Família e gestão de bens comuns – Visão do STJ

Quando o casal se separa e um dos dois permanece na posse de bens ainda não partilhados, é normal que o outro queira informações sobre a administração desse patrimônio comum.

Frequentemente, a necessidade de prestar contas em relações regidas pelo direito de família acaba sendo discutida em um processo judicial.

O tema já foi analisado em diversas oportunidades pelo STJ.

 

Cônjuge na posse do patrimônio comum tem o dever de prestar contas

A Quarta Turma julgou o caso de uma mulher que ajuizou ação contra seu ex-marido, com quem foi casada em regime de comunhão universal, buscando a prestação de contas da administração dos bens comuns durante o período de separação.

A mulher alegou que, passados 25 anos da separação, o ex-esposo, responsável pelo exercício da inventariança, jamais prestou voluntariamente as contas de sua administração, sendo direito dela a verificação completa da administração do acervo que também lhe pertencia por força do regime de bens.

Após o juízo de primeiro grau julgar o pedido procedente, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu provimento à apelação do ex-marido e extinguiu a ação de exigir contas.

Para o tribunal, embora quem assume a administração dos bens comuns tenha o dever de prestar contas, só há a obrigação de fazê-lo em forma mercantil se o ex-cônjuge que o pleiteia demonstrar que deseja constituir título executivo ou provar dilapidação de bens para mudar o administrador.

O relator do recurso no STJ, ministro Luis Felipe Salomão, afirmou que a administração do patrimônio comum do casal compete a ambos os cônjuges.

Contudo, de acordo com o ministro, a partir da separação de fato (marco final do regime de bens), os bens e direitos dos ex-consortes ficam em estado de mancomunhão, formando uma massa juridicamente indivisível, indistintamente pertencente a ambos.

O ministro explicou que, no tocante à relação decorrente do fim da convivência matrimonial, entende-se que, após a separação de fato ou de corpos, o cônjuge que estiver na posse ou na administração do patrimônio partilhável – seja na condição de administrador provisório, seja na de inventariante – terá o dever de prestar contas ao ex-consorte.

Entendimento semelhante foi firmado pela Terceira Turma, que considerou que aquele que detiver a posse e a administração dos bens comuns, antes da efetivação do divórcio e da consequente partilha, deve geri-los no interesse de ambos os cônjuges, sujeitando-se ao dever de prestar contas ao outro, a fim de evitar eventuais prejuízos relacionados ao desconhecimento quanto ao estado dos bens comuns.

 

Juiz pode ordenar prestação de contas pelo cônjuge curador

Em outro julgamento relevante da Quarta Turma, foi definido que o magistrado pode relativizar a regra que dispensa o cônjuge casado em comunhão universal, e que estiver no exercício da curatela do seu consorte, de prestar contas da administração do patrimônio do incapaz.

No caso, um homem ajuizou ação de prestação de contas contra a ex-esposa, que tinha sido sua curadora em decorrência de um acidente vascular cerebral.

Os dois foram casados sob o regime da comunhão total de bens. Na ação, ele alegou que a ex-mulher, no período da curatela, teria dilapidado o seu patrimônio, consumindo o valor recebido em ação trabalhista, a indenização do seguro por invalidez e os benefícios de previdência, inclusive complementar. As instâncias ordinárias julgaram a ação procedente.

Ao STJ, a mulher sustentou que não poderia ser obrigada a prestar contas porque, quando exerceu a curatela, ainda era casada pelo regime da comunhão universal. Segundo ela, as verbas recebidas durante o casamento integram o patrimônio comum, assim como os bens adquiridos com tais valores ao longo da relação conjugal.

O ministro Salomão, cujo voto prevaleceu no julgamento, afirmou que o curador tem o dever de prestar contas, pois está na posse de bens do incapaz, mas o próprio código excepcionou os casos em que o curador for o cônjuge e o regime de casamento for a comunhão universal.

No entanto, de acordo com o ministro, o Código Civil dispõe que, havendo determinação judicial, o cônjuge curador estará obrigado a prestar contas, cabendo ao magistrado delimitar as situações em que tal determinação deve ser efetivada.

 

Alessandro Guimarães é sócio-fundador do escritório Alessandro Guimarães Advogados.
E-mail: alessandro@alessandroguimaraes.adv.br

 

O texto acima se trata da opinião do autor e não representa o pensamento do Portal Infonet.
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