ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, na reunião realizada na cidade de Fortaleza, foi extremamente feliz quando anunciou que desta fez ela estará vacinada contra a doença da corrupção. Espera ele que, livre do resistente vírus da corrupção, poderá finalmente ajudar o Nordeste a sair de sua triste sina de região pobre e abandonada.

Mas confesso que achei pouco, pois a minha ofendida honra de cidadão nordestino exige uma reparação pelos danos morais sofridos. E não é difícil contentar-me, basta que punam os antigos corruptos que sugaram, ao longo dos anos, os recursos e a credibilidade da Sudene, evitando, inclusive, que a impunidade passada seja um estímulo para uma ação danosa no futuro. Portanto, punir os velhos amantes do erário é medida urgente e necessária para a sobrevivência da nova Sudene, mesmo porque vários deles continuam rondando ou mesmo próximos das chaves que guardam dos cofres públicos.

Como nordestino não poderia deixar de registrar que a recriação da Sudene me soou como um reconhecimento público de que não somos corruptos, mas sim vítimas da corrupção que ainda teima encontrar hospedeiros nos vários cantos do Brasil. O Governo Federal corretamente inverteu a lógica da punição até então praticada, pois punidos deveriam ser quem causou o mal, nunca quem dele fora vítima. E como prevenido nordestino que sou, sei que devo continuar atento, exigindo que os investimentos e projetos que serão anunciados, via nova Sudene, tragam o carimbo e o rótulo da transparência e da publicidade.

Ficar atento, neste caso, é mais que preciso, é necessário para que os cidadãos nordestinos permaneçam altivos, corajosos e resistentes ao vírus da corrupção. Fazer com que a Sudene trilhe pelo caminho da seriedade é a melhor revolta que se pode esperar dos seus futuros administradores. Aliás, está mais do que na hora dos nordestinos também se revoltarem contra o preconceito daquelas pessoas que não enxergam seriedade no Nordeste.

(*) Cezar Brito é advogado, conselheiro Federal da OAB e presidente da Sociedade Semear.
cezarbritto@infonet.com.br

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